Longa 'O Melhor Lance' destaca a obsessão humana
Giuseppe Tornatore gosta de dizer que faz sempre o filme atual contra o anterior. Assim, depois de Baaria - a Porta do Vento, com sua história de amor e família - com muitos personagens, muitos cenários e um longo período de tempo -, ele está de volta com uma história que envolve poucos personagens, poucos ambientes e até um tempo mais compacto. Tudo muito diverso, mas, no fundo, O Melhor Lance não difere tanto assim. O amor continua sendo um tema maior para Tornatore, e, de novo, ele dirige sua câmera para figuras obsessivas.
O Melhor Lance é o primeiro filme do cineasta italiano em língua inglesa. Tornatore estourou quando Cinema Paradiso virou um fenômeno em escala mundial. Veio depois, entre outros filmes, Malena, com Monica Bellucci. A carreira não apenas valeu a Tornatore o título de comendador, outorgado pelo governo italiano, como lhe permitiu produzir filmes de outros diretores, entre eles Roberto Andò, que assina Viva a Liberdade, atualmente em cartaz nos cinemas brasileiros. No Festival de Berlim, no ano passado, o diretor admitiu que escreveu O Melhor Lance para Geoffrey Rush, que faz Virgil. Ele não sabia se o ator australiano ia aceitar, mas pensava nele o tempo todo. Deu certo.
Virgil trabalha com arte. Ninguém, como ele, sabe avaliar uma pintura, uma escultura, uma tapeçaria. Virgil organiza leilões. Esse homem que sabe tudo sobre o que é falso e verdadeiro na arte, é um analfabeto em matéria de sentimentos. E quando se trata de se relacionar com mulheres, a coisa fica pior ainda. Nem com seu colaborador, Roberto, ele consegue se abrir. Virgil é tão secreto quanto obsessivo com seu trabalho. E, então, no dia de seus 63 anos, ele recebe o telefonema dessa mulher que lhe pede para avaliar e colocar à venda as obras de arte - pinturas - que herdou.
Ela é tão obsessiva quanto ele. E mais misteriosa, ainda. Quase não aparece. Inventa 1001 desculpas e justificativas para permanecer reclusa. Virgil desestrutura-se. Roberto o ajuda no processo de se aproximar dessa mulher estranha. A vida de Virgil nunca mais será a mesma.
Tornatore gosta dessas histórias de gente cujo universo cai por terra. Malena virava o protótipo da colaboracionista, durante a guerra, indo para a cama com os alemães. De objeto de desejo do garoto - e de todos os homens - virava objeto de ódio das mulheres. Malena era agredida e humilhada, mas o marido herói, que perdeu o braço na guerra, a resgatava e lhe devolvia a condição de senhora.
Tornatore é um romântico que, ao contrário de François Truffaut, acredita no romantismo. Seu filme, muito bem interpretado, fascina como estudo de personagens - e da obsessão humana, que adota múltiplas faces. Talvez não seja tão bom quando O Melhor Lance envereda pelo thriller. Mas é Tornatore, e o comendador mais uma vez sai-se com competência de uma história bem armada e conduzida. Por tratar de pintura, o filme tem um aspecto visual muito elaborado. Outro ponto para a realização. As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.