China promulga polêmica lei de segurança para Hong Kong

Essa lei, considerada pelos críticos uma forma de silenciar a oposição e minar a autonomia do território, também prevê a criação de uma agência de segurança nacional na antiga ex-colônia britânica

qua, 01/07/2020 - 07:22
Anthony Wallace Simpatizantes pró-China perto da sede do governo de Hong Kong em 30 de junho de 2020 Anthony Wallace

O presidente chinês, Xi Jinping, promulgou nesta terça-feira (30) a polêmica lei de segurança nacional para Hong Kong, segundo a qual os crimes de segurança nacional podem ser punidos com prisão perpétua e a justiça chinesa será competente nos casos mais "graves".

Essa lei, considerada pelos críticos uma forma de silenciar a oposição e minar a autonomia do território, também prevê a criação de uma agência de segurança nacional na antiga ex-colônia britânica.

Ignorando os apelos dos países ocidentais, o Parlamento nacional aprovou o texto, um ano depois das grandes manifestações na ex-colônia britânica contra a influência do governo central.

O texto será incorporado à "Lei Fundamental" que serve desde 1997 de mini-Constituição em Hong Kong e entrará em vigor ainda nesta terça-feira, anunciou a chefe do Executivo de Hong Kong, Carrie Lam.

Durante uma cerimônia por ocasião do 23º aniversário da devolução da antiga colônia britânica à China, Lam a qualificou nesta quarta de "fato mais importante nas relações entre o governo central e Hong Kong desde a retrocessão".

A nova lei será uma "espada" que paira sobre as pessoas que afetam a segurança nacional, disse o Escritório de Assuntos de Hong Kong e Macau logo após a sua promulgação.

"Para a grande maioria dos residentes de Hong Kong essa lei é um espírito guardião de suas liberdades", acrescentou.

Com este texto, o governo central quer garantir a estabilidade e acabar com os protestos do ano passado, neste território de 7,5 milhões de habitantes. Ele também espera parar o movimento de independência.

"Isto representa o fim de Hong Kong como era conhecido em todo o mundo. Com poderes ampliados e uma lei mal definida, a cidade se transformará em um #estadodepolíciasecreta", tuitou Joshua Wong, um dos líderes do movimento pró-democracia Hong Kong, cujo partido político Demosisto anunciou a dissolução nesta terça-feira.

"Ao final de várias deliberações internas, decidimos pela dissolução e interromper todas as atividades como grupo dadas as circunstâncias", afirmou o Demosisto no Twitter.

- Agência de Segurança Nacional -

Esta lei permite reprimir quatro tipos de crimes contra a segurança do Estado: atividades subversivas, secessão, terrorismo e conluio com forças estrangeiras.

Nesse âmbito, a China continental pode lidar diretamente com casos em três situações: se são casos complexos de interferência estrangeira, se os casos são "muito graves" e se existem "ameaças sérias e reais" contra a segurança nacional.

"Pouco importa que a violência tenha sido usada ou se tenha existido a ameaça de usá-la, os líderes ou autores de crimes graves serão condenados à prisão perpétua ou a um mínimo de 10 anos de prisão", declara a nova lei.

Estados Unidos, Reino Unido, União Europeia e o Alto Comissariado das Nações Unidas para os Direitos Humanos haviam alertado para o risco de que a lei possa ser utilizada para calar as vozes críticas a respeito de Pequim, que recorre a leis similares para esmagar a dissidência no continente.

O chefe da diplomacia americana, Mike Pompeo, ameaçou Pequim com novas represálias.

Os Estados Unidos "não ficarão de braços cruzados enquanto a China engole Hong Kong com sua boca autoritária", disse.

Antecipando-se à promulgação da lei, Washington anunciou nesta segunda-feira o fim das vendas de equipamento sensível de defesa a Hong Kong para evitar que "caia nas mãos" do exército chinês, ao que a China reagiu anunciando que adotará "represálias" por esta decisão.

O governo de Donald Trump já tinha anunciado na sexta-feira restrições de vistos para funcionários chineses acusados de "por em suspeita" a autonomia do território. A China respondeu nesta segunda com uma medida similar contra os cidadãos americanos "que se comportam mal", criticando a lei.

A UE criticou a adoção da lei. "Lamentamos esta decisão. A lei pode afetar gravemente o elevado nível de autonomia de Hong Kong e ter um efeito prejudicial sobre a independência do Poder Judiciário e o Estado de direito", declarou o presidente do Conselho Europeu, Charles Michel.

Em um comunicado conjunto, 27 países pediram na sede do Congresso de Direitos Humanos da ONU que a China reconsidere a lei.

- Mudança radical -

O compromisso alcançado entre Reino Unido e China para a devolução de Hong Kong em 1997 foi o de que a ex-colônia prosseguiria com certas liberdades, assim como com autonomia legislativa e judicial, durante 50 anos, no que foi denominado "um país, dois sistemas".

Os moradores de Hong Kong têm liberdade de expressão, liberdade de imprensa, uma justiça independente e um sistema capitalista.

A fórmula foi o pilar da transformação da cidade em uma plataforma financeira mundial, ancorada em sua segurança jurídica e nas liberdades políticas que não existem no continente.

A região está dirigida por um governo local cujos membros estão subordinados a Pequim, devido a um processo de seleção que afasta as figuras da oposição.

A partir de agora parece difícil que os cidadãos de Hong Kong possam organizar grandes manifestações, já que as autoridades da ex-colônia proíbem as reuniões com mais de 50 pessoas devido à epidemia de COVID-19.

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