O que é marco temporal? Entenda divergências sobre o texto

Julgamento do STF sobre demarcação de terras indígenas foi suspenso em 2021 e será retomado em 7 de junho

ter, 30/05/2023 - 08:00
Bruno Spada/Câmara dos Deputados Líder indígena do povo Kayapó (MT), Raoni Metuktire. Bruno Spada/Câmara dos Deputados

Definição   

Marco temporal é uma tese jurídica segundo a qual os povos indígenas têm direito de ocupar apenas as terras que ocupavam ou já disputavam em 5 de outubro de 1988, data de promulgação da Constituição. A tese surgiu em 2009, em parecer da Advocacia-Geral da União sobre a demarcação da reserva Raposa-Serra do Sol, em Roraima, quando esse critério foi usado.

Em 2003, foi criada a Terra Indígena Ibirama-Laklãnõ, mas uma parte dela, ocupada pelos indígenas Xokleng e disputada por agricultores, está sendo requerida pelo governo de Santa Catarina no Supremo Tribunal Federal (STF). O argumento é que essa área, de aproximadamente 80 mil m²,  não estava ocupada em 5 de outubro de 1988. Os Xokleng, por sua vez, argumentam que a terra estava desocupada na ocasião porque eles haviam sido expulsos de lá.

A decisão sobre o caso de Santa Catarina firmará o entendimento do STF para a validade ou não do marco temporal em todo o País, afetando mais de 80 casos semelhantes e mais de 300 processos de demarcação de terras indígenas que estão pendentes.   

Argumentos favoráveis

Em 2021, o ministro do STF Nunes Marques votou a favor do marco temporal, no caso de Santa Catarina, afirmando que, sem esse prazo, haveria “expansão ilimitada” para áreas “já incorporadas ao mercado imobiliário” no País.

O ministro avaliou ainda que, sem o marco temporal, a “soberania e independência nacional” estariam em risco.  Ele destacou que é preciso considerar o marco temporal em nome da segurança jurídica nacional.

“Uma teoria que defenda os limites das terras a um processo permanente de recuperação de posse em razão de um esbulho ancestral naturalmente abre espaço para conflitos de toda a ordem, sem que haja horizonte de pacificação”, disse. [Esbulho é a perda de uma terra invadida.]

Segundo Marques, a posse tradicional não deve ser confundida com posse imemorial. Marques citou que a Constituição deu prazo de cinco anos para que a União efetuasse a demarcação das terras. Para ele, essa norma demonstra a intenção de estabelecer um marco temporal preciso para definir as áreas indígenas.

O ministro também entende que a ampliação da terra indígena de Santa Catarina requerida pela Funai é indevida, por se sobrepor a uma área de proteção ambiental. 

Argumentos contrários   

Representantes dos povos indígenas afirmam que o marco temporal ameaça a sobrevivência de muitas comunidades indígenas e de florestas.  Afirmam também que trará o caos jurídico ao País e muitos conflitos em áreas já pacificadas, por provocar a revisão de reservas já demarcadas. 

 O ministro Edson Fachin é o relator do caso e foi o primeiro a votar. Ele foi contrário ao marco temporal.  Para ele, a proteção constitucional aos direitos originários sobre as terras que os indígenas tradicionalmente ocupam independe da existência de um marco temporal e da configuração de renitente esbulho. 

 O ministro também afirmou que a Constituição reconhece que o direito dos povos indígenas sobre suas terras de ocupação tradicional é um direito originário, ou seja, anterior à própria formação do Estado.   Fachin salientou que o procedimento demarcatório realizado pelo Estado não cria as terras indígenas – ele apenas as reconhece, já que a demarcação é um ato meramente declaratório. 

 

*Da Agência Câmara de Notícias

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