Tópicos | aparição de jacarés

Com a chegada das fortes chuvas à Região Metropolitana do Recife (RMR), principalmente entre os meses de abril e julho, o número de jacarés avistados em ruas, vielas, residências e estabelecimentos costuma aumentar. Nos principais veículos de comunicação da capital pernambucana é comum notícias sobre a aparição dos répteis e o posterior resgate, realizado pela Companhia Independente de Policiamento do Meio Ambiente (Cipoma), a Agência Estadual de Meio Ambiente (CPRH) e eventualmente pelo Corpo de Bombeiros.

Para entender os principais motivos que desencadeiam esse fenômeno em áreas urbanas, o LeiaJa.com entrevistou pesquisadores do Projeto Jacaré, vinculado ao Laboratório Interdisciplinar de Anfíbios e Répteis (LIAR) da Universidade Federal Rural de Pernambuco (UFRPE).

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De acordo com o biólogo Paulo Braga, o aparecimento dos jacarés nessa época do ano acontece por alguns fatores: a urbanização descontrolada e “invasão” humana ao território antes habitado pelos animais, a poluição nos rios com dejetos industriais e grande quantidade de lixo desordenada nos canais da cidade. O pesquisador explica que os humanos estão em todas as áreas de ocupação da vida desses bichos e suprimiu o espaço que antes eles habitavam.

“Recife é um grande mangue, cortado por rios, córregos e lagoas. É uma área rica em cursos de água e nesses períodos de chuva, a água tende a subir. Com a conexão criada nos cursos hídricos, os animais vão procurar novos territórios em um processo de migração. Mas, com a chegada do homem, onde antes existia um mangue, hoje há uma casa, um estabelecimento. Eles estão aqui muito antes de nós e por isso é tão comum que apareçam no meio que habitamos”, detalhou Braga.

A professora da UFRPE e coordenadora do projeto, Jozelia Correia, também alertou sobre a ligação entre o aparecimento dos jacarés e a falta de saneamento básico. “Através da análise feita nos jacarés, a gente consegue ter um retrato de como está a situação do ambiente que eles estão vivendo. Praticamente os nossos poços de água sofrem problemas de poluição por causa do não tratamento de esgotos, resíduos de grandes empresas que desaguam nos rios, além do lixo nos cursos hídricos. Tudo isso deságua no habitat natural deles”, disse.

Equipe do LIAR trabalha na soltura dos jacarés resgatados de áreas de risco no Recife. Foto: Divulgação/Projeto Jacaré

O Projeto Jacaré surgiu em 2014 e busca compreender a situação das populações das duas espécies de jacarés que habitam Pernambuco, o jacaré-de-papo-amarelo (Caiman latirostris) e o jacaré-paguá (Paleosuchus palpebrosus). “Antes, as informações que se tinham desses animais eram registros pontuais. Atuamos na RMR de forma sistemática, coletando informações sobre o animal, amostras biológicas, o peso, a dieta. É uma forma de termos dados e subsídios, em termos de gestão pública, para criar estratégias e entender as áreas prioritárias e sua importância para esses bichos”, explicou a coordenadora do projeto.

O grupo atua na Estação Ecológica do Tapacurá, em São Lourenço da Mata, no Parque de Dois Irmãos e na área da UFRPE, além do Centro de Triagem de Animais Silvestres de Pernambuco (Cetas), para onde são levados os animais resgatados no Grande Recife. “Estamos em constante contato com o Cetas e sempre que há demanda, somos chamados para fazer a avaliação do réptil. Desde o início do projeto, coletamos dados para mapear as principais áreas de onde foram feitos os resgates. O mapeamento ainda está sendo construído, mas podemos dizer que estão sempre próximos a canais, esgotos, rios e áreas de várzea”, complementou a pesquisadora. Após a análise e catalogação dos animais no centro de triagem da CPRH, o réptil é solto na natureza.

Jozelia e Paulo carregam um jacaré da espécie Paleosuchus palpebrosus, conhecido popularmente como jacaré-anão ou jacaré-paguá. Foto: Divulgação/Projeto Jacaré

Um dos principais objetivos dos pesquisadores é identificar o padrão e perfil desses animais, como média de idade, tamanho, sexo, distribuição geográfica e se houve redução da população ao longo dos anos. “No Brasil, a distribuição do papo-amarelo se conflui com a população brasileira, que habita a costa leste do país. Eles também são animais urbanizados e por isso aparecem nos principais focos da cidade. Vive em esgotos, águas mais calmas, é um bicho mais tolerante a sujeira e contaminantes. Já o jacaré-paguá é mais sensível e tem preferência por águas mais limpas e por isso é mais difícil de ser avistado”, pontuou Braga.

A orientação dos estudiosos é não mexer no animal e evitar se aproximar do réptil caso seja localizado pela população. “Enquanto o resgate não chega, é importante que ninguém toque no bicho. O papo-amarelo é considerada a espécie mais tímida por alguns estudiosos, então dificilmente ele vai te atacar com algumas exceções. Se perceberem que há um risco para o ninho, eles ficam agressivos e podem te atacar e a lesão tende a ser grave”, alertou o biólogo.

Jozelia complementa ainda que o Estado faz o resgate da forma correta, mas o tempo entre a chamada da população e a chegada da equipe poderia ser melhor para minimizar os riscos tanto para as pessoas quanto para o bicho “Ele pode ser machucado em uma contenção indevida com cordas de maneira inapropriada. Ou ser alvo de brincadeiras que possam feri-lo, além de ser morto e consumido”.

De acordo com a legislação brasileira, Lei 9.605/1998, é crime de maus tratos submeter o animal a uma situação de medo. “Matar, perseguir, caçar, apanhar, utilizar espécimes da fauna silvestre, nativos ou em rota migratória, sem a devida permissão, licença ou autorização da autoridade competente, ou em desacordo com a obtida é crime”. A pena é detenção de seis meses a um ano e pagamento de multa.

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Quem encontrar os animais pela cidade, em áreas de risco, deve entrar em contato com a Cipoma, pelo telefone (81) 3181-1700, a CPRH, através do número (81) 3182-8800, ou com os Bombeiros, no número 193. Caso o o réptil esteja dentro da UFRPE, o indicado é que procure imediatamento o Laboratório Interdisciplinar de Anfíbios e Répteis para eventuais esclarecimentos. 

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