Tópicos | Brumadinho

O presidente da República, Luiz Inácio Lula da Silva, criticou a Vale em seu perfil no X, novo nome do Twitter, nesta quinta-feira, 25. Ele mencionou a ruptura da barragem da mineradora em Brumadinho (MG). Lula tem feito pressão para emplacar o ex-ministro da Fazenda Guido Mantega no Conselho de Administração da empresa.

"Hoje faz 5 anos do crime que deixou Brumadinho debaixo de lama, tirando vidas e destruindo o meio ambiente. 5 anos e a Vale nada fez para reparar a destruição causada. É necessário o amparo às famílias das vítimas, recuperação ambiental e, principalmente, fiscalização e prevenção em projetos de mineração, para não termos novas tragédias como Brumadinho e Mariana", diz a postagem no perfil do presidente Lula.

##RECOMENDA##

Passados mais de um ano da conclusão do inquérito da Polícia Federal (PF) que apurou responsabilidades pela tragédia em Brumadinho (MG), o relatório final permanece em sigilo. As investigações foram encerradas em novembro de 2021 quando se anunciou o indiciamento de 19 pessoas. Os nomes são mantidos até hoje em segredo.

Segundo informou a PF na época, o relatório final foi encaminhado ao Ministério Público Federal (MPF), que tem atribuição para analisar o seu conteúdo e para decidir se leva à Justiça uma denúncia contra os 19 indiciados.

##RECOMENDA##

O MPF, no entanto, evita comentar os resultados desse inquérito alegando o sigilo. Ao mesmo tempo, não explica porque a investigação da PF, concluída há mais de um ano, não teve desdobramentos em nenhum processo criminal.

Até o mês passado, eram réus na Justiça mineira 16 pessoas, sendo 11 ligadas à mineradora Vale e cinco à empresa alemã Tüv Süd, que assinou o laudo de estabilidade da barragem que se rompeu. O processo havia sido movido pelo Ministério Público de Minas Gerais (MPMG) em fevereiro de 2020 com base em investigações da Polícia Civil.

Competência

Sua tramitação, no entanto, foi afetada por uma discussão sobre a competência, motivada por um habeas corpus apresentado pela defesa de um dos réus, o ex-presidente da mineradora Fábio Schvartsman.

O centro da questão girava em torno da suspeita de ocorrência de crimes federais como o descumprimento da Política Nacional de Segurança de Barragens (PNSB) e possíveis danos a sítios arqueológicos, que são patrimônios da União.

No mês passado, o Supremo Tribunal Federal (STF) determinou que o caso fosse remetido à Justiça Federal. Como cabe ao MPF atuar na esfera federal, a decisão afastou automaticamente o MPMG do processo. Há dois dias, no entanto, o MPF tomou a decisão de reapresentar a denúncia do MPMG, que foi aceita ontem (24) pela juíza Raquel Vasconcelos Alves de Lima, da 2ª Vara Criminal Federal.

Dessa forma, os 16 denunciados que haviam deixado de ser réus perante a Justiça estadual assumem agora a condição de réus na Justiça Federal. Eles vão responder por diversos crimes ambientais e por homicídio doloso qualificado. Vale e Tüv Süd também foram denunciadas e, se condenadas, podem ser penalizadas com diversas sanções.

Considerada uma das maiores tragédias ambientais e trabalhistas do Brasil, o rompimento da barragem em Brumadinho completa hoje (25) quatro anos. No episódio, 270 pessoas morreram, a maioria funcionários em atividade nas estruturas da Vale. Os corpos de três vítimas ainda estão desaparecidos e são procurados pelo Corpo de Bombeiros.

A denúncia elaborada pelo MPMG e agora ratificada pelo MPF aponta que um conluio entre a Vale e a Tüv Süd resultou na emissão de declarações de condição de estabilidade falsas que tinham como objetivo esconder a real situação da barragem e permitir que as atividades da mineradora pudessem ser levadas adiante.

Quando a PF concluiu seu inquérito, quase dois anos após o início da tramitação do processo na Justiça estadual, a juíza até então encarregada do caso, Renata Nascimento Borges, solicitou o relatório final. Em despacho, ela chegou a informar as partes – MPMG e advogados dos réus – que o documento poderia ser consultado de forma monitorada.

Caso considerasse haver fatos novos, caberia ao MPMG protocolar uma petição ampliando ou modificando a denúncia. Isso não ocorreu.

Com a federalização do caso, o MPF poderia apresentar uma denúncia diferente e levar em conta as conclusões do inquérito da PF. No entanto, optou por ratificar a denúncia do MPMG. Mas uma nota divulgada pela instituição indica a possibilidade de alterações futuras.

"Na petição, o MPF destacou que se reserva o direito de aditar a denúncia, a qualquer momento, para, se for o caso, acrescentar ou substituir denunciados ou fatos delituosos", registra o texto.

Expectativa

Joceli Andrioli, integrante da coordenação nacional do Movimento dos Atingidos por Barragens (MAB), faz uma avaliação positiva das atuações das polícias e dos MPs no âmbito criminal, mas também espera que os 19 indiciados pela PF sejam denunciados.

"Não sabemos quem são essas pessoas. O sigilo deve ter seus motivos legais. Agora foi definido que o julgamento acontecerá na esfera federal e o MPF apresentou de forma integral as denúncias que o MPMG já havia feito. Mas também preservou o direito de se apresentar novas denúncias. Então imaginamos que o inquérito da PF vai se somar agora no processo federal, para que todos os envolvidos sejam punidos", diz ele.

Para Andrioli, o que mais preocupa é a morosidade no julgamento do caso.

"O problema é a demora e a influência das pessoas ligadas à Vale no Judiciário. Nunca vimos antes um réu pedir para ser julgado por mais crimes – que é o que foi feito no pedido de habeas corpus que motivou essa debate de competência. Temos receio de que o caso fique impune", acrescenta.

Nos últimos dias, a Agência Brasil questionou a PF e o MPF sobre o motivo de manter o relatório final do inquérito em segredo, após mais de um ano. A PF não deu retorno. O MPF respondeu que "quem teria que levantar esse sigilo é a Justiça Federal, que não o fez até o momento".

Também questionado sobre porque não apresentou nenhuma denúncia com base nas investigações da PF, o MPF respondeu que “estamos impedidos de dar qualquer informação sobre esse inquérito, porque ele ainda está coberto por sigilo”.

Diante das respostas, a Agência Brasil também procurou a Justiça Federal, que até o momento não se manifestou sobre o assunto.

Com o sigilo mantido, não é possível dizer se os 16 nomes que atualmente figuram como réus no processo criminal coincidem em parte com os 19 listados no relatório final do inquérito da PF.

Terceira empresa

Um laudo de engenharia produzido ao longo das investigações sugere que o trabalho de uma terceira empresa pode estar envolvido na tragédia. Assinado por peritos da PF, o laudo apontou que uma perfuração realizada pela multinacional holandesa Fugro teria funcionado como o gatilho para o rompimento da barragem, que já estava em condição crítica.

Os apontamentos coincidem com conclusões de engenheiros da Universidade Politécnica da Catalunha que realizaram um trabalho de modelagem e simulação por computador a pedido do MPF. As análises mostraram que o fundo do furo B1-SM-13 reunia as condições propícias para gerar o episódio devido à sobrepressão de água.

A Fugro foi contratada pela Vale, com a intermediação da Tüv Süd, para realizar a perfuração com o objetivo de coletar amostras de solo e instalar instrumentos de monitoramento. Ela aceitou conduzir o trabalho após a negativa de uma outra empresa, que discordou da técnica de perfuração proposta pela Vale e pela Tüv Süd.

A Polícia Federal, no entanto, não informa se o relatório final do seu inquérito aponta alguma responsabilização da Fugro. Procurada, a multinacional holandesa não deu retorno.

No mês passado, o programa Pointer, da emissora púbica holandesa KRO-NCVR, levou ao ar uma reportagem de 15 minutos sobre a suspeita de que a perfuração realizada pela Fugro esteja relacionada com a tragédia. A repercussão do caso no país onde a empresa está sediada causou de imediato uma desvalorização de 20% nas suas ações cotadas na bolsa holandesa.

Em resposta, a Fugro divulgou no dia seguinte uma nota em seu site dizendo que a reportagem "apresenta uma visão unilateral" e que não pode comentar o caso pois investigações estão em curso, lembrando ainda que quatro funcionários que participavam da perfuração morreram no episódio.

A juíza Raquel Vasconcelos Alves de Lima, substituta da 2.ª Vara Federal Criminal de Belo Horizonte, acolheu a denúncia do Ministério Público Federal (MPF) contra executivos e funcionários da Vale e da Tüv Süd acusados pelas mortes causadas após o rompimento da barragem de Brumadinho. A decisão coloca no banco dos réus 16 pessoas e duas empresas que foram inicialmente denunciadas pelo MP estadual.

Após decisão do Supremo Tribunal Federal (STF), o caso foi remetido para a Justiça Federal em Minas Gerais. Anteontem, a Procuradoria da República no Estado ratificou a acusação, que descreve não só crimes de homicídio qualificado, por 270 vezes, mas também crimes contra a fauna e a flora, assim como crime de poluição. O MPF ainda pode aditar a denúncia para "acrescentar ou substituir denunciados ou fatos delituosos".

##RECOMENDA##

Defesa

Já a Vale reafirma "o respeito pelas famílias impactadas direta e indiretamente pelo rompimento da Barragem 1, em Brumadinho, e segue comprometida com a reparação e compensação dos danos". A companhia reforça ainda que sempre pautou as atividades por premissas de segurança. A partir do recebimento da denúncia, compete ao advogado David Rechulski a defesa jurídica da empresa.

"Considerando a premissa de que o primeiro foco era o recebimento formal da denúncia com o fim de evitar-se a prescrição dos crimes ambientais, não causa surpresa que uma denúncia de 477 folhas, mais de 80 volumes, num total de mais de 24 mil páginas, tenha sido recebida em menos de 24 horas. Nada mais havendo, portanto, para comentar-se a respeito", diz a Vale. Já a Tüv Süd não vai comentar a decisão.

O Ministério Público Federal (MPF) ratificou integralmente, nesta segunda-feira (23) a denúncia oferecida pelo Ministério Público de Minas Gerais contra a Vale, a Tüv Süd e 16 pessoas físicas em razão do desastre em Brumadinho em 2019.

A denúncia imputa às pessoas físicas denunciadas o crime de homicídio qualificado, por 270 vezes (número de mortos no desastre); crimes contra a fauna; crimes contra a flora; e crime de poluição. As pessoas jurídicas foram denunciadas pelos crimes ambientais - contra a fauna e a flora e crime de poluição.

##RECOMENDA##

Os autos estavam em análise no MPF em Brasília. Mas a ministra Rosa Weber, presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), alertou que o prazo para o fim do julgamento está marcado para a quarta-feira, 25, e encaminhou o processo, que correrá na Justiça Federal de Minas.

O MPF destacou, na petição, que poderá aditar a denúncia, se for o caso, e acrescentar ou substituir denunciados ou fatos delituosos. "Isso se deve ao fato de que novos fatos e autores podem surgir durante a instrução criminal. A urgência da ratificação da denúncia reside no teor da decisão da ministra Rosa Weber, que chamou a atenção para a possibilidade de prescrição de alguns crimes", explica a procuradora Mirian Moreira Lima.

A ministra determinou à Justiça Federal de Minas que promova imediatamente o andamento da ação penal após analisar petição de familiares das vítimas. Eles pediram o imediato cumprimento da decisão anterior devido ao risco de prescrição em abstrato dos crimes ambientais.

O processo criminal, com 84 volumes, foi distribuído à 2.ª Vara Criminal Federal de Belo Horizonte (antiga 9ª Vara), que deverá decidir se recebe a denúncia oferecida pelo Ministério Público Federal.

Procurada para comentar o assunto, a Vale reafirmou, em nota, "seu profundo respeito para com as famílias impactadas direta e indiretamente pelo rompimento da Barragem 1, em Brumadinho" e afirmou que "segue comprometida com a reparação e compensação dos danos". A companhia reforçou ainda que sempre pautou suas atividades por premissas de segurança e seguirá contribuindo com as autoridades, assim como tem feito desde 2019.

A mineradora também informou que, a partir oferecimento da denúncia, compete ao advogado David Rechulski, a defesa jurídica processual.

Rechulski, por sua vez, divulgou nota afirmando: "Com relação à ratificação integral da denúncia do Ministério Público de Minas Gerais pelo Ministério Público Federal, (a defesa) se manifestará de forma mais completa e ampla em momento oportuno. Não obstante, pode desde logo afirmar que considera absolutamente impensável uma acusação que imputa dolo de forma verticalizada, desde os primeiros níveis operacionais até o presidente da companhia, como se todos, agindo com vontade única, atuassem direcionados a deliberadamente fazerem ou deixarem a barragem se romper, ocasionando, preponderantemente, a trágica morte de seus próprios colegas de empresa e pessoas no entorno. Essa teoria não é minimamente razoável e isso será claramente demonstrado."

Nesta semana faz quatro anos que rompeu a barragem da mineradora Vale, em Brumadinho (MG). Entre as famílias das 270 vítimas da tragédia, três seguem à espera de uma chance de ter velório, enterro e uma despedida: os corpos não foram achados sob o mar de lama. Na esperança de dar ponto final a este capítulo, a força-tarefa de bombeiros e policiais mantém buscas e trabalhos de análise dos vestígios coletados no lugar que um dia foi a Mina do Córrego do Feijão.

"Nossos amados não pertencem ao lugar da tragédia. As buscas são uma forma de reparação com as vítimas sendo recuperadas", diz Patrícia Borelli, filha de Maria de Lurdes da Costa Bueno, de 59 anos, corretora de São José do Rio Pardo (SP) que estava hospedada em uma pousada em Brumadinho. Ela, o marido, dois enteados e a nora, grávida, foram soterrados junto com mais hóspedes, funcionários e os donos do local. Os planos eram de fazer uma visita ao museu Inhotim.

##RECOMENDA##

As famílias de Nathália de Oliveira Porto Araújo, de 25 anos, e de Tiago Tadeu Mendes da Silva, de 34, - ela estagiária e ele funcionário da Vale - são as outras que seguem à espera. Com o passar do tempo, a preocupação dos bombeiros e da Polícia Civil é de que se perca a qualidade do material ainda existente, por causa das chuvas e da decomposição, prejudicando que se encontrem resquícios das demais vítimas.

Em campo

Quase 6 mil bombeiros militares atuaram nas sete fases de buscas. Hoje, a 8ª etapa atua com cinco estações, que consistem em equipamentos de peneiramento, acompanhados de bombeiros que verificam fragmentos. São processadas cerca de 200 toneladas por hora em cada máquina. Desde 2019, duas interrupções atrapalharam: a pandemia e as fortes chuvas que assolaram a Grande Belo Horizonte no fim de 2021 e início de 2022. O trabalho continua diariamente.

Se para muitos soa improvável ainda achar restos mortais, uma notícia no último dezembro reavivou a esperança: foi identificada a supervisora da Vale Cristiane Antunes Campus, de 35 anos - a 267ª vítima.

Familiares dos desaparecidos criaram a Comissão dos Não Encontrados - no início eram 11 - e fazem a ponte entre as instituições (como polícia, bombeiros e Ministério Público) e os parentes dos outros. "Toda família merece sepultar o seu. Ninguém pode ficar lá perdido. Pode demorar, a gente não sabe que dia, é tudo no tempo de Deus", diz Natália de Oliveira, professora em Brumadinho e irmã de Lecilda, identificada no fim de 2021.

Ela e dois parentes de outras vítimas, Josiana Resende, mais conhecida como "Jojo", e Geraldo Resende, levam informações às outras famílias, mesmo após os seus entes queridos já terem sido localizados.

"Sempre me emociona muito, eles têm carinho com minha família, sempre representam e homenageiam minha mãe na minha ausência", conta Patrícia, que vive nos Estados Unidos e quer visitar o grupo em Brumadinho em abril.

No laboratório

Por causa do tempo, o material biológico que sai da mina e chega ao Instituto Médico-Legal (IML) vem mais deteriorado, relata o médico legista responsável pelas identificações de 2019 até agosto de 2022 na Polícia de Minas, Ricardo Araújo. Ele era da diretoria do IML até o desastre, quando foi designado para realizar identificações e manter contato com as famílias.

Dentre os métodos científicos usados, estão a papiloscopia (impressão digital), o exame da arcada dentária e o de DNA. Na primeira semana, a impressão digital foi capaz de reconhecer 79 vítimas, e no primeiro mês, cerca de 120. Mas, diante do tipo de acidente, muitos foram mutilados, o que faz com que diversas partes da mesma pessoa sejam encontradas em momentos distintos.

As reidentificações, desde o início, já ultrapassaram o número de primeiras identificações. Significa que foram encontradas mais partes de uma mesma vítima do que de pessoas diferentes. São 1.003 casos levados pela frente de busca até dezembro, de um total de 270 atingidos, reflexo da segmentação dos corpos.

Foi preciso criar um banco de dados com as digitais dos desaparecidos, para fazer o reconhecimento por meio de leitor biométrico. Houve ainda entrevistas com as famílias para saber características, como tatuagens, tratamentos odontológicos, coleta de DNA e busca ativa em hospitais e clínicas por exames das vítimas.

Agora, impressões digitais e elementos dentários não funcionam mais e se usa o exame de DNA. Mas como o material biológico usado também se decompõe, é preciso analisar tecidos duros, como ossos. Para Araújo, será possível identificar todos. "Tecnologicamente estamos preparados e não trabalhamos com data-limite".

Há ainda famílias que acompanham as buscas com a expectativa de que mais partes dos familiares sejam achadas. "O que se encontrou do familiar deles era tão pouco que não quiseram por no caixão", afirma Natália, da Comissão.

Divergência entre Vale e parentes dos mortos adia abertura de memorial

O memorial que vai homenagear os 270 mortos na barragem em Brumadinho teve a sua inauguração adiada por causa de uma divergência entre parentes das vítimas e a mineradora Vale. A previsão inicial era de que o espaço fosse aberto ao público em janeiro.

As famílias dizem que a empresa tenta impedir que elas administrem o memorial. "O impasse é que infelizmente não conseguimos acertar com a Vale a questão da governança do memorial. Ela quer fazer parte, e nós não aceitamos. Não faz sentido a empresa que matou integrar a governança de um espaço que vai homenagear as vítimas", afirma a técnica em Química Nayara Cristina Porto Ferreira, de 30 anos.

Ela integra a diretoria da Associação dos Familiares das Vítimas e Atingidos da Tragédia do Rompimento da Barragem Mina Córrego do Feijão (Avabrum) desde a sua fundação, em 2019, e é viúva de Everton Lopes Ferreira, que era operador de empilhadeira da Vale. Ele deixou também uma filha de 11 anos, do seu primeiro relacionamento.

Já a Vale afirma, em nota, que está "em constante diálogo" com a Avabrum, que representa as famílias. Ainda segundo a empresa, o diálogo tem a participação do Ministério Público de Minas Gerais sobre todos os aspectos necessários à gestão do espaço e houve escuta ativa dos familiares.

Proposta

Em relação às obras do memorial, a parte estrutural está nos ajustes finais, e a próxima fase é montar a expografia (o conteúdo a ser exposto). Com 1,2 mil m² de área construída, o espaço foi erguido em terreno cedido pela Vale, que custeou as obras, de frente para a serra onde ficava a barragem que desmoronou, no Córrego do Feijão.

O projeto é rico em simbologia. O pavilhão de entrada tem forma distorcida e fragmentada e representa o sonho das vítimas, descreve em seu site o arquiteto mineiro Gustavo Penna, que projetou o memorial. Na sequência, um ambiente escuro, iluminado por frestas no teto apenas, representa a invasão da lama. No concreto, estão incorporadas algumas peças metálicas retiradas dos escombros, dando sombra e proteção. Foram plantados ainda 272 ipês amarelos, "para que cada lamento possa ser ouvido", segundo Penna. São 270 mortos no total, mas as famílias também incluem na conta dois bebês, uma vez que duas vítimas estavam grávidas.

As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.

A presidente do Supremo Tribunal Federal, ministra Rosa Weber, ordenou à Justiça Federal de Minas que promova 'imediatamente' o andamento do processo penal em que executivos e funcionários da mineradora Vale foram denunciados pelas mortes causadas após o rompimento da barragem de Brumadinho. A determinação leva em consideração o 'risco iminente' de prescrição de crimes ambientais descritos na peça de acusação.

A decisão atende um pedido de familiares das vítimas do tsunami de lama que, no dia 25 janeiro de 2019, deixou 259 mortos e onze desaparecidos. O grupo acionou o Supremo após a Segunda Turma da Corte máxima decidir, em dezembro de 2022, que caberia à Justiça Federal julgar o caso, e não à Justiça estadual.

##RECOMENDA##

Com a decisão do STF, foi invalidado o recebimento da denúncia contra onze executivos e funcionários da Vale e outros cinco da consultoria Tüv Süd. A peça descreve homicídio doloso, por 270 vezes, e delitos contra a fauna e a flora, além de crime de poluição.

Ao analisar o caso, Rosa Weber alertou para 'risco iminente' de prescrição de todos os delitos imputados na denúncia cuja pena máxima não exceda a dois anos, considerando que os fatos foram consumados em 25 de janeiro de 2019. Em tais casos, o prazo prescricional é de quatro anos.

A ministra ponderou que, dadas as 'circunstâncias excepcionais' do caso, a falta de publicação do acórdão da Segunda Turma não impede 'a eficácia da decisão', no sentido de determinar a imediata remessa dos autos ao juízo da 9.ª Vara Federal de Belo Horizonte, para que dê andamento ao caso.

A 267ª vítima do rompimento da barragem Córrego do Feijão, em Brumadinho (MG), foi identificada nesta segunda-feira (20) pela Polícia Civil de Minas Gerais, por meio do Instituto Médico Legal (IML). Por meio de exame de DNA, a instituição confirmou a identidade de Cristiane Antunes Campos, que tinha 35 anos à época do rompimento da barragem, em 25 de janeiro de 2019. Ela era natural de Belo Horizonte e trabalhava como supervisora de mina. Cristiane foi localizada pelo Corpo de Bombeiros Militar de Minas Gerais.

O governador Romeu Zema reforçou, nas redes sociais, o compromisso do governo do estado em amenizar o sofrimento causado pela tragédia. “Não sossegaremos até encontrarmos todos os desaparecidos, diminuindo um pouco a dor dos familiares”, afirmou Zema.

##RECOMENDA##

O rompimento da barragem da mineradora Vale em Brumadinho tirou a vida de 272 pessoas, das quais duas estavam grávidas. Três vítimas ainda não foram localizadas.  Este ano, a Polícia Civil identificou três vítimas da tragédia, nos meses de maio, de junho e nesta terça-feira. Neste mês de dezembro, o Corpo de Bombeiros contabilizou mais de 1.400 dias de operação em Brumadinho. Desde o início da tragédia, 5.735 bombeiros militares foram empregados na operação.

Na fase atual, o Corpo de Bombeiros está na oitava estratégia de buscas, operando com as Estações de Buscas, que consistem em equipamentos industriais de peneiramento adaptados para a realidade operacional da Operação Brumadinho. Essa nova estratégia permitiu um ganho em volume processado, que alcança cerca de 200 toneladas por hora em cada equipamento.

Além das mortes, o rompimento da barragem da Vale em Brumadinho gerou uma série de impactos sociais, ambientais e econômicos na bacia do Rio Paraopeba e em todo o estado de Minas Gerais. A tragédia é considerada um dos maiores desastres ambientais da mineração do país, depois do rompimento da barragem de Fundão, da mineradora Samarco, em Mariana, também em Minas Gerais, que aconteceu no dia 5 de novembro de 2015.

O rompimento da barragem em Mariana matou 19 pessoas, lançou cerca de 45 milhões de metros cúbicos de rejeitos no meio ambiente, compostos por óxido de ferro e sílica, principalmente, e soterrou o subdistrito de Bento Rodrigues, deixando um rastro de destruição que se estendeu até o litoral do Espírito Santo.

A Segunda Turma do Supremo Tribunal Federal (STF) decidiu que os executivos e funcionários da mineradora Vale denunciados pelas mortes causadas com o rompimento da barragem de Brumadinho (MG) devem ser julgados pela Justiça Federal.

O julgamento terminou na sexta-feira (16) no plenário virtual. Nesse modalidade, os ministros depositam os votos na plataforma online sem necessidade de reunião ou debate do colegiado. O placar foi de 3 votos a 1.

##RECOMENDA##

O entendimento predominante foi o de que o episódio tem como pano de fundo o debate sobre a exploração das atividades de mineração em larga escala, o que atrairia o interesse da União.

"A denúncia narra evidente interesse e preocupação da União na consecução da Política Nacional de Segurança de Barragens, sobretudo após o desastre de Mariana/MG ("caso Samarco"), em contexto bastante similar ao dos presentes autos", escreveu o ministro Kassio Nunes Marques, que inaugurou a maioria.

Nunes Marques também apontou que os funcionários da Vale foram acusados de usar um documento falso para atestar a estabilidade da barragem de Brumadinho, o que teria prejudicado a fiscalização da estrutura pela União.

Os ministros Gilmar Mendes e André Mendonça completaram a maioria. O ministro Edson Fachin, relator do processo, foi o único que votou para manter o caso na Justiça estadual de Minas Gerais. Ricardo Lewandowski se declarou suspeito e não votou.

O resultado do julgamento vai na linha do que já havia decidido o Superior Tribunal de Justiça (STJ) em outubro do ano passado. O caso chegou ao STF a partir de um recurso do Ministério Público de Minas Gerais.

Na prática, a decisão coloca o processo de volta ao início, o que anula inclusive o recebimento de denúncia. A Associação dos Familiares de Vítimas e Atingidos pelo Rompimento da Barragem Mina Córrego do Feijão (AVABRUM) disse que o julgamento é uma "injustiça" e reforça a "impunidade".

"Há um sentimento de perplexidade e de revolta entre familiares e atingidos pela tragédia-crime diante do placar da Segunda Turma", diz a manifestação.

A barragem B1 rompeu em janeiro de 2019, em Brumadinho, na região metropolitana de Belo Horizonte, deixando 259 mortos e onze desaparecidos. A denúncia por homicídio doloso duplamente qualificado e por crimes ambientais foi oferecida um ano depois contra 11 executivos e funcionários da Vale e outros cinco da consultoria Tüv Süd.

Um oficial do Corpo de Bombeiros condecorado por sua atuação na tragédia de Brumadinho foi morto por traficantes na tarde desta quarta-feira (16), em São João de Meriti, na Baixada Fluminense, onde morava. O major Wagner Luiz Melo Bonin, de 42 anos, foi sequestrado e seu corpo carbonizado pelos criminosos. 

Investigações da Polícia Civil apontam que o militar estaria de dentro de seu carro, fotografando barricadas montadas por bandidos e foi descoberto pelos traficantes de drogas que agem na região. Bonin era lotado no Grupamento de Operações Aéreas (GOA). O militar também era formado em enfermagem e transportava, nos helicópteros da corporação, órgãos para pessoas que estavam nas filas de transplante.

##RECOMENDA##

De acordo com a Polícia Militar, por volta das 19h de quarta-feira, policiais da corporação foram informados de que um carro com as mesmas características do veículo utilizado pelo militar estaria na região do Parque Colúmbia, na Pavuna, zona norte do Rio. Policiais do 41º BPM (Irajá) foram à Rua Ibirubá, onde localizaram um corpo carbonizado no banco de trás do carro.

Informações recebidas pela polícia, indicam que a esposa do oficial entrou em contato com o comandante do grupamento onde ele era lotado após estranhar a demora do marido em voltar para casa. Ela conseguiu visualizar fotos feitas por Bonin por meio de um acesso remoto de mensagens enviadas para um número não registrado nos contados da corporação. As imagens mostram pessoas e uma barricada do tráfico de drogas em local não identificado.

Pesar

Em nota, o Corpo de Bombeiros Militar do Estado do Rio de Janeiro manifestou pesar pelo falecimento do major Bonin: "A corporação se solidariza e deseja as mais sinceras condolências a parentes e amigos do militar, que desde 2002 integrava as fileiras da corporação".

"Nossa eterna continência a este eterno herói por todo o trabalho realizado em prol da sociedade, no cumprimento do juramento, honrando a missão de Vida Alheia e Riquezas Salvar. O major Wagner Bonin jamais será esquecido. Toda a tropa está de luto”.

A nota diz ainda que a corporação confia na Polícia Militar e na Polícia Civil do Estado do Rio de Janeiro para esclarecer as circunstâncias do crime e prender os responsáveis.

[@#video#@]

A Vale informou que a Controladoria-Geral da União (CGU) multou a empresa em R$ 86,3 milhões, no âmbito de processo administrativo de responsabilização. O órgão concluiu que a Vale deixou de apresentar informações fidedignas no sistema da Agência Nacional de Mineração (ANM) em relação à Barragem I de Brumadinho (MG) e que emitiu Declaração de Condição de Estabilidade positiva para a estrutura, no período de junho a setembro de 2018, quando, no entendimento do órgão de controle, ela deveria ser negativa, circunstâncias essas que consistiram em ato lesivo à Administração Pública por dificultar a fiscalização da autarquia minerária.

Em comunicado enviado à Comissão de Valores Mobiliários (CVM), a empresa diz que dessa forma - mesmo reconhecendo a inexistência da prática de atos de corrupção - a CGU definiu a multa no valor de aproximadamente R$ 86,3 milhões, nível mínimo estabelecido pela lei, sendo reconhecido o não envolvimento ou tolerância da alta direção.

##RECOMENDA##

"A Vale discorda da condenação e apresentará nos próximos 10 dias pedido de reconsideração ao Senhor Ministro de Estado da Controladoria-Geral da União", diz a empresa.

A Polícia Civil de Minas Gerais (PCMG) identificou, nesta terça-feira (7), mais um corpo resgatado na região atingida pelo rompimento da barragem da Vale em Brumadinho (MG), ocorrido em 2019. Trata-se de Olímpio Gomes Pinto, que tinha 56 anos de idade quando aconteceu a tragédia. Ele era funcionário de uma empresa contratada pela mineradora e atuava na prestação de serviços de auxiliar de sondagem.

O corpo de Olímpio havia sido encontrado no dia 14 de abril pelo Corpo de Bombeiros de Minas Gerais. Ele é a 266ª vítima identificada, o que foi possível por meio de uma análise genética. Passados mais de três anos da tragédia, as buscas continuam. Das 270 pessoas que perderam suas vidas, quatro ainda não foram localizadas.

##RECOMENDA##

Além das mortes, a avalanche de rejeitos liberada no rompimento da barragem causou destruição de comunidades, degradação ambiental e poluição do Rio Paraopeba. Desde o episódio, as operações de busca do Corpo de Bombeiros sofreram apenas duas paralisações, ambas devido às restrições impostas nos momentos de agravamento da pandemia da covid-19.

Os esforços são acompanhados de perto pela Associação dos Familiares de Vítimas e Atingidos (Avabrum), criada pelos familiares dos mortos na tragédia. A entidade contabiliza 272 mortes na tragédia porque inclui na conta os bebês de duas vítimas que estavam grávidas.

Após o anúncio da identificação do corpo de Olímpio, a Avabrum manifestou, pelas redes sociais, solidariedade aos seus familiares. "Cada enterro, uma lembrança. Cada lembrança, uma memória. Cada memória, uma dor! Seguimos firmes e lutando para que todas as joias sejam encontradas e para que todos os familiares tenham o alento do encontro. Olímpio Gomes, presente! Juntos somos mais fortes. Nossa joias seguem vivas em nós e em nossas ações", registra a mensagem.

Processo criminal

Nessa segunda-feira (6), o ministro do Superior Tribunal Federal (STF), Edson Fachin, aceitou um recurso do Ministério Público de Minas Gerais (MPMG) e devolveu o processo criminal para a Justiça de Minas Gerais. Ele anulou um acórdão publicado em outubro do ano passado pela Sexta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ), determinando a federalização do caso.

Se prevalecesse o entendimento do STJ, o processo criminal voltaria à estaca zero e o MPMG ficaria sem poder atuar no caso, papel que caberia ao Ministério Público Federal (MPF). Com a decisão de Fachin, o julgamento do caso na Justiça estadual será retomado do ponto onde parou em outubro do ano passado e todos os atos decisórios até então praticados foram restabelecidos.

O processo criminal foi instaurado com base em uma denúncia do MPMG apresentada em fevereiro de 2020, pouco mais de um ano após a tragédia. Foram responsabilizados 11 funcionários da Vale e cinco da Tüv Süd, consultoria alemã que assinou o laudo de estabilidade da estrutura que se rompeu. Eles respondem por homicídio doloso e diferentes crimes ambientais. As duas empresas também são julgadas.

Diante da complexidade do caso, a tramitação do processo seguia um ritmo lento. Apenas em setembro do ano passado havia sido finalmente aberto prazo para que os réus apresentassem suas defesas. Como a denúncia é extensa, a juíza Renata Nascimento Borges deu a eles 90 dias. Ela também havia concordado que os espólios de 36 vítimas atuassem como assistentes da acusação.

A expectativa do MPMG é de que a instrução do processo ocorra nos próximos meses. "Os processos envolvendo crimes dolosos contra a vida são processos de duas fases. A primeira fase de instrução perante o juiz de direito. Ao final, o juiz se convencendo de que há indícios suficientes de que aquelas pessoas acusadas são autoras do crime, o processo é remetido para o tribunal popular, formado por sete jurados", explica Alderico de Carvalho, procurador de Justiça do MPMG.

Em 25 de janeiro de 2019, exatamente três horas após o rompimento da barragem da Vale, em Brumadinho, a comerciante Ketre mandou a última mensagem daquele dia para seu noivo, Djener, funcionário da mineradora, companheiro de uma vida, namorados por 13 anos, amigos durante 15, metade da vida dela até então. O casamento já tinha data, a igreja escolhida, as damas de honra convidadas, o vestido comprado. Daquele momento em diante, ela já não tinha mais forças ou condições.

O que se seguiu foram semanas e meses de ansiedade que logo se transformaria em depressão. Djner Paulo Las Casas Melo se tornou oficialmente uma das 272 vítimas da tragédia causada pelo estouro da barragem de rejeitos da Vale. O rompimento varreu casas, matou funcionários e moradores da cidade e desfigurou o meio ambiente da região. Para as famílias restou a dor. Aos pais, mães, irmãos e filhos, a mineradora acenou com a possibilidade de um acordo de reparação financeira. A Ketre Daliane de Menezes Paula, não.

##RECOMENDA##

Três anos e três meses após o rumo de sua vida ter sido mudado, no entanto, o Tribunal Superior do Trabalho (TST) reconheceu, no dia 16, o direito da noiva e obrigou a Vale, que recorria de decisão de primeira instância, a indenizá-la por danos morais. Ketre pediu para não ter o valor divulgado. A Justiça considerou não haver dúvidas sobre o relacionamento e destacou que os preparativos para a cerimônia estavam adiantados, com contratações e pagamentos já feitos.

"A negligência da reclamada permitiu que a vida do noivo da autora fosse ceifada prematuramente, retirando de ambos a oportunidade de vivenciarem um dos momentos considerados mais especiais pela sociedade humana", destaca a decisão. "O falecimento abrupto de uma pessoa que se entende da família, dado o vínculo duradouro com a reclamante, configura perda imensurável e incalculável, gerando atribulações, mágoas, aflição e inegável sofrimento íntimo."

"Foi meu primeiro namorado, meu primeiro tudo. Ia me casar - queria ficar junto para sempre - e a Vale me colocou como nada. Por muitas vezes me senti humilhada pela empresa", diz Ketre. "Não é algo para comemorar (a indenização), mas é uma conquista."

Há oito meses, ela tenta reconstruir a vida e fazer planos. Saiu da casa dos pais, foi morar sozinha, em Brumadinho mesmo. Desde o oitavo dia após a tragédia, faz acompanhamento psicológico. O tempo, no entanto, passa devagar e encontrar novos significados é um desafio. "Fico pensando por que não encontrei com o Djener no dia anterior da morte. Liguei à noite, mas ele havia feito um turno diferente, estava dormindo"

Indenizações

Até agora, três anos e três meses após o rompimento da barragem de rejeitos, diz a Vale, entre os familiares de trabalhadores falecidos, mais de 1,7 mil pessoas fecharam acordos de indenização, com valores que totalizam mais de R$ 1,1 bilhão. "Todos os empregados, próprios ou terceirizados, mortos no rompimento da B1, já tiveram ao menos um familiar com acordo de indenização firmado", afirma a mineradora. Questionada, a empresa não respondeu se há outras pessoas na mesma situação de Ketre.

As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.

A Justiça do Trabalho condenou a Vale S.A. ao pagamento de uma indenização por danos morais no valor de R$ 100 mil ao trabalhador que sobreviveu ao rompimento da barragem da Mina Córrego do Feijão, na cidade de Brumadinho, após fugir do local para não ser alcançado pela lama. Ele explicou que, no dia da tragédia, em 25 de janeiro de 2019, estava fazendo a manutenção da linha de trem, localizada nas proximidades da unidade, quando teve que correr desesperadamente para salvar a própria vida. “Caso contrário, seria engolido pelos rejeitos e pela lama”, disse o sobrevivente da tragédia.

O trabalhador contou que, diante das circunstâncias vivenciadas, sofreu forte abalo moral, adquirindo síndrome do pânico, ansiedade e alopecia. Por isso, pediu a condenação da empresa ao pagamento da indenização por danos morais. O juízo da 5ª Vara do Trabalho de Betim julgou parcialmente procedentes os pedidos formulados, concedendo a indenização.

##RECOMENDA##

A empresa interpôs recurso. Na contestação, havia negado que o trabalhador, que era empregado de uma empresa de logística e transporte ferroviário, contratada pela Vale, estivesse trabalhando em local atingido pela lama.

Porém, testemunhas ouvidas confirmaram a versão do trabalhador. Uma delas contou que, no dia do acidente, estava com o operário fazendo a troca de uma máquina de chave. Informou que eles perceberam algo errado, quando ouviram um barulho muito forte e estranho, e observaram que as árvores estavam caindo.

Declarou que foi possível ouvir gritos de pessoas que passavam em uma estrada próxima, dizendo que a barragem havia se rompido, e que existia uma distância de 50 metros entre o local em que estava na linha férrea e a estrada, que ficava do outro lado do rio.

Relatou ainda que, para escapar, saíram correndo, passaram por um pontilhão estreito, que ficava em cima do rio, até alcançar o carro. “A lama começou a entrar no rio, aumentando o volume. Esperamos mais dois trabalhadores chegarem e fugimos. Se não tivéssemos saído naquele momento, não teríamos sobrevivido, já que houve o desbarrancamento da linha férrea, onde prestávamos serviço.”

Explicou, por último, que eles correram muito risco ao atravessar o pontilhão estreito, com os cabos de alta-tensão caindo no chão, devido à chegada da lama. A testemunha confirmou que nunca recebeu treinamento para inibir os possíveis riscos, decorrentes do eventual rompimento da barragem.

No entendimento do desembargador relator, Anemar Pereira Amaral, as testemunhas ouvidas narraram, com riqueza de detalhes, a experiência traumática que vivenciaram. “Os depoimentos foram firmes e convincentes no sentido de que o trabalhador, no dia do acidente, apesar de não estar dentro da Mina Córrego do Feijão, estava prestando serviços em local atingido pela lama”.

Na visão do julgador, a atividade de mineração, exercida pela Vale S.A., pode ser incluída entre aquelas que geram responsabilidade objetiva, pois se trata de atividade de alto risco, principalmente “se considerarmos a possibilidade de rompimento das barragens, de forma a atrair a aplicação do parágrafo único do artigo 927 do CC/2002”. Assim, segundo o magistrado, nenhuma relevância tem para os autos do processo o fato de a empresa ter concorrido ou não com culpa no acidente, uma vez que se trata de nítido caso de responsabilidade objetiva.

De qualquer forma, o julgador ressaltou que, conforme amplamente divulgado na mídia, o acidente ocorreu em razão de falha estrutural da barragem, o que evidencia, segundo o desembargador, a culpa da Vale S.A., tomadora de serviço do trabalhador. “Além disso, a prova oral demonstrou que, no dia do acidente, não havia placas indicando a rota de fuga, no caso de rompimento da barragem, o que aumentou os riscos sofridos e a tensão no momento da fuga.”

Para o desembargador, ainda que o profissional não tenha sofrido lesões físicas que gerassem incapacidade, houve dano moral, pois ele foi atingido em sua esfera íntima, por vivenciar grande angústia e sofrimento diante da nítida iminência de sofrer uma morte trágica. “Frise-se que o atestado médico demonstra que o empregado, em razão do infortúnio, foi diagnosticado com transtorno de estresse pós-traumático”.

Nesse contexto, o magistrado reconheceu que o trabalhador faz jus ao pagamento de indenização por danos morais, mantendo o valor fixado na sentença de R$ 100 mil. Segundo o julgador, essa é a quantia já acordada a título de danos morais em outra ação para os trabalhadores sobreviventes, assim considerados os empregados próprios e terceirizados que estavam trabalhando na Mina do Córrego do Feijão no momento do rompimento da barragem. A Vale ajuizou recurso de revista, que aguarda decisão no TRT-MG sobre o prosseguimento do recurso.

Da assessoria.

A Justiça do Trabalho negou o pedido de indenização por danos morais a nove primos de um trabalhador morto após o rompimento da barragem da Mina Córrego do Feijão, na cidade de Brumadinho, em 25/01/2019. Apenas a avó do profissional, o qual exercia na unidade a função de mecânico montador, receberá indenização por danos morais no valor de R$ 80 mil, visto que foi negado ainda o pedido do casal de tios, que integram também a autoria da ação trabalhista. A decisão é dos integrantes da Quinta Turma do TRT-MG, que mantiveram, sem divergência, a sentença do juízo da 5ª Vara do Trabalho de Betim.

A família do trabalhador alegou na ação que sofreu forte impacto emocional “em razão da referida perda, pois possuíam relação íntima e de puro afeto com o 'de cujus'”. Testemunhas ouvidas confirmaram que a família era muito unida. Uma delas disse que o grupo chegou a morar próximo quando o trabalhador era mais jovem, e que via sempre todos nas reuniões de igreja aos domingos.

##RECOMENDA##

Apesar de revelar a excelente convivência entre o falecido e os familiares, o juízo da 5ª Vara do Trabalho de Betim entendeu que os depoimentos não provam a convivência diária, habitual e íntima entre eles, especialmente na vida adulta do trabalhador. Pela sentença, não há prova de relacionamento especial com os autores da ação, exceção feita à avó. “As particularidades de se encontrarem na igreja ou em reuniões familiares episódicas não têm o condão de elevá-los a tal patamar. No caso da avó, o parentesco em linha reta ascendente torna a perda do ente em dano in re ipsa, o qual somente poderia ser afastado se comprovado ruptura da relação avó e neto, o que não se vislumbra no caso”.

A família interpôs recurso contra a decisão, reforçando o pedido de indenização e ainda a majoração do montante arbitrado na sentença em favor da avó da vítima. A contratante alegou que cumpriu as normas de segurança e saúde do trabalho, não tendo havido culpa no acidente. Afirmou ainda que só são legitimados para sofrer os danos morais em ricochete aqueles que possuem estreita relação afetiva com a vítima, como cônjuge, filhos e pais.

Em relação à responsabilidade objetiva da empresa, o desembargador relator Paulo Maurício Ribeiro Pires concordou integralmente com as ponderações do juízo da 5ª Vara do Trabalho de Betim. “Ao realizar a deposição de rejeitos de mineração, a empregadora criou risco acentuado aos trabalhadores e terceiros, o que, sabidamente, resultou na tragédia do rompimento da Barragem, sendo, portanto, suficiente estabelecer o nexo de causalidade entre a conduta praticada e o resultado danoso para que surja o dever de indenizar”.

Para o desembargador, o caso realmente atrai a responsabilidade objetiva da mineradora, visto que o trabalho do mecânico montador ocorria em área de mineração, que implicava altíssimos riscos à integridade física e sobrevivência dele. “E é óbvio que, por imperar no Direito do Trabalho o princípio da alteridade, não é permitido transferir qualquer risco aos trabalhadores - devendo-se o risco, aqui, ser encarado em seu sentido amplo, não se limitando aos perigos de ordem meramente financeira, mas também aos riscos sociais, às perdas humanas”, ressaltou.

O julgador pontuou ainda que o parentesco em linha reta ascendente observado nos autos em relação à avó afasta a necessidade de prova do dano, “haja vista a subversão da ordem natural da vida, que impõe aos mais velhos a angústia de ver partir prematuramente o familiar que viram crescer, prestaram cuidados e devotaram amor e preocupação. Sofrem os avós pela própria perda e pela perda dos filhos deles, pais do neto falecido”.

Dessa forma, o julgador reconheceu configurado o direito da avó de ser indenizada por danos morais. Quanto ao valor, o magistrado observou que a reparação do dano moral significa uma forma de compensação e não de reposição valorativa de uma perda. Para o magistrado, a indenização deve ser fixada segundo o arbítrio do julgador, observando-se as peculiaridades do caso concreto e o princípio da proporcionalidade. “A meu ver, o referido montante é plenamente adequado ao caso em questão, por ser consentâneo com a extensão do dano, com a situação econômica das partes, com a natureza pedagógica da reparação e com os valores estipulados em outras demandas similares”.

Quanto aos primos e ao casal de tios, o relator também não identificou vínculo afetivo especial na relação entre eles e o trabalhador falecido. “Certo é que a convivência decorria de residirem em locais próximos e de frequentarem a mesma igreja, não havendo, no entanto, coabitação ou dependência econômica de qualquer tipo. A prova testemunhal não conseguiu demonstrar o necessário vínculo especial entre eles”, concluiu o julgador negando provimento aos apelos.

O juízo da 5ª Vara do Trabalho de Betim acolheu ainda a preliminar de conexão/continência (indicação da existência de ações semelhantes propostas em separado, para que sejam reunidas e julgadas em conjunto) e extinguiu o processo sem resolução de mérito para outras quatro pessoas que também foram autoras da ação. Em grau de recurso, o relator concordou integralmente com o entendimento de origem. “Verifica-se a existência de continência desta demanda com as ações por eles ajuizadas perante o Juízo Cível, sendo as últimas mais abrangentes que a presente ação, aplicando-se ao caso o disposto no artigo 54 e seguintes do CPC”, concluiu. Cabe recurso da decisão.

Da assessoria.

A 4ª Turma do Tribunal Regional do Trabalho (TRT) de Minas Gerais julga nesta quarta-feira (2) o recurso da Vale contra o pagamento de indenização de R$ 1 milhão por dano moral para cada trabalhador morto no rompimento da Barragem do Córrego do Feijão, em Brumadinho, há três anos. Também será julgado o pedido para que esse valor suba para R$ 3 milhões, de acordo com ação impetrada pelo Sindicato dos Trabalhadores na Indústria de Extração de Ferro e Metais Básicos de Brumadinho (Metabase Brumadinho).

Pela decisão de primeira instância, a indenização será paga aos espólios e herdeiros dos 131 trabalhadores diretos da mineradora mortos no derramamento de rejeitos em janeiro de 2019, num total de R$ 131 milhões. Os trabalhadores indiretos que atuavam na mineradora não fazem parte da ação impetrada pelo Sindicato Metabase Brumadinho.

##RECOMENDA##

No recurso, os advogados da Vale pedem que 21 dos 131 trabalhadores mortos sejam removidos da ação, alegando que não compõem a categoria do sindicato. Também pedem pela exclusão de trabalhadores que já entraram com ações individuais ou fizeram acordos com a empresa, com cláusula de quitação.

"A nossa expectativa é que o Tribunal Regional do Trabalho não permita que se perpetue a recusa da Vale em reparar os danos causados às maiores vítimas do rompimento da barragem de Brumadinho e mantenha a condenação da Vale, elevando o valor da indenização", afirmaram em nota os advogados do Sindicato Metabase Brumadinho, Luciano Pereira e Maximiliano Garcez.

No início da semana, o rompimento da barragem da Mina Córrego do Feijão, em Brumadinho-MG completou três anos.  O acidente deixou 259 mortos e cerca de 11 pessoas desaparecidas na cidade mineira. Foi o terceiro e maior acidente com barragens no mesmo estado, em um espaço de dez anos, basta lembra da  Barragem de Herculano Mineração, em Itabirito - MG (2014); Barragem do Fundão, em Mariana (2015).  

##RECOMENDA##

 Nesta terça-feira (25), políticos repercutiram os três anos do rompimento da barragem da Vale em Brumadinho, Minas Gerais. Em 25 de janeiro de 2019, o desastre deixou 272 pessoas mortas e poluiu o rio Paraopeba, afluente do São Francisco, provocando a morte da vida aquática, bem como conflitos por água e terra em pelo menos 11 áreas do estado. Até hoje, não houve nenhum tipo de responsabilização penal pelo incidente.

“Três anos da tragédia em Brumadinho e nada mudou. O que segue é a impunidade e a sensação de esquecimento. Centenas de famílias destruídas e que seguem na luta por justiça. Um crime socioambiental que não podemos esquecer”, lamenta o senador Fabiano Contarato (PT-ES).

##RECOMENDA##

[@#video#@]

Já a deputada federal Sâmia Bomfim (PSOL-SP), classifica o caso Brumadinho como "o maior crime ambiental da história do Brasil". "A lama ainda toma conta. 272 pessoas morreram em Brumadinho e nenhum executivo da Vale foi responsabilizado. O lucro não vale a vida”, cobra.

Queda de braço na Justiça

Em fevereiro de 2020, a Justiça estadual aceitou a denúncia do Ministério Público de Minas Gerais (MPMG), dando início ao processo relativo ao caso Brumadinho. Foram responsabilizadas 16 pessoas, sendo 11 funcionários da Vale e cinco da Tüv Süd, consultoria alemã responsável por assinar o laudo de estabilidade da estrutura que se rompeu. Neste âmbito, todos os réus respondiam por homicídio doloso e crimes ambientais, bem como ambas as empresas eram julgadas.

Apenas em setembro de 2021 um prazo de 90 dias foi aberto para que os réus apresentassem suas defesas.A juíza Renata Nascimento Borges também permitiu que os espólios de 36 vítimas atuassem como assistentes da acusação do MPMG. Esse processo, no entanto, perdeu a validade em outro de 2021, depois de um ano e oito meses de tramitação. Na ocasião, os cinco integrantes da sexta turma do STJ entenderam, de forma unânime, que o caso não é da competência da Justiça estadual. Para os magistrados, o julgamento deveria ser federalizado em razão das acusações de declarações falsas prestadas à órgão federal, desrespeito à Política Nacional de Barragens e danos a sítios arqueológicos, que configuram patrimônio da União.

[@#podcast#@]

No STJ, o julgamento ocorreu depois que a defesa do ex-presidente da Vale, Fábio Schvartsman, que era um dos réus, apresentasse um habeas corpus. Também foi aceita a tese de incompetência da Justiça estadual, a despeito da discordância do Ministério Público Federal (MPF) e do MPMG. No julgamento, a subprocuradora-geral da República, Luiza Frischeisen, chegou a declarar: “não há descrição de crime federal, não há crime federal, não há bem jurídico da União atingido aqui na denúncia”.  São os advogados do réu que defendem a existência de crimes federais.

Em junho de 2020, o STJ já havia julgado um conflito de competência e mantido o processo na esfera estadual. Na época, os integrantes da terceira sessão negaram, por sete votos a um, outro pedido realizado pela defesa de Fábio Schvartsman. Os ministros que mudaram que participaram de ambos os julgamentos e mudaram de opinião foram Laurita Vaz e Rogerio Schietti Cruz. Em 2021, eles votaram pela tramitação do caso na instância federal, embora, um ano antes, já tivessem concordado com a manutenção do caso na Justiça estadual.

Quando o STJ confirmou a federalização do caso, o MPMG apresentou um recurso ao STF, que segue sem marcar data para analisar o caso. “Os crimes que aconteceram em Brumadinho, na bacia do rio Paraopeba, e em Mariana, na bacia do rio Doce, não foram casos isolados, acidentes ou por acaso. Fazem parte de um modelo de mineração que é destrutivo, predatório e que visa o lucro acima de tudo”, denuncia o deputado federal Padre João (PT-MG) em suas redes sociais.

A Polícia Federal indiciou 19 pessoas e as empresas Vale e TUV SUD por crimes relacionados ao rompimento da barragem da na mina do Córrego do Feijão em Brumadinho, que deixou 270 mortos em 25 de janeiro de 2019. Ao todo, 262 vítimas da tragédia foram identificadas e oito seguem desaparecidas.

Aos 19 indivíduos indiciados, que trabalhavam para as empresas como consultores, engenheiros, gerentes e diretores, a PF imputa crime de homicídio doloso (dolo eventual) duplamente qualificado pelo emprego de meio que resultou em perigo comum e de recurso que dificultou ou tornou impossível a defesa, por 270 vezes.

##RECOMENDA##

Já às companhias, os investigadores atribuem uma série de crimes ambientais, considerando que a Vale era responsável pela barragem e a TUV SUD pela auditoria da estrutura.

Segundo a PF, a investigação que culminou nos indiciamentos foi concluída nesta quinta-feira, 25, e consiste em uma segunda fase da investigação sobre a tragédia.

O primeiro inquérito foi concluído em 20 de setembro de 2019, com a apuração de três crimes ligados à elaboração e apresentação de declarações de condição de estabilidade falsas perante a Agência Nacional de Mineração e a Fundação Estadual do Meio Ambiente.

No âmbito do segundo inquérito, a Polícia Federal diz ter identificado crimes ambientais de poluição e contra a fauna terrestre e aquática, a flora, os recursos hídricos, unidades de conservação e sítios arqueológicos, além de um quarto crime de apresentação de declaração falsa perante a ANM.

O inquérito policial segue agora para o Ministério Público Federal, para análise e adoção das medidas de atribuição do órgão - o qual cabe oferecer denúncia contra os envolvidos.

A Sexta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) decidiu anular nesta terça-feira (19) o recebimento da denúncia oferecida pelo Ministério Público de Minas Gerais pelas mortes causadas com o rompimento da barragem da mineradora Vale em Brumadinho (MG).

Os ministros concluíram que a competência para processar e julgar o caso é da Justiça Federal, o que coloca o processo de volta à fase inicial. A ação foi transferida para a 9.ª Vara Federal Criminal de Minas Gerais. O MP informou que vai recorrer da decisão.

##RECOMENDA##

As defesas dos denunciados disseram que houve uma estratégia deliberada do Ministério Público do Estado para manter o caso na esfera estadual. O órgão, por sua vez, diz que a denúncia não descreve nenhum crime de competência federal.

A barragem B1 rompeu em janeiro de 2019, em Brumadinho, na região metropolitana de Belo Horizonte, deixando 259 mortos e onze desaparecidos. A denúncia por homicídio doloso duplamente qualificado e por crimes ambientais foi oferecida um ano depois contra 11 executivos e funcionários da Vale e outros cinco da consultoria Tüv Süd.

O relatório final de um estudo conduzido pela Universidade Politécnica da Catalunha, divulgado nessa segunda-feira (4) pelo Ministério Público Federal (MPF), associa uma perfuração em um ponto crítico da barragem da Mina Córrego do Feijão à tragédia ocorrida em 25 de janeiro de 2019 na cidade de Brumadinho, em Minas Gerais. O procedimento, que estava sendo realizado no momento da ruptura, é considerado o potencial gatilho da liquefação, processo em que os sedimentos sólidos passam a se comportar como fluídos e sobrecarregam a estrutura.

Com sede em Barcelona, na Espanha, a Universidade Politécnica da Catalunha realizou um trabalho de modelagem e simulação por computador para identificar as causas do rompimento da barragem, que deixou 270 mortos e provocou degradação ambiental em diversos municípios mineiros. A instituição foi escolhida pelo MPF com base em sua expertise, e o estudo foi custeado pela Vale, conforme ficou estabelecido em um acordo firmado com a mineradora.

“Sob condições de tensão e hidráulicas semelhantes às do fundo do furo B1-SM-13 durante a perfuração, as análises numéricas mostram que, usando o modelo constitutivo e os parâmetros adotados para os rejeitos, pode ocorrer a liquefação local devido à sobrepressão de água e sua propagação pela barragem”, diz o relatório.

De acordo com o estudo, o perfil do solo no local da perfuração era especialmente desfavorável. Os modelos que sugerem o procedimento como responsável por desencadear o rompimento mostraram-se consistentes com as imagens captadas no momento da tragédia. "O mecanismo de colapso obtido mostra uma ruptura dentro da barragem começando na crista e se estendendo até um local logo acima do dique de partida."

Investigações sobre a tragédia foram feitas em diversas frentes. Comissões parlamentares de inquérito (CPIs) foram abertas no Senado, na Câmara dos Deputados e na Assembleia Legislativa de Minas Gerais. A Polícia Civil também realizou um inquérito que serviu de base para a denúncia do Ministério Público de Minas Gerais (MPMG), aceita pela Justiça em fevereiro de 2020. Por meio dela, 16 pessoas tornaram-se rés – 11 funcionários da Vale e cinco da Tüv Süd, empresa alemã que assinou a declaração de estabilidade da barragem.

Em todas as frentes de investigação, reconheceu-se que o rompimento ocorreu após um processo de liquefação. No entanto, como este é um fenômeno que pode ter múltiplas origens, diversas hipóteses foram levantadas, desde fortes chuvas até abalos sísmicos artificiais provocados por detonações na mina. O estudo da universidade catalã buscou compreender melhor o que de fato aconteceu.

A investigação foi conduzida pelo Centro Internacional de Métodos Numéricos em Engenharia da instituição espanhola e resultou em uma análise de mais de 500 páginas. “É incontroverso que o rompimento da Barragem I envolveu o fenômeno do fluxo por liquefação. A liquefação é um processo associado ao aumento da poropressão, pelo qual a resistência ao cisalhamento é reduzida à medida que a tensão efetiva no solo se aproxima de zero. Apenas materiais contráteis estão sujeitos à liquefação. A liquefação está intrinsecamente relacionada ao comportamento frágil não drenado do solo”, diz o relatório.

Para viabilizar um modelo computacional verossímil, foi feita uma campanha de coleta de amostras dos rejeitos que foram examinados para que se compreendessem suas características geotécnicas. "Eram fofos, contráteis, saturados e mal drenados e, portanto, altamente suscetíveis à liquefação”. Procurada pela Agência Brasil, a Tüv Süd informou que não fará comentários sobre o relatório neste momento.

Já a Vale destacou que o estudo da instituição catalã reforça o entendimento de que não houve nenhum indicativo prévio à ruptura da estrutura.

"[O estudo] também atesta que teria havido uma conjugação particularmente desfavorável de circunstâncias no momento e no local em que se fazia a perfuração do 13º poço vertical por uma empresa especializada, operação essa que se destinava à instalação de equipamentos mais sofisticados para leitura do nível de água no interior da barragem e à coleta de amostras, sendo que, sem essa perfuração, a barragem, nas condições específicas em que se encontrava (inclusive paralisada há mais de dois anos), segundo as simulações matemáticas realizadas para um período de 100 anos, permaneceria estável", afirmou a mineradora.

As conclusões da Universidade Politécnica da Catalunha coincidem com constatações do laudo de engenharia assinado por peritos da Polícia Federal (PF). Produzido no âmbito do inquérito que investiga a tragédia, o documento está sob sigilo. Algumas informações, no entanto, foram divulgadas em fevereiro deste ano em entrevista coletiva. Os peritos testaram seis hipóteses como gatilho de liquefação e também concluíram que a perfuração desencadeou a ruptura abrupta.

As investigações conduzidas pela PF ainda estão em andamento. Em setembro de 2019, anunciou-se o desmembramento dos trabalhos, e 13 pessoas foram indiciadas por falsidade ideológica e uso de documentos falsos. Para a PF, houve fraude na emissão de relatórios técnicos, incluindo a declaração de estabilidade da barragem, que desconsiderou os parâmetros de engenharia.

A apuração de crimes ambientais e contra a vida teve sequência. A identificação do gatilho da liquefação era considerada fundamental para que houvesse uma definição sobre a possibilidade de haver indiciamentos por homicídio. Procurada pela Agência Brasil, a Polícia Federal informou que o inquérito ainda está sob sigilo. "Deve ser concluído em breve, pois, para tanto, depende da conclusão de diligências pendentes", acrescenta.

##RECOMENDA##

Deformações internas

O relatório analisou várias outras hipóteses para o gatilho da liquefação. Uma delas era defendida por auditores externos contratados pela Vale. Um painel de especialistas internacionais da área de geotecnia foi organizado pela mineradora. Em dezembro de 2019, foi apresentado um relatório no qual se conclui que um fenômeno conhecido como creep contribuiu para a liquefação. Trata-se do acúmulo de pequenas deformações internas. Em combinação com chuvas fortes no fim de 2018, esse processo teria levado ao rompimento da barragem.

No entanto, as simulações descartaram tal possibilidade. "A magnitude dos efeitos da taxa de deformação medidos nos rejeitos foi sempre pequena e não indicou um papel relevante do processo de creep no rompimento", diz o estudo.

De acordo com os pesquisadores, as precipitações também não se mostraram capazes de abalar a estabilidade. Conforme as análises, foi necessário algum fator, ou evento adicional, para que a barragem se rompesse. Além da perfuração que ocorria no dia da tragédia, não foi identificado nenhum outro potencial gatilho de liquefação. "Em particular, os cálculos realizados incorporando apenas os efeitos de aumento da precipitação e do creep, isoladamente ou em combinação, não resultaram em um rompimento geral da barragem.”

Segundo o estudo, registros sismográficos sugerem que uma liquefação contida pode ter ocorrido em junho de 2018, sete meses antes da tragédia. Na época, houve um incidente considerado grave durante procedimento em que a Vale buscava drenar água do lençol freático. "Foram causados vazamentos visíveis de lama em vários pontos da barragem, que foram rapidamente contidos. O incidente provocou um aumento local e temporário nas pressões piezométricas da água e algum abatimento na barragem", diz o relatório.

Processo criminal

Os 16 reús respondem por homicídio doloso e diferentes crimes ambientais. Mesmo sem elucidar qual foi o gatilho da liquefação, o MPMG os denunciou por considerar que já existia farto material probatório capaz de identificar responsabilidades e omissões por parte da Vale e da Tüv Süd.

Investigando em parceria com a Polícia Civil, os promotores que assumiram o caso concluíram que as duas empresas tinham conhecimento da situação crítica da barragem, mas não compartilharam as informações com o poder público e com a sociedade e assumiram os riscos. No fim do mês passado, foi finalmente aberto prazo para que os réus apresentem suas defesas. Como a denúncia é extensa, a juíza Renata Nascimento Borges deu a eles 90 dias.

Ao concluir o inquérito, a Polícia Federal pode indiciar outras pessoas. Mas, para que estas também passem à condição de rés, precisariam ser alvo de denúncias do MPMG ou do MPF aceitas judicialmente. No último caso, poderia ser criado um conflito de competência com julgamentos paralelos na Justiça estadual e Justiça federal.

Dois anos e oito meses após a tragédia, ainda não foram encontrados os restos mortais de nove vítimas. Neste sábado (2), os bombeiros localizaram um corpo, mas ainda serão feitas análises para confirmar se pertence a alguma das vítimas. As buscas continuam. No mês passado, foi encontrado o corpo de Juliana Creizimar de Resende Silva, que tinha 33 anos quando perdeu a vida. O reconhecimento se deu pela arcada dentária.

Páginas

Leianas redes sociaisAcompanhe-nos!

Facebook

Carregando