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O defensor Jovino Bento Júnior, por meio da Defensoria Pública da União (DPU), entrou com ação pública na Justiça do Trabalho, na última segunda-feira (5), contra a empresa Magazine Luiza, que criou um processo seletivo de trainee destinado para pessoas negras. A ação cobra R$ 10 milhões da varejista por danos morais coletivos. O autor da petição diz que o processo seletivo é racista e considera a iniciativa como “marketing de lacração” para fins políticos. 

Para o autor da petição, a iniciativa da varejista “se insere no conceito de marketing de lacração e visa, com isso, ganho político, num primeiro momento, para, em seguida, ampliar seus lucros e sua faixa de mercado em magnitude sem precedentes históricos e representando risco à democracia a médio prazo”, diz ação.

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Dentre os argumentos, Jovino observa que tal conduta não caberia, pois a empesa “sempre contratou negros em seus programas de trainee, algo plenamente comum. Portanto, nada justifica que pretenda, agora, que seu programa seja exclusivo para determinada raça/cor, em desarrazoado detrimento de todos os demais trabalhadores do País”.

O documento ainda afirma que o programa “não é medida necessária – pois existem outras e estão disponíveis para se atingir o mesmo objetivo -, e nem possui proporcionalidade estrita – já que haveria imensa desproporção entre o bônus esperado e o ônus da medida, a ser arcado por milhões de trabalhadores”.

Com isso, a ação alega discriminação com trabalhadores brancos, indígenas e asiáticas, inviabilizando o acesso dos mesmos ao mercado de trabalho. O texto ainda utiliza falas do presidente da Fundação Palmares, Sérgio Camargo, feitas nas redes sociais, para justificar “que considera discriminação racista a conduta da Magazine Luíza”, tal como mostra o print na petição. 

Ações indeferidas

Desde o lançamento do programa trainee da varejista Magazine Luiza, realizada no mês de setembro, que o assunto reverberou no âmbito jurídico. Nesse sentido, o Ministério Público do Trabalho (MPT) já indeferiu 11 denúncias de “prática de racismo” feitas contra a iniciativa da empresa. 

No entanto, para o MPT as condições colocadas pela varejista trata-se de ação afirmativa de reparação histórica”, inclusive prevista no Estatuto da Igualdade Racial, que permitem a realização de ações como essas, tal como tem sido realizado em outras empresa como a Ambev.

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Durante o evento on-line Movimento Afro Presença, que inicia nesta quarta-feira (30), a empresa de telefonia brasileira Tim irá convidar  estudantes a participarem de um programa de estágio totalmente inclusivo, que será anunciado ainda este ano, com foco e metas de contratação de estudantes negros e negras, pessoas LGBTI+ e pessoas acima de 45 anos, usualmente preteridos em programas de seleção. Os interessados em participar da transmissão devem realizar as inscrições gratuitamente pela internet. O momento será realizado entre os dias 30 de setembro e 2 de outubro. 

As ações da operadora para ampliar a participação de pessoas negras no mercado de trabalho e contribuir com indicadores sociais mais igualitários no país serão apresentadas também pela VP de Recursos Humanos da TIM, Maria Antonietta Russo, em um debate no dia 2 de outubro, às 16h. A apresentação será dentro do painel “Racismo Estrutural Empresarial”, no eixo intitulado “Sociedade em Debate” na programação da conferência.

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O encontro está sendo idealizado e coordenado pelo Ministério Público do Trabalho (MPT) e realizado pelo Pacto Global da Organização das Nações Unidas (ONU). Durante a transmissão também serão apresentadas as políticas inclusivas já em curso na companhia, onde pessoas negras representam 34% dos funcionários.

Durante os três dias, executivos da Tim estarão presentes em um stand virtual, onde apresentarão a operadora aos participantes, diariamente, das 10h às 20h, com conteúdos sobre negócio, tecnologia, evolução dos serviços e ofertas, ações de clima, engajamento, diversidade e inclusão, ações de responsabilidade social e seus principais programas de treinamento e desenvolvimento de carreira. Também promoverão uma roda de conversa sobre carreira e representatividade negra com profissionais da companhia. Os líderes ainda irão discutir com os participantes sobre os desafios do mercado de trabalho e apresentarão oportunidades de ingresso em diferentes áreas de atuação na empresa. 

De acordo com a VP de Recursos Humanos da TIM, Maria Antonietta Russo, “a força e as peculiaridades de cada país se refletem nas características do seu povo e na sua cultura. O Brasil é composto por várias etnias, histórias e uma imensa diversidade cultural. Não somente devemos valorizar essa riqueza, mas sobretudo buscarmos o equilíbrio social, que é a base da evolução de uma sociedade. Neste sentido, o mundo empresarial pode contribuir muito, não somente com políticas internas, mas também estimulando novas iniciativas e a reflexão na sociedade. Por isso, estamos muito orgulhosos de participar deste evento e gerar network, trocar experiências, estimular conhecimento e, sobretudo, dar a oportunidade a jovens estudantes negros e negras de expressar o próprio talento” comenta, de acordo com informações da assessoria.

As eleições municipais de 2020 terão, pela primeira vez, mais candidatos pretos e pardos do que brancos, segundo os números do Tribunal Superior Eleitoral (TSE).

Segundo levantamento publicado pelo jornal Folha de São Paulo, do total de candidaturas computadas até agora, 51% são candidatos negros, ou 263 mil candidaturas contra 248 mil candidatos brancos, o que representa 48% do total. Entre os negros, 208 mil se declaram pardos e 55 mil, pretos.

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A cor dos candidatos passou a ser perguntada nos registros apenas em 2014 e até agora as eleições não tinham registrado maioria negra entre as candidaturas, apesar de que o grupo representa a maior parte da população brasileira.

Em 2020, até agora o número total de candidatos computados foi recorde, com 523 mil candidaturas postuladas no TSE, que espera receber até 645 mil candidaturas.

O aumento do número de candidatos negros se dá no contexto da introdução de ações afirmativas nas eleições deste ano, garantindo o aumento de verbas de propaganda eleitoral e campanha de candidaturas negras nos partidos.

A confirmação da medida, que foi implementada por decisão liminar do ministro Ricardo Lewandowski, será avaliada pelo plenário do Supremo Tribunal Federal (STF) ao longo da semana.

O TSE havia decidido que a partir das eleições de 2022, as verbas de campanha e propaganda eleitoral deverão ser divididas de forma equânime entre negros e brancos nos partidos.

Da Sputnik Brasil

“Pela primeira vez eu vou ter uma seleção onde vão olhar as minhas habilidades e não a cor da minha pele”. Essas palavras expressam o sentimento do estudante de engenharia de produção Marcos Madeira, 31 anos. Ele participou da primeira seleção destinada a pessoas negras promovida pela cervejaria Ambev, que assim como a varejista Magazine Luiza, recebeu diversas críticas sobre a decisão após repercussão das oportunidades.

Representatividade em postos de trabalho

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Segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), 64,2% da população desempregada e 66,1% da população com mão-de-obra subutilizada são representadas por pessoas negras. Ou seja, através desses dados podemos considerar que mesmo sendo mais de 56% da população brasileira, pessoas negras ainda não são maioria em postos de trabalho com algum prestígio.

Hoje, Marcos está em seu primeiro ano de estágio - viabilizado pelo programa “Representa”-, e atua na área de relações corporativas na Ambev. Morador da cidade de São Paulo, ele é um dos primeiros a fazer um curso superior e a alcançar um cargo de destaque dentro de sua família.

“Quando a gente pensa no racismo  - sistema político fundado sobre o direito de uma raça considerada pura e superior sobre outra - e como ele é construído, no preconceito, a pessoa negra é sempre colocada num local de ser inferior”, explicou o futuro engenheiro de produção, sobre referências negras. “Então, quando você vê uma grande empresa que abre um processo seletivo você não se enxerga nela”, completou.

Marcos é filho de Marilene Pereira Madeira, que em toda sua vida profissional atuou como auxiliar de serviços gerais. De origem simples, Marilene estudou até o terceiro ano do ensino fundamental. O filho conta que dona Marilene sempre foi muito rígida quanto aos estudos e que desde de muito cedo foi estimulado a buscar alternativas profissionais para além da qual Marcos conhecia.

“Eu entrei primeiro na faculdade, e isso certamente causou um impacto com relação aos meus irmãos”, relembrou. “Depois minha irmã mais velha acabou entrando e até já se formou, e meu irmão mais novo ainda não entrou na faculdade, mas ele já tem essa referência dentro da casa dele que eu acho fundamental”, comemorou. Antes do cargo na cervejaria, o jovem trabalhava como dog walker - passeador de cães, em inglês - desde os 15 anos e custeava seus estudos com a função.

Mesmo com a vontade de mudar a sua realidade, indo pelo caminho indicado pela mãe, Marcos relata que as condições nunca eram as mesmas. “Sempre é tudo muito injusto quando nós estamos falando sobre negros e brancos”, enfatizou.

“Sempre vai ser injusto para a pessoa negra, porque ela está mil vezes atrás. Ela nunca parte da mesma linha de partida”. “Nós entendemos que os processos como injustos, porque a maior parte das experiências que as pessoas que estamos concorrendo tem a gente não tem”, desabafou Marcos, ao analisar como geralmente ocorre as seletivas.

A reflexão de Marcos, mostra-se similar a outros relatos vistos nas redes sociais. Atualmente trabalhando na Magazine Luiza como trainee, Emilene Lopes Angelo, contou a sua experiência com processos seletivos em seu perfil no LinkedIn e comemorou a iniciativa da empresa em promover uma seleção que oferece condições mais justas a pessoas que não tiveram as mesmas oportunidades.

No relato, Emilene diz que na reta final de sua graduação a sua meta era “ser trainee em uma grande empresa”, mas que uma das barreiras era o inglês avançado, um obstáculo na evolução nas seletivas. “E aí surgiu o programa da Magazine Luiza que pedia inglês intermediário e eu pensei 'não tenho nada a perder, vou tentar'. Passei pelo teste de inglês e assim fui sendo aprovada de etapa em etapa”, relembrou com felicidade.

O ano era 2015 e Emilene tinha sido aprovada para a turma daquele ano. “Essa foi a oportunidade de ouro da minha vida. Eu, preta e pobre, estava tendo a chance de entrar em um programa de jovens talentos em uma grande empresa”, disse, ao LeiaJá. Ao finalizar o relato, a profissional demonstra gratidão pela oportunidade que teve na "Magalu" e comemora o lançamento do programa trainee 2021, destinado apenas a pessoas negras.

Se formos basear as experiências trazidas em dados, iremos identificar que apenas 4,7% das posições executivas são ocupadas por pessoas negras, ou seja, ao passo que subimos na pirâmide dos cargos, menos representativa racial existe. Os dados são da Instituto Ethos e pelo Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID).

Para ampliar os apontamentos, conversamos com a advogada e presidenta da Comissão de Igualdade Racial da Ordem dos Advogados do Brasil em Pernambuco (OAB/PE), Manoela Alves. A magistrada explica que “o artigo quinto da constituição vai falar que todos são iguais perante a lei, mas na prática sabemos que somos diferentes”.

Nesse sentido, iremos “entender essa igualdade como uma igualdade material, que é aquela que vai nos levar a entender que nós precisamos tratar desiguais de forma desigual na medida de sua desigualdade”, ou seja, através desse “tratamento desigual é que iríamos poder de fato igualar [as oportunidades]”, explica Manoela. “Então, é por isso que nós falamos hoje de equidade”, diz.

Como exemplo, há o modelo de seleção para pessoas negras realizada pela Ambev. Segundo a gerente de Gente e Gestão, Rosi Teixeira,  o programa fez o “exercício de olhar para nosso ambiente corporativo e identificamos, por exemplo, que a diversidade étnica e inclusão racial são pontos a serem desenvolvidos”.

Além da definição de público, outras mudanças foram feitas com o objetivo de oportunizar acessos aos jovens negros universitário dentro da cervejaria. “Além de eliminar o teste de inglês do processo de estágio, a cervejaria  adotou seleção às cegas, que não avalia idade, gênero, curso ou faculdade. A Ambev quer deixar nossas portas abertas e incluir cada vez mais pessoas e ajudá-las a se desenvolverem. A companhia não olha para o curso ou para a proficiência em inglês, porque o importante é o candidato ter 'fit' com a cultura - que estimula a curiosidade, incentiva que os talentos assumam desafios e tenham mentalidade de dono nos projetos”, explica Rosi. 

Para a advogada Manoela Alves, atitudes como essas vão além da empregabilidade. “O próprio Estatuto da Igualdade Racial também pressupõe o apoio às políticas afirmativas calcadas nas questões raciais numa perspectiva de garantir igualdade de oportunidades a todas pessoas, de todas as raças, dentro das instituições”, afirma a profissional. 

Manoela garante ainda  que não há ilegalidade com relação a processos seletivos destinados a um grupo social específicos. Pelo contrário: ela afirma que o Supremo Tribunal Federal (STF) “reconheceu a constitucionalidade de processo de cotas para pessoas negras acessarem o ensino superior”, por exemplo.

E reforça que “esse tipo de política não pode ser vista como uma política desmerecedora do trabalho ou da competência da população negra. Pelo contrário, precisa entender essas políticas afirmativas numa perspectiva de inclusão social e entender também numa perspectiva de garantir as mesmas oportunidades para todas e todos no contexto específico” que viabilize “mais uma oportunidade de ascender profissionalmente nos espaços das instituições corporativas”.

Repercussão

Visto com entusiasmo por muitos jovens negros, o anúncio de vagas voltadas apenas para grupos afrobrasileiros gerou debates em todo Brasil. Entre elogios e até processos no Ministério Público, alegando “racismo reverso”, pessoas da sociedade civil organizada expõem que o conceito é equivocado. 

“Sobre as pessoas que acusam a empresa de racismo: primeiro, elas não sabem o que é racismo; segundo, elas estam sendo racistas; e terceiro, elas não têm o mínimo de conhecimento e de percepção do que é desigualdade racial na sociedade brasileira, neste caso, o ‘racismo reverso’ não existe”, detalhou Adrielly Gomes, ativista do movimento negro e graduanda em letras. “Essas pessoas estão agindo de má-fé e estão extremamente equivocadas”, pontuou.

Adrielly vai além e explica que é importante entender que o “racismo estrutural não fala só de pessoas especificamente e não só de instituições especificamente, nos está falando de uma sociedade como um todo”.

Nesse sentido, “as instituições e as pessoas são materializadas através da estrutura social, essa estrutura que nega direitos para as pessoas negras e indígenas em prol de grupos raciais dominantes, que são as pessoas brancas. Isso Silvio Almeida explica muito bem no livro 'Racismo Estrutural', inclusive”, conclui.

A ativista também aponta que ao “ver instituições tendo que abrir vagas especificamente para pessoas negras, já sabe que tem alguma coisa errada”, pois se há uma necessidade de promover ações como essas “é porque existe uma sociedade que ainda é pautada pela desigualdade racial, que pessoas negras ainda estão em desvantagem em relação às pessoas brancas”. 

Apesar da críticas negativas sobre a iniciativa, e diante do racismo estrutural, a gestora de Gente da Ambev, Rosi Teixeira, revela que a empresa continuará com o compromisso de ser “agente dessa mudança e ajudar na promoção de um ambiente cada vez mais diverso e inclusivo”.

“Estamos trilhando um caminho de evolução quando falamos sobre diversidade étnica e racial na companhia hoje. Até o momento, 49% da população da Ambev é negra ou parda, sendo 30% fazendo parte da nossa liderança, mas, nossa preocupação central é justamente construir uma cervejaria cada vez mais diversa”, diz Rosi, ao celebrar o resultado.

O resultado colocado pela gestora foi um dos primeiros pontos observados pelo estagiário Marcos Madeira durante a seletiva. O jovem conta que durante a entrevista presencial, ao notar a diversidade posta no grupo avaliador, sentiu que poderia se sentir acolhido no ambiente.

Passos para o futuro

Perguntados sobre a possibilidade de haver novos processos destinados a pessoas negras, a Ambev informou que há planos de “ampliar a representatividade étnica em nosso quadro, por isso, estender a seleção ao Programa de Trainee não é algo distante, mas uma proposta que pode ser estudada em um futuro próximo”.

Desempenhando um papel na área de comunicação externa e interna, Marcos continua investindo como pode em sua preparação para novas possibilidades profissionais. “Dentre meus planos na companhia, o meu próximo passo é ser trainee, e ir para algum cargo de liderança”, projetou o funcionário.

Em avaliação final, a presidenta da Comissão de Igualdade Racial da OAB/PE indica esse caminho como rico para a corporação, e fomenta que atitudes como essas auxiliam na desestruturação do racismo nas empresas saindo do lugar de  subalternidade através da equidade.

Contudo, Manoela, ressalta que “precisamos de diversidade de todas as naturezas, sendo de raça, gênero, posicionamento político e filosóficos, religiosos, pois nós somos diversas e diversos”, enumera. Em resumo, a advogada reforça que essa convivência plural deve se dar de forma respeitosa como um todo.

O Ministério Público do Trabalho em São Paulo indeferiu uma série de denúncias recebidas contra o Magazine Luiza por suposta discriminação na decisão da empresa de selecionar apenas negros em seu próximo programa de trainees. Para o MPT, não houve violação trabalhista, mas sim uma ação afirmativa de reparação histórica.

Ao todo foram recebidas 11 denúncias em que a varejista é acusada de promover "prática de racismo", uma vez que, nas palavras de um dos denunciantes, "impede que pessoas que não tenham o tom de pele desejado pela empresa" participem do processo seletivo.

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Anunciada na última sexta-feira, 18, a iniciativa do Magalu teve larga repercussão nas redes sociais, despertando elogios e críticas - inclusive com acusações de "racismo reverso" e ameaças de representação contra a empresa no Ministério Público, o que se confirmou.

Para o MPT, a política da empresa é legítima e não existe ato ilícito no processo de seleção, já que a reserva de vagas à população negra é plenamente válida e configura ação afirmativa, além de "elemento de reparação histórica da exclusão da população negra do mercado de trabalho digno". Essa exclusão, segundo o Ministério Público, se traduz na falta de oportunidades de acesso ao emprego, na desigualdade de remuneração e na dificuldade de ascensão profissional, "quando comparado aos índices de acesso, remuneração e ascensão profissional da população branca".

Em 2017, uma pesquisa do Instituto Ethos com as 500 empresas de maior faturamento do Brasil alertou que os profissionais negros correspondiam a apenas 6,3% dos postos de gerências e 4,7% do quadro executivo. O estudo aponta que nas posições de liderança se refletem as desigualdades raciais que impedem a representatividade majoritária da população negra, configurando o racismo estrutural que inviabiliza a equidade no mercado de trabalho.

O MPT também ressaltou no indeferimento que ações afirmativas como a do Magazine Luiza possuem amparo na Constituição Federal, no Estatuto da Igualdade Racial (lei 12.288/2010) e na Convenção Internacional sobre a Eliminação de todas as Formas de Discriminação Racial, da qual o Brasil é signatário. Além disso, são objeto de atuação estratégica e prioritária do próprio MPT, por meio do Projeto Nacional de Inclusão Social de Jovens Negras e Negros no Mercado de Trabalho, consolidado em 2018 na Nota Técnica do Grupo de Trabalho de Raça.

"O que os empregadores não podem fazer é criar seleções em que haja reserva de vagas ou preferência a candidatos que não integram grupos historicamente vulneráveis", alerta a coordenadora nacional de Promoção da Igualdade de Oportunidades e Eliminação da Discriminação no Trabalho, procuradora Adriane Reis de Araujo. Em 2006, o Brasil já foi condenado pela Corte Interamericana de Direitos Humanos por um caso considerado "prática de discriminação odiosa".

Em um levantamento feito pelo 'Quero Bolsa', plataforma de vagas e bolsas de estudo de ensino superior, aponta que no estado de São Paulo, em 2019, apenas 3,68% dos contratados para cargos de liderança eram negros (pardos ou pretos). A pesquisa foi feita utilizando os dados do Cadastro Geral de Empregado e Desempregados (Cadeg).

Para isso, foram analisadas todas as contratações de ocupações de direção e gerência de pessoas com diploma de ensino superior, em 2019. De acordo com a pesquisa, ao todo, no Estado foram 58.083 admissões desse tipo. Dessas, 2.140 foram  de negros (3,68%) e 41.042 (70,66%) foram de profissionais brancos.

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Além disso, negros recebem menos que brancos nesses cargos. O salário médio de um profissional branco foi de R﹩ 8.692,41, isso significa 8% a mais que os R$  8.056,41 recebidos por profissionais negros. A pesquisa ainda aponta que comparando em gêneros, mulheres também estão menos inseridas nesses cargos que homens.

Foram 25.029 (43,09%) profissionais femininas, enquanto 33.054 homens foram contratados (56,91%). “Quando fazemos o recorte de raça, chegamos à conlusão de que homens negros representam apenas 2,24% dos cargos de liderança. Olhando para mulheres negras, esse percentual cai bem mais, chegando a 1,45%. No caso de homens brancos, a taxa representa 39,77%. Ou seja, homens brancos preencheram mais que 1675% cargos de liderança que homens negros e mais que 2642% a mais que mulheres negras”, informa o levantamento feito pelo Quero Bolsa.

No ano em que os movimentos por inclusão e diversidade ganharam importância inédita, o Magazine Luiza abriu as inscrições para seu programa de trainees de 2021 - e vai aceitar apenas candidatos negros. "O objetivo é trazer mais diversidade racial para os cargos de liderança da companhia, recrutando universitários e recém-formados de todo Brasil, no início da vida profissional", diz a empresa.

Atualmente, a varejista tem em seu quadro de funcionários 53% de pretos e pardos. Mas apenas 16% deles ocupam cargos de liderança. "O alerta despertado por essa baixa participação fez com que o Magalu decidisse atuar, oferecendo oportunidades para quem ainda está começando a carreira", reforça a companhia.

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Para a consultora e professora de MBA na área de Recursos Humanos, Jorgete Lemos, a iniciativa vem em um momento no qual as diferenças sociais e raciais ficaram escancaradas, tanto em razão da pandemia, quanto em virtude das manifestações antirracistas americanas. Movimentos como o Black Lives Matter voltaram com força em todo o mundo este ano, após o assassinato do americano George Floyd.

Segundo a especialista, além de estar sensível a uma preocupação que é global, a varejista deverá ter ganhos na ponta do lápis. "As empresas favorecem seu próprio negócio quando reduzem a desigualdade", garante Jorgete. Vários estudos acadêmicos comprovam os ganhos financeiros quando o quadro de empregados é mais diverso. Além disso, para ela, o desenvolvimento econômico do País só virá quando a população negra for incluída economicamente. "Estamos falando de cerca de 57% da população."

A professora da Escola de Direito da Fundação Getúlio Vargas (FGV) e pesquisadora em racismo e seus efeitos no mercado de trabalho, Alessandra Benedito, chama a atenção para o fato de que processos deste tipo ajudam o crescimento profissional dos jovens contratados.

Para ela, ações afirmativas são, por natureza, temporárias, com o sentido de reduzir desigualdades históricas. "Ações afirmativas não são permanentes. Devem existir enquanto existe o processo de exclusão."

Regras

As inscrições para o programa de trainee do Magalu tiveram início nessa sexta-feira (18) e podem participar profissionais formados entre dezembro de 2017 e dezembro 2020, em qualquer curso superior. O conhecimento em língua inglesa e experiência profissional anterior não fazem parte dos pré-requisitos para a seleção.

O processo seletivo será dividido em seis etapas. A seleção começará com testes online. Em seguida, os candidatos passarão pela etapa que consiste na gravação de um vídeo de apresentação profissional e por entrevistas com o departamento de recursos humanos.

Aqueles que seguirem no processo serão entrevistados por diretores de área e, depois, pela diretoria executiva. Os finalistas participarão de uma conversa com o presidente da empresa, Frederico Trajano.

O programa de trainees 2021 foi desenvolvido em parceria com as consultorias Indique Uma Preta e Goldenberg, Instituto Identidades do Brasil (ID_BR), Faculdade Zumbi dos Palmares e Comitê de Igualdade Racial do Mulheres do Brasil.

A empresa farmacêutica Bayer abriu vaga para seu programa de trainee 2021 voltado a profissionais negros, o “Liderança Negra Bayer”. Entre os requisitos, está a formatura em cursos de graduação ou pós-graduação entre dezembro de 2017 e dezembro de 2020, com possibilidade de avaliação de casos em que a formatura sofreu atrasos decorrentes da pandemia de Covid-19. 

Não foi informado onde os trainees serão lotados, mas a empresa, que tem sede na cidade de São Paulo, afirma que quem morar em uma cidade diferente da que sediar a vaga desejada, precisa ter disponibilidade para mudanças. O salário, também de acordo com a Bayer, é de R$ 6.900.

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As inscrições foram abertas nesta sexta-feira (18) e podem ser feitas através do site do programa de trainee, até o dia 21 de outubro. A seleção será composta por uma jornada on-line, dinâmica de grupo virtual, um encontro preparatório para a última etapa e pelo chamado “Bayer Day”, composto por uma roda de conversa com profissionais da empresa, painel de negócios e entrevista final. 

A admissão dos candidatos selecionados será realizada nos meses de dezembro de 2020 e janeiro de 2021. Entre os benefícios oferecidos pela empresa aos trainees, estão assistência médica e odontológica, transporte, restaurante no local de trabalho, seguro de vida, previdência privada, subsídio a medicamentos, academia, incentivos à qualidade de vida, Conte Comigo (assistência psicológica, consultoria jurídica e financeira) e CoopBayer (Cooperativa que tem como objetivo a educação financeira dos colaboradores). 

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No dia 18 deste mês, às 20h30, será realizado o “Seminário Malunguinho: 185 anos vivo na alma de um povo”. Gratuito, o evento celebra a figura de um herói “negríndio”, morto há 185 anos nas terras da antiga região Maricota, hoje a cidade de Abreu e Lima, na Região Metropolitana do Recife. Líder do Quilombo do Catucá, João Batista, conhecido como Malunguinho, é considerado um personagem heroico para os povos negro e indígena de Pernambuco, bem como foi imortalizado como divindade na Jurema Sagrada.

O seminário será on-line, por meio do YouTube, e contará com a participação do professor de história Marcus Carvalho, da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE). Um dos objetivos do evento é congregar os saberes acadêmicos acerca dos quilombos e das resistências negras e indígenas, além de abordar a tradição oral, a discussão sobre direitos humanos, racismo religioso, meio ambiente e saberes tradicionais do povo de terreiro.

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“O seminário Malunguinho: 185 anos vivo na alma de um povo acontece de cinco em cinco anos e tem uma relevância gigantesca para demarcar a importância de Malunguinho como um dos últimos líderes negro quilombolas na luta pela liberdade do povo negríndio do Brasil. Sendo ele também o único líder quilombola, ou os únicos líderes quilombolas a virarem divindade em uma religião no Brasil, para demonstrar a sociedade que é possível combater o racismo, que é possível resistir contra todo um processo da abolição da escravatura não conclusa, usando exemplos de vitórias, exemplos de sucesso como Malunguinho, porque tudo o que nós temos hoje em Pernambuco como cultura popular, religiosidade afroindígena nos terreiros, são resquícios do quilombo do Catucá e da luta desses grandes personagens históricos”, destaca Alexandre L’Omi L’Odò, organizador do evento, mestre em ciências da religião e sacerdote da Jurema Sagrada.

De acordo com Alexandre, o seminário também traz a figura de Malunguinho como um exemplo de resistência. “Vivo na alma de um povo, porque o povo da Jurema preservou Malunguinho vivo na sua religião e isso é um tesouro de tamanho imensurável, é um patrimônio imaterial do nosso povo que tem que ser valorizado pelo Estado Brasileiro, porque Malunguinho é um exemplo vivo da superação do negro, além da superação da vida sobre a morte e, sobretudo, da superação do racismo, porque ele, até hoje, como líder quilombola, cuida do seu povo nos terreiros pobres de Jurema, nos recônditos espaços das favelas, Malunguinho está lá aconselhando, dando caminho, ajudando aqueles e aquelas que precisam de cura nos seus diversos âmbitos e a gente tem o maior orgulho de fazer esse seminário de cinco em 5 anos”, explica o mestre em ciências da religião.

Os interessados em participar da ação devem se inscrever pelo WhatsApp (81) 99738-2278, enviando nome completo, RG, e-mail e telefone. Será dado certificado a quem participar, efetivamente, da live, postando comentários do início ao fim da transmissão.

O ministro Ricardo Lewandowski, do Supremo Tribunal Federal (STF), determinou que a reserva de recursos para candidatos negros já seja válida para as eleições de 2020. O entendimento do ministro altera a decisão do plenário do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), que no mês passado determinou a aplicação das novas regras somente a partir das eleições de 2022.

Lewandowski submeteu a liminar para referendo do plenário. Ainda não há previsão de quando o tema vai ser discutido pelos 11 ministros do STF, mas a determinação do ministro vai obrigar as legendas a já fazerem ajustes na definição dos recursos públicos destinados para o financiamento das campanhas de vereadores e prefeitos neste ano - o valor do Fundo Eleitoral é de R$ 2 bilhões para este ano.

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"Para mim, não há nenhuma dúvida de que políticas públicas tendentes a incentivar a apresentação de candidaturas de pessoas negras aos cargos eletivos, nas disputas eleitorais que se travam em nosso País, prestam homenagem aos valores constitucionais da cidadania e da dignidade humana, bem como à exortação, abrigada no preâmbulo do texto magno, de construirmos, todos, uma sociedade fraterna, pluralista e sem preconceitos, fundada na harmonia social, livre de quaisquer formas de discriminação", observou Lewandowski em sua decisão.

"O incentivo proposto pelo TSE, ademais, não implica qualquer alteração das 'regras do jogo' em vigor. Na verdade, a Corte Eleitoral somente determinou que os partidos políticos procedam a uma distribuição mais igualitária e equitativa dos recursos públicos que lhe são endereçados, quer dizer, das verbas resultantes do pagamento de tributos por todos os brasileiros indistintamente. E, é escusado dizer, que, em se tratando de verbas públicas, cumpre às agremiações partidárias

alocá-las rigorosamente em conformidade com os ditames constitucionais, legais e regulamentares pertinentes", concluiu Lewandowski.

A decisão de Lewandowski atende a um pedido do PSOL, que acionou o Supremo após a decisão do plenário do TSE. Para o partido, diante de uma situação em que se verifica manifesta "violação a princípios e direitos constitucionalmente previstos, é plenamente possível admitir que os incentivos às candidaturas de pessoas negras, nos termos delimitados pelo TSE, sejam aplicados desde já".

Na época do julgamento do TSE, cerca de 1/3 dos partidos já havia informado ao tribunal os critérios de divisão do fundo eleitoral - esse foi um dos motivos para que o novo entendimento fosse aplicado apenas a partir de 2022. Um integrante do TSE ouvido reservadamente pela reportagem considerou a decisão de Lewandowski "um golpe".

No mês passado, o TSE decidiu que o dinheiro do fundo eleitoral e o tempo de propaganda no rádio e TV sejam divididos na mesma proporção de candidatos negros e brancos de cada partido.

A discussão, iniciada em junho, avaliou uma consulta apresentada ao TSE pela deputada Benedita da Silva (PT-RJ). A parlamentar pediu ao tribunal para estabelecer uma cota de 30% de candidaturas negras em cada partido - numa analogia ao mesmo porcentual reservado às candidaturas femininas. Atualmente, os partidos não são obrigados a lançar um número mínimo de candidatos negros e negras.

Os ministros do TSE, no entanto, acolheram outro pedido da parlamentar, de que o dinheiro do fundo eleitoral e o tempo de rádio e TV sejam divididos na mesma proporção de candidatos negros e brancos em cada sigla. O entendimento da Corte Eleitoral, no entanto, foi o de que as novas regras somente seriam aplicadas nas eleições de 2022.

"De resto, a obrigação dos partidos políticos de tratar igualmente, ou melhor, equitativamente os candidatos decorre da incontornável obrigação que têm de resguardar o regime democrático e os direitos fundamentais (art. 16, caput, da CF) e do inarredável dever de dar concreção aos objetivos fundamentais da República, dentre os quais se destaca o de 'promover o bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade", destacou Lewandowski.

Como o Estadão antecipou, dirigentes de partidos de diferentes matizes ideológicas resistem à iniciativa da Justiça Eleitoral. Mesmo os que concordam com a tese de Benedita, agora parcialmente encampada pelos ministros do TSE, argumentam que seria necessário o Congresso Nacional se manifestar, pois o assunto deveria ser tratado por meio de lei.

Desigualdade. Na atual legislatura, as mulheres negras representam apenas 2,5% do total de eleitos na Câmara dos Deputados, enquanto as mulheres brancas são 12,28%, os homens negros 22,02% e os homens brancos 62,57%, segundo o estudo "Democracia e representação nas eleições de 2018". O levantamento apontou que 26% das candidaturas a deputado federal eram de homens negros, mas esse grupo recebeu apenas 16,6% do total dos recursos

Segundo o Estudo Desigualdades Sociais por Cor ou Raça, do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), divulgado no ano passado, enquanto 9,7% das candidaturas de pessoas brancas a deputado federal tiveram receita igual ou superior a R$ 1 milhão, entre pretos ou pardos, 2,7% receberam pelo menos esse valor.

A discussão sobre representação racial nas eleições de Salvador ganhou força em 2020, após entidades do movimento negro criarem campanhas para incentivar candidaturas de afrodescendentes aos poderes Executivo e Legislativo, por meio de núcleos como Eu Quero Ela - Salvador Cidade Negra e Plataforma Salvador Negra 2020. Embora a capital baiana tenha 79,2% de sua população afrodescendente (dados do IBGE), os soteropolitanos nunca elegeram um prefeito negro pelo voto popular. O único a sentar na cadeira do Palácio Thomé de Souza foi o hoje vereador Edvaldo Brito (PSD) - que entre 1978 e 1979 foi prefeito biônico, durante a ditadura militar.

Neste ano são cinco pré-candidaturas de afrodescendentes à prefeitura, quatro delas associadas a movimentos de representação negra: Denice Santiago (PT), Olívia Santana (PCdoB), Eslane Paixão (UP) e Hilton Coelho (PSOL). Em 2016, foram duas candidaturas autodeclaradas pretas.

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Denice é aposta do PT para conquistar pela primeira vez a prefeitura de Salvador: ela é major da Polícia Militar da Bahia e foi responsável pelas rondas Maria da Penha. O quinto pré-candidato é também militar: o deputado federal Pastor Sargento Isidório (Avante), que não tem militância ligada ao movimento negro.

Representatividade

A estimativa de parte de entidades do movimento negro é a de que o número de candidaturas de afrodescendentes à Câmara Municipal cresça de 15% a 20% nesta eleição. Hoje, considerando somente a cor da pele, são pelo menos 13 vereadores e vereadoras negros no Legislativo municipal. O número equivale a 30% das 43 cadeiras da Casa.

"Nós queremos um representante que tenha a cara da cidade, que é negra. E, na Câmara, também precisamos de quem pense a cidade para os negros", disse Iraildes Andrade, coordenadora-geral do Coletivo de Entidades Negras (CEN). Ela avalia que a articulação das entidades do movimento negro para eleições tende a crescer nos próximos anos. "Os debates encorajaram mais pretos e pretas a se candidatarem", disse.

Apesar da diversidade entre as entidades do movimento negro, um ponto comum é o de que a composição dos poderes Executivo e Legislativo refletem o racismo estrutural da sociedade soteropolitana. "A representação é um debate prioritário", defende Sirlene Assis, que integra a direção nacional da União de Negros pela Igualdade (Unegro). "Independentemente de partidos, nós queremos o poder para o povo negro, que é maioria da cidade. Só que eu não acredito que os não-negros vão fazer o melhor para nós, pois estão há séculos dirigindo a cidade e isso não ocorreu." 

O Tribunal Superior Eleitoral (TSE) decidiu, na última terça-feira, que o dinheiro público usado para financiar as campanhas políticas deve ser dividido de forma proporcional entre candidatos negros e brancos a partir de 2022. Na maior parte dos partidos, negros ainda são minoria nas executivas nacionais (cargos de direção), responsáveis por definir, por exemplo, quem será candidato e como a verba do fundo eleitoral será distribuída.

Em 17 dos 24 partidos com representação no Congresso, a participação de quem se autodeclara negro ou pardo nas cúpulas partidárias vai de zero a 41%, segundo levantamento feito pelo Estadão. Para chegar ao resultado, a reportagem cruzou informações prestadas ao TSE por dirigentes que já foram candidatos em alguma eleição com dados enviados pelas próprias siglas e entrevistas com dirigentes partidários.

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A baixa representatividade de negros em cargos de decisão não é exclusividade dos partidos políticos. A participação de pretos ou pardos em cargos gerenciais de empresas é de 29,9%, de acordo com a pesquisa "Desigualdades Sociais por Cor ou Raça no Brasil", divulgada no ano passado pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). O número também é baixo na academia. Na Universidade de São Paulo (USP), 2,2% dos professores se autodeclaram negros, segundo dados de 2018 da universidade. No Brasil, 55,8% da população brasileira é negra, também segundo o IBGE.

Estrutural

"Temos um racismo estrutural e sistêmico. Os partidos políticos não estão de fora disso", disse Gabriela Cruz, presidente nacional do Tucanafro, secretariado da militância negra do PSDB. Ela diz que seu partido apoia a militância negra, mas reconhece que a legenda ainda "precisa avançar". No PSDB, 11% dos 46 integrantes da Executiva Nacional se declaram pretos ou pardos.

Gabriela comemorou a decisão do TSE de terça-feira passada, que definiu recursos proporcionais para candidaturas negras e brancas a partir de 2022. Ela avalia que a medida pode provocar mudanças na própria esfera partidária. "Com mais negros no Parlamento, você tem mais negros nas executivas, que são formadas em sua maioria por parlamentares", afirmou.

Nas eleições de 2018, 24,4% dos deputados federais e 28,9% dos deputados estaduais eleitos se declararam negros ou pardos, segundo o IBGE. Na última terça-feira, ao julgar consulta feita pela deputada federal Benedita da Silva (PT-RJ), seis dos sete ministros do TSE decidiram que a divisão do fundo eleitoral - principal fonte de dinheiro das campanhas - e do tempo de propaganda no rádio e na TV deve ser proporcional ao número de candidatos negros que cada partido apresentar.

Secretária nacional da Negritude Socialista do Brasil (NSB) do PSB, Valneide Nascimento vê a medida tomada pelo TSE como um "avanço tardio", mas também acredita que a decisão simbolize uma grande oportunidade. Ela faz parte dos 20% dos membros da executiva nacional do PSB que se autodeclaram negros. "Não se trata de ‘roubar o lugar’ dos brancos, mas de apenas participar como eles participam das decisões de poder, passando pela distribuição do fundo", disse Valneide.

Para o secretário nacional de combate ao racismo do PT, Martvs Chagas, o caso não precisaria ter chegado à Justiça se os partidos tivessem mais representatividade. "Como não temos pessoas negras nas cúpulas dos partidos para pressionar que isso aconteça, o TSE teve que tomar uma decisão."

Dados

Segundo o levantamento do Estadão, a legenda com menor participação de negros na Executiva Nacional é o Novo. Nenhum dos seis dirigentes se declara como preto ou pardo. PSD e PTB tiveram índices abaixo de 10%. Já PDT, PSOL e Solidariedade têm mais de 35% das suas Executivas formadas por negros. Sete das 24 siglas com representação no Congresso não forneceram dados: PL, Avante, PSL, Republicanos, Podemos, PSC e Cidadania.

"O levantamento comprova que os partidos não têm mecanismos que promovam a diversidade e a representatividade", disse o conselheiro federal da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) André Costa, advogado especializado em direito político e eleitoral. "É importante que os partidos tenham suas comissões de igualdade. Mas, mais do que em unidades isoladas, é importante que elas também estejam nas direções partidárias."

Professor de Sociologia no Instituto de Estudos Sociais e Políticos da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ) e coordenador do Grupo de Estudos Multidisciplinares da Ação Afirmativa (GEMAA), Luiz Augusto Campos segue o mesmo entendimento. "As Executivas nacionais são os órgãos partidários responsáveis pela última palavra no registro de candidaturas e distribuição de recursos de campanha. Sem diversificá-las, os avanços nesses quesitos esbarrarão sempre na hierarquia partidária." 

Um vídeo que circula nas redes sociais mostra um homem, que não foi identificado, levando um soco no rosto e desmaiando depois de cometer racismo com um grupo de jovens negros que estavam no metrô em Londres, neste último domingo (16). 

O racista aparece desacompanhado no vídeo, discutindo com uma mulher que está ao seu lado e grita a palavra "violência". Em seguida, ele provoca o grupo de jovens negros dizendo palavras racistas como "menos que nós" e "animais de estimação". "Essa é a minha casa. Todos vocês sabem disso", diz. 

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Uma mulher, que filma a atitude do homem, o questiona e ele manda ela calar a boca e a chama de "puta". Quando o metrô para, antes de deixar o vagão, um dos jovens dá um soco no racista, que cai no chão desmaiado.

Uma mulher se aproxima do homem desmaiado para conferir o seu pulso, outros passageiros se aglomeram para ver a situação do homem, que segue desacordado. 

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Está em análise na Câmara dos Deputados um projeto de lei que prevê que os partidos políticos reservem cotas mínimas para candidaturas de afro-brasileiros nas eleições para o Poder Legislativo, incluindo os pleitos para a Câmara dos Deputados, a Câmara Legislativa, as Assembleias Legislativas e as Câmaras Municipais.

Pelo texto, o número de candidaturas de autodeclarados negros será igual ou equivalente à proporção de pretos e pardos na população da unidade da Federação, segundo o último censo do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).

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Além disso, o texto assegura recursos do Fundo Especial de Financiamento de Campanha (conhecido como Fundo Eleitoral), do Fundo Partidário e do tempo de propaganda eleitoral gratuita na rádio e na TV para as candidaturas de mulheres negras - conceito que inclui pretas e pardas.

“Existe ainda no Brasil uma sub-representatividade de pessoas negras em poderes eleitos, o que não condiz com a realidade brasileira, em que mais de 50% da população se autodeclara negra”, destaca a deputada Benedita da Silva (PT-RJ), autora da proposta, assinada também por outros 33 deputados do PT.

Dos 513 deputados federais eleitos em 2018, 104 se reconhecem como pardos (20,27%) e 21 se declaram pretos (4,09%), totalizando 24,36% de deputados negros.

Candidaturas femininas

O projeto insere na Lei Eleitoral a garantia de reserva para as candidaturas femininas de pelo menos 30% do Fundo Especial de Financiamento de Campanha alocado a cada partido e de pelo menos 30% do tempo de propagada eleitoral gratuita no rádio e na TV. Hoje essa reserva é garantida por decisão do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) de 2018, mas não consta na legislação.

O texto prevê, adicionalmente, que esses recursos e o tempo de propaganda eleitoral serão distribuídos na proporção de 50% para candidaturas de mulheres brancas e 50% para mulheres pretas e pardas.

Além disso, altera a Lei dos Partidos para também estabelecer a reserva para as candidaturas femininas de 30% de recursos da parcela do Fundo Partidário destinada às campanhas políticas, sendo 50% também garantido para mulheres pretas e pardas.

TSE

Está em análise atualmente no TSE consulta apresentada pela deputada Benedita da Silva sobre a possibilidade de instituição de cota para candidatos negros nas eleições; e de reserva de recursos do Fundo Eleitoral e do tempo de propaganda eleitoral para candidaturas negras.

O relator do caso e presidente do TSE, ministro Luís Roberto Barroso, rejeitou a cota de candidaturas negras, argumentando que a iniciativa depende de lei a ser aprovada pelo Congresso, mas se mostrou favorável à divisão da "fatia feminina" do Fundo Eleitoral e do tempo de rádio e TV entre candidatas negras e brancas na exata proporção das candidaturas apresentadas por cada partido. O mesmo critério deverá ser adotado para homens negros e brancos, caso o voto seja acatado pelo TSE.

O ministro Alexandre Moraes pediu vista da matéria, e por isso a votação da consulta ainda não foi finalizada pelo tribunal.

*Da Agência Câmara de Notícias

Promover maior inserção de pessoas negras em cursos de mestrado e doutorado. Essa é a proposta das oficinas on-line e gratuitas que serão promovias por uma iniciativa formada por professores de várias instituições de ensino, incluindo a Universidade Federal de Pernambuco (UFPE). Intitulada ‘Alafia’, a ação se configura em um preparatório para a construção de conhecimentos científicos necessários às pessoas que almejam ingressar em pós-graduações.

A ideia é que os candidatos negros possam concorrer e ingressar em mestrados e doutorados de qualquer instituição de ensino, independente do curso e linha de pesquisa. Segundo a UFPE, o projeto teve como base a conclusão da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad) de 2018: o levantamento indicou que pouco menos de 30% dos alunos mestrandos e doutorandos são negros.

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A professora Maria Auxiliadora Martins, uma das docentes responsáveis pela ‘Alafia’, destacou que a inserção de negros nas pós-graduação fortalece a inclusão no âmbito da academia. “Sem cursos de mestrado e doutorado, negros/as também ficam impossibilitados/as de prestar concurso público para o Ensino Superior, sendo, apenas, 1% da população do magistério superior público, tornando urgente e necessário, propor, defender e realizar ações políticas de inclusão que possam garantir crescimento acadêmico racialmente equitativo”, disse a educadora, conforme informações da assessoria de imprensa da UFPE.

Ao LeiaJá, a professora informou que as aulas serão iniciadas no dia 17 de agosto, às 19h, por meio da plataforma Google Classroom. As demais datas serão construídas de maneira coletiva entre os participantes das oficinas.

Os interessados podem se inscrever pela internet até 31 de julho, sem taxa de participação; o único critério é que eles tenham graduação em qualquer área. Outras informações sobre as oficinas podem ser obtidas pelo e-mail alafia2020@gmail.com.

Kemla Baptista é idealizadora da iniciativa 'Caçando Estórias'. Foto: Raphael de Faria

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Ao longo da história, os saberes ancestrais da população negra, que tradicionalmente são passados de forma oral, vem ganhando novas formas de registros por meio da literatura e também nas plataformas de interações sociais na internet. Educadoras e escritoras negras de Pernambuco movimentam esses acessos, promovendo educação antirracista no cotidiano da sociedade, em especial no das crianças, adolescentes e adultos afro-brasileiros. Neste sábado (25), Dia Internacional da Mulher Negra Latino Americana e Caribenha, o LeiaJá compartilha ações de educadoras que fazem a diferença entre alunos e famílias.

A caçadora de estórias 

“Eu não construí um modelo pedagógico! Eu me valho de referências pedagógicas relevantes. Com isso, a gente pensa o construtivismo, na pedagogia de Freinet; a gente pensa em educação popular, considerando aquela referência de movimento de Paulo Freire; pensamos em tantas outras referências importantes, mas nós temos que considerar que todas elas foram criadas, pensadas e experimentadas por pessoas brancas”. É a partir da fala concedida pela educadora e contadora de estórias Kemla Baptista que exploramos outras possibilidades de entender a educação e seus processos diversos que, além de ensinar o básico, tem a pretensão de conduzir “crianças ao patamar de desbravadora do universo das tradições afro-brasileiras e agente criadora de arte”.

Kemla é a idealizadora e realizadora da proposta de educação social 'Caçando Estórias', que há 12 anos compartilha saberes ancestrais por meio de ações multidisciplinares que envolvem contação de estórias, literatura, audiovisual, criação de conteúdo para a internet, teatro de objetos, música e dança sempre atravessada pelas africanidades. Para ela, “ouvir estórias é alimento para a alma e faz bem à pessoa de qualquer idade”.

Em entrevista ao LeiaJá, a psicoterapeuta com abordagem psicanalítica, Maria de Jesus Moura, analisa que é necessário que as crianças possam se ver representadas em diversos espaços e, através desse reconhecimento, fortalecer a autoestima não só de crianças negras, como também de adolescentes e adultos. “Uma atividade de contação de estórias pode ser extremamente importante, pois dá acesso às crianças a determinadas realidades positivas, saudáveis, de força, de elevação de autoestima”, enfatiza a psicoterapeuta, que também é mestra em psicologia social com estudos no campo racial e de gêneros.

Seguindo essa lógica, o Caçando Estórias, que iniciou sua trajetória nas periferias do Rio de Janeiro, dissemina em Recife a mesma dinâmica educacional. Assim como no Rio, Kemla dá seguimento às atividades - antes presenciais e agora virtual - como um processo que interrompe uma movimentação de pessoas não negras fazendo apropriação de símbolos pertencentes à diáspora negra para repassar os conhecimentos, sem a devida propriedade desses saberes.

I Caçando Estórias, que tem a oralidade como principal ferramenta de comunicação, teve início dentro dos terreiros de candomblé. Kemla afirma que há necessidade de ampliar a popularização do conhecimento ancestral, em outros espaços, sendo eles formais ou não. Nesse sentido, ela enfatiza que “prefere usar como referências quem vive e quem pertence” aos lugares de axé - nomenclatura dada às pessoas que fazem parte do candomblé - para traduzir as histórias contadas por ela. Essa atividade está ligada à educação antirracista, que vem criando espaços para promover debates e demandas de ensino acerca das filosofias e artistas que fazem parte da negritude.

Devido à necessidade de transmitir os valores e ensinamentos assimilados no terreiro, somada a algumas técnicas adquirida na academia, Kemla tornou-se voz para mediar rodas de diálogo e de contos tradicionais africanos em uma versão lúdica, pensados para facilitar a compreensão. Em 2017, motivada principalmente pela chegada da sua filha, Kemla passa a promover o seu trabalho no ambiente virtual, além das ações presenciais. Dessa forma, a iniciativa ficou mais próxima de crianças e adultos, negros e não negros, por meio de uma forma de educar que não está ligada ao capitalismo e nem ao neoliberalismo, segundo Kemla.

Foto: Raphael Faria

“São outras possibilidades de pensar um mundo de outra forma. E vai para a internet com essa bagagem de axé, para dar esse nova perspectiva de educação que quebra com a lógica dos pensamentos e ensinamentos eurocêntricos”, destaca Kemla.

Antes da pandemia, esse trabalho era feito em comunidades periféricas da capital de Pernambuco, como no Alto do Páscoal, localizado na Zona Norte de Recife. Além do Caçando Estórias, Kemla coordena outras três ações afirmativas, intituladas 'Nos Terreiros do Brasil' - contação de histórias, espetáculos e oficinas com base em técnicas de arteterapia para crianças -; 'Balaio de Leituras' - ação de mediação de leitura nas escolas públicas, particulares, bibliotecas e museus que trazem personagens negros em papéis socialmente valorizados -; e o 'Aguerézinho - evento anual que festeja os contos, tradições e vivências afro-brasileiras -.

Agora, durante o isolamento social em razão da pandemia do novo coronavírus, as atividades presenciais promovidas pela Kemla foram adaptadas para a produção de novos conteúdos nas redes sociais, com agenda de lives, por exemplo. Nos encontros virtuais, são realizadas contações de estórias e outras ações adaptadas para a plataforma, incluindo o incentivo para que as crianças e seus responsáveis pratiquem as recomendações de prevenção ao contágio do coronavírus, como lavar as mãos e usar máscara.

Com as novas rotinas na web, também surgiram novas reflexões quanto ao papel social que o Caçando Estórias tem desempenhado para com a população mais vulnerável. Diante desse dilema, outras ações foram realizadas por Kemla, como a arrecadação e entrega de cestas básicas e a produção de livro 'O Vovô Treloso Mais Treloso do Mundo', de forma gratuita e on-line para crianças periféricas. O conto infantil fala das vivências de seu avô Gentil.

Feito de forma autônoma, o projeto do livro foi abraçado pela marca de biscoito 'Treloso', da empresa Vitarella, que financia a confecção de mil exemplares. O lançamento será neste domingo (26), pelo perfil Caçando Estórias no Instagram.

Todas as produções de viés educativo e cultural de autoria da pernambucana deixam marcas positivas por onde passa, chegando a impactar mais de 25 mil pessoas, seja no recebimento dos saberes traduzidos em palavras ou pela entrega de cestas básicas, que servem de alento às famílias em situação de vulnerabilidade social.

Cores - Segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), os negros (pretos e pardos) representam 56% da população brasileira. Em Pernambuco, estima-se uma população de 9.557.071 pessoas, em que dessas, 60,4% são autodeclaradas pardas e 7,2% se dizem pretas. Os dados são de 2019. 

Das escrevivências 

Por meio das poesias, escritoras negras possibilitam que vivências e conhecimentos em comum na população possam ser documentados em linhas que aqui chamarei de ‘escrevivências’. Vinda de uma família humilde, a educadora e escritora Odailta Alves, que nasceu e foi criada na favela de Santo Amaro, no Recife, foi a primeira - entre os nove irmãos - a aprender a ler. Hoje, em razão da projeção a nível nacional do seu trabalho literário, Odailta lança virtualmente um novo livro chamado 'Pretos Prazeres'.

Odailta Alves é autora de cinco livros. Foto: Mayara Barbosa

A publicação conta com 75% das vendas totais pela internet. “Os livros ganharam voo e isso é também um processo de reconhecimento de trabalho que a gente vem fazendo há um tempo. Meu eu lírico é o lírico homem preto e mulher preta, principalmente mulher preta. Então, eu acho que as pessoas negras se veem representadas nessa literatura, porque a literatura sempre foi um espaço muito brancocentrado, um espaço de idealização da mulher branca e hipersexualização da mulher preta ou em lugar de serviços braçais”, enfatiza Odailta Alves, em entrevista ao LeiaJá.

A escritora também atua na Unidade de Educação para as Relações Étnicos-Raciais (Unera), que é gerenciada pela Gerência de Políticas Educacionais, Educação Inclusiva, Direitos Humanos e Cidadania (GEIDH), da Secretaria de Educação e Esportes do Estado de Pernambuco (SEE-PE). Em suas atribuições, estão as elaborações de estratégias que efetivam a aplicabilidade da Lei 10.639/2003, que trata inclusão no currículo oficial da rede de ensino a obrigatoriedade do ensino da história, da cultura, da luta afro-brasileira, além da contribuição do negro na formação da sociedade nacional; bem como da Lei 11.645/2008, que inclui no currículo oficial da rede de ensino a obrigatoriedade da temática “História e cultura afro-brasileira e indígena”.

É por meio da literatura que Odailta traz a idealização da mulher negra em espaço de afetividade, retratando-a como uma mulher de força, poder e de luta, mas não a imposta pela sociedade e sim uma força que emana das raízes fincadas de um povo que historicamente é colocado à margem. Mesmo com grande público negro, a escritora explica que há pessoas brancas que consomem as suas produções. “[Pessoas não negras] que tentem ler essa pessoa negra pelo seu lugar de fala e não pela voz do colonizador como tem sido historicamente e, nesse sentido, acaba sendo sim uma literatura que ajuda a promover uma educação antirracista. Porque vai quebrar com o imaginário racista, vai denunciar um processo histórico de escravidão que não encerrou em 1988, e vai denunciar as nuances do racismo que vai se reinventando; precisamos criar estratégias com relação a esse racismo”, enfatiza.

Odailta comemora os livros lançados. Foto: Priscilla Buhr

Até então, a escritora conta com cinco livros publicados, sendo o primeiro de nome 'Clamor Negro', em 2016, seguidos de Escrevivências' e 'Cativeiro de Versos', em 2018; 'Letras Pretas, em 2019; e 'Pretos Prazeres', lançado em 2020. O 'Escrevivências' está na segunda edição pela editora independente chamada Castanha Mecânica. 

“É muito bom ver esse quantitativo de livros saindo, sabe? Sem vínculos à editora nenhuma”, comemora. Enquanto produtora de arte, a escritora pernambucana diz que recebe feedbacks positivos sobre suas produções. Indo de uma geração à outra, Odailta inspira outras mulheres pretos por todo país, sendo escritoras ou não.

Educadoras explicam que, quando há espelhos, é possível construir novas narrativas para educar. Mesmo com esse fato apontado, a psicoterapeuta Maria Jesus Moura fala que em diversos setores ainda é possível identificar o racismo como estruturador de abordagens. Ela avalia que todo esse contexto de escravização e invisibilização histórica, “incidem naturalmente na saúde mental da população negra, mais ou menos, com ou sem resposta patológica, algumas ansiedades e depressões são bem frequentes”.

Na percepção da psicoterapeuta, em primeiro momento, é necessária uma admissão do racismo na esfera educacional. “A instituição educacional é atravessada por um conjunto de invisibilidades das populações negra e indígenas. Isso acontece fortemente quando não se vê representações delas em outros lugares, a não ser em outras crianças que pertencem ao ambiente escolar”, aponta. Contudo, diante de todas as dificuldades, como a falta ou pouca internet, poucos recursos financeiros, e mesmo com os novos obstáculos impostos pela pandemia da Covid-19, educadoras negras buscam caminhos para oferecer educação.

Por fim, basta olhar ao redor, que percebemos que as palavras verbalizadas ou redigidas por mulheres negras, como Kemla Baptista e Odailta Alves, servem de referências para diversos poetas e produtores de arte, dentro e fora do Estado. É importante ressaltar que os esforços para manter a educação antirracista fluida, estendem-se aos espaços educacionais formais, por meio de atividades similares aos trazidos nesta reportagem do LeiaJá. Essas atividades alcançam os pequenos e suas famílias.

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Mesmo sendo maioria da população brasileira, negros representaram apenas 24% dos deputados federais escolhidos pelo voto popular em 2018. Uma consulta em análise pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE) pode mudar esse cenário, com a discussão sobre a reserva de recursos do Fundo Eleitoral - e de tempo de rádio e TV - para viabilizar as campanhas de candidatos negros e negras. A verba pública, que nas eleições municipais deste ano soma R$ 2 bilhões, seria dividida segundo o critério racial, obedecendo a proporção de candidatos negros e brancos de cada partido.

O objetivo é usar o dinheiro do fundo para corrigir distorções históricas e evitar que os partidos favoreçam políticos brancos. Segundo um estudo da FGV Direito São Paulo, homens brancos representaram 43,1% de todos os candidatos a deputado federal nas eleições de 2018, mas concentraram cerca de 60% das receitas de campanha. Por outro lado, as mulheres negras - que somaram 12,9% das candidaturas à Câmara - ficaram com apenas 6,7% do volume total de recursos. Elas sofrem dupla discriminação: recebem menos recursos que os homens por serem mulheres, e menos que as mulheres brancas.

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"A sociedade brasileira é racista, e a estrutura partidária reproduz o racismo. O interior dos partidos não é necessariamente democrático, e quem está nas mesas diretoras, no comando das decisões, são homens brancos", observou o cientista político Cristiano Rodrigues, da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG).

Rodrigues aponta que, na distribuição dos recursos, as siglas tendem a privilegiar os candidatos que mobilizam mais dinheiro (como empresários) e aqueles que são provenientes de famílias com forte tradição política. "A população negra está mais ausente desses espaços."

Cota

No caso das mulheres, a legislação eleitoral prevê uma cota mínima de 30% de candidaturas femininas nas eleições para os cargos de deputados federais, estaduais e vereadores. No entanto, não há nenhum dispositivo legal que obriga os partidos a lançarem um número mínimo de candidatos negros. Ao entrar com a consulta no TSE, a deputada federal Benedita da Silva (PT-RJ) pediu que o tribunal estabelecesse uma cota de 30% de candidaturas negras para cada agremiação. A medida foi rejeitada pelo relator do caso e presidente do TSE, ministro Luís Roberto Barroso, para quem uma iniciativa nesse sentido depende de lei a ser aprovada pelo Congresso.

O ministro, no entanto, acolheu outros pedidos da consulta. Barroso quer que a "fatia feminina" do Fundo Eleitoral e do tempo de rádio e TV sejam divididos entre candidatas negras e brancas na exata proporção das candidaturas apresentadas por cada partido. O mesmo critério deve ser adotado para homens negros e brancos.

"A ordem constitucional não apenas rejeita todas as formas de preconceito e discriminação, mas também impõe ao Estado o dever de atuar positivamente no combate a esse tipo de desvio e na redução das desigualdades de fato. Há um dever de integração dos negros em espaços de poder, noção que é potencializada no caso dos parlamentos. É que a representação de todos os diferentes grupos sociais no parlamento é essencial para o adequado funcionamento da democracia", disse Barroso. O ministro Edson Fachin acompanhou o entendimento do colega.

O julgamento, iniciado na última terça-feira, foi interrompido por um pedido de vista (mais tempo para análise) do ministro Alexandre de Moraes. Moraes concordou com o entendimento dos colegas sobre o problema do racismo no País, mas alertou para os riscos de a reserva de recursos e de propaganda eleitoral para candidatos negros gerar um efeito contrário: a retaliação desses candidatos pelos próprios partidos.

"Por não existir um mínimo legal de candidaturas, seja de mulheres negras, seja de homens negros, em tese, haveria a possibilidade de retaliação partidária, de não se admitir mais candidaturas. A minha análise é para verificar um mecanismo para impedir isso (a retaliação)", comentou Moraes.

Como a discussão está suspensa por tempo indeterminado, não é possível saber se o entendimento a ser firmado já valerá para as eleições de novembro. Na atual legislatura, as mulheres negras representam apenas 2,5% do total de eleitos na Câmara dos Deputados, enquanto as mulheres brancas são 12,28%, os homens negros 22,02% e os homens brancos 62,57%, segundo o estudo "Democracia e representação nas eleições de 2018". O levantamento apontou que 26% das candidaturas a deputado federal eram de homens negros, mas esse grupo recebeu apenas 16,6% do total dos recursos.

"É mais do que oportuna (a consulta). Se efetivamente quisermos criar políticas públicas e legislação para fomentar comportamentos antirracistas, precisamos de representantes negros no Congresso", disse a professora Luciana Ramos, uma das coordenadoras do estudo.

Autora da consulta ao TSE, Benedita opina que a discussão não é sobre privilégios. "Queremos que o Parlamento espelhe a representação da sociedade", disse. Contrária ao uso de dinheiro público por partidos, a deputada Adriana Ventura (Novo-SP), ressalta que "não adianta garantir vagas por gênero ou raça se o Fundo Eleitoral é gerido por critérios dos partidos, normalmente obscuros e injustos". As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.

O Clube Náutico Capibaribe resolveu disponibilizar algumas de suas mídias para ajudar vítimas de violência doméstica e racismo. A partir deste domingo (28), mulheres, negros e LGBTs poderão denunciar qualquer tipo de violência através do aplicativo NAU ou do site do clube. O serviço é gratuito. 

O objetivo do clube é auxiliar pessoas que porventura estejam passando por situações de agressão e racismo. A ideia é que as vítimas possam fazer a denúncia de forma discreta, ao fingir fazer uma compra ou consulta no aplicativo. No NAU, a função ‘Denuncie Violência’  fará uma ligação para o  Disque 180 (violência contra mulher) ou Disque 100 (violência contra LGBTs e casos de racismo). O app é gratuito e pode ser baixado tanto para Android quanto para iOS. 

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O site do Náutico também foi preparado para receber denúncias. Através da aba ‘Contato’, a vítima pode pedir ajuda ao ser redirecionada para  o site do Ministério da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos. Os serviços começam a funcionar neste domingo (28), data em que é celebrado o Dia do Orgulho LGBTI. 

O cofundador e CEO da Netflix, Reed Hastings, e sua esposa Patty Quillin anunciaram nesta quarta-feira (17) que doarão 120 milhões dólares para universidades tradicionalmente negras nos Estados Unidos.

"Nós dois tivemos o privilégio de uma boa educação e queremos ajudar mais estudantes, especialmente estudantes de cor, a ter o mesmo grande começo de vida", informou o casal em um comunicado.

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Em meio a intensos protestos nos Estados Unidos contra a violência policial e o racismo sistêmico, muitas empresas adotaram ações públicas para apoiar o movimento Black Lives Matter.

Os 120 milhões dólares serão divididos igualmente entre Spelman, Morehouse College, duas universidades em Atlanta, e o United Negro College Fund. O objetivo é financiar bolsas de quatro anos para novos alunos nos próximos 10 anos.

Essas universidades "têm resultados espetaculares e ainda estão em desvantagem em termos de doações financeiras. O capital branco geralmente é alocado principalmente para instituições brancas, perpetuando a diferença de capital", acrescentaram.

A Apple destinou recentemente 100 milhões dólares para combater o racismo, e o Google contribuirá com 275 milhões dólares para ajudar artistas afro-americanos no YouTube, a participar de financiamentos de pequenas empresas para pessoas da comunidade negra e outros projetos.

LeBron James revelou que fará parte de uma associação, que tem como meta proteger os direitos de voto e, ao mesmo tempo, incentivar negros norte-americanos a votarem na eleição presidencial, agendada para novembro deste ano.

"Sentimos que estamos sendo ouvidos e recebendo alguma atenção, e este é o momento de finalmente fazermos a diferença", disse LeBron ao jornal The New York Times, em referência às manifestações que acontecem nos Estados Unidos contra a injustiça racial.

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A organização, chamada "More Than a Vote" (Mais Que um Voto), incentivará negros norte-americanos a se registrarem como eleitores. O principal meio de atuação da associação será através das redes sociais, onde o grupo fará alertas sobre futuras intervenções no direito de voto dos afro-americanos.

"Sim, queremos que você saia e vote, mas também vamos dar o tutorial", explicou LeBron, que acrescentou: "Vamos dar a você o histórico de como votar e o que eles estão tentando fazer, do outro lado, para impedi-lo de votar".

O astro da NBA uniu forças a outros atletas e celebridades dos Estados Unidos. Também integram a associação Trae Young, jovem astro do Atlanta Hawks, Alvin Kamara, da franquia de futebol americano New Orleans Saints e o comediante Kevin Hart.

LeBron acredita que seu maior legado se dará fora das quadras. Até o momento, ele se limitou a manifestar-se em suas mídias sociais, que, ao todo, contemplam mais de 100 milhões de seguidores, mas percebeu que deveria "sair e fazer um pouco mais".

"Sou inspirado por pessoas como Muhammad Ali, sou inspirado por Bill Russells e Kareem Abdul-Jabbars, Oscar Robertsons, aqueles caras que ficaram quando os tempos eram ainda piores do que são hoje", revelou.

A organização, financiada por LeBron, irá colaborar com outros grupos norte-americanos de promoção ao voto, como o "We All Vote" (Todos Nós Votamos) e o "Fair Fight", (Luta Justa).

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