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O ano era 1922. Vivia-se um momento importante para a concepção da cultura brasileira: uma época de grandes transformações na arte. Mudanças que seriam introjetadas no Brasil por um grupo de jovens artistas brasileiros, financiados pela elite cafeicultora paulista, que lutava por uma ruptura com a estética vigente.

Entre os dias 13, 15 e 17 de fevereiro de 1922, o Theatro Municipal de São Paulo realizou uma mostra que reuniu centenas de trabalhos artísticos, entre eles, a música de Villa-Lobos; o poema “Os sapos”, de Manuel Bandeira (criador da poesia moderna brasileira, que causou reações adversas na sociedade); o discurso triunfalista de Menotti del Picchia; as esculturas de Brecheret; as pinturas de Anita Malfatti (acusada por Monteiro Lobato de expor quadros que retomavam a estética do pintor cubista Pablo Picasso). Além disso, o local foi cenário da exposição dos quadros de Di Cavalcanti, conhecido como "o pintor das mulatas".

A semana seria conhecida como o símbolo da renovação artística e promoveu uma grande revolução no panorama das artes plásticas brasileiras. Houve quem pagasse 186 mil reis para assistir aos festivais nos camarotes e frisas do Theatro Municipal.

Foi a partir de 1922 que o movimento Modernista ganhou espaço entre a sociedade intelectual da época e se tornou o principal assunto de discussões entre escultores, artistas plásticos e muitos escritores, por incluir em suas programações manifestações experimentais além de, também, as obras consideradas “do passado” pelos próprios modernistas.

O livro "A Semana que não terminou", do jornalista Marcos Augustos Gonçalvez, lançado na última sexta-feira pela Cia das Letras, explora bem essa rede de relações e a jornada dos que fizeram A Semana de Arte Moderna, reconstituindo passo a passo o evento, como também revela as contradições do movimento, como os encontros em 1921 no restaurante Trianon com magnatas (a elite cafeeira), jornalistas e escritores como Graça Aranha, que não faziam parte da geração modernista.

A Semana de Arte Moderna tinha a ideia de ruptura com o passado e, eao mesmo tempo, existia uma grande preocupação imediatista com a inserção na arte moderna internacional. Isso gerou uma forte polêmica entre os que defendiam um caminho próprio para a arte brasileira e os que acreditavam que o significado de moderno é "ser diferente" e essa diferença era representada pelo o que se criava fora do País.

Os debates intermináveis da Semana de Arte e suas consequências tiveram desdobramentos que afetam a cultura brasileira até hoje. Entre as discussões está a defesa ardorosa de Oswald de Andrade que considerava o modernismo algo “original e de diferente visão” e, em oposição a Oswald, o ataque ferrenho de Monteiro Lobato ao movimento, considerando a arte moderna como “caricatural e tipicamente europeia”, em que o escritor vinculou o modernismo a um “grau de perturbação mental”.

Nesse bate boca sem fim, o Modernismo foi construindo ao longo dos anos uma ideia de brasilidade, que em 1922 - durante os três dias da mostra -, não era sequer um esboço. Na verdade, os traços da cultura nacional foram sendo inseridos e, consequentemente, a valorização da tradição brasileira foi acontecendo.

Graças a essa teia de discussões foi possível o surgimento do "Manifesto Antropofágico", um manifesto literário escrito por Oswald de Andrade que reafirmava os valores estéticos da poesia brasileira, mas apregoando o uso de uma "língua literária não catequizada".

Passados exatos 90 anos da Semana que marcou todas as vertentes culturais do Brasil, é impossível não pensar no modernismo brasileiro sem associá-lo diretamente ao folclore de “Macunaíma” (1928) de Mário de Andrade, à antropofagia de Oswald de Andrade e às telas de Tarsila do Amaral, retomada posteriormente pelo Movimento Tropicalista de 1960. Sem esquecer das gerações seguintes, que foram agregando valores as fases do modernismo e contruibuindo para consolidar uma gama de análises estéticas e culturais no País.

Um grande exemplo é a poesia construtivista de João Cabral de Melo Neto e o Movimento Armorial, este último encabeçado pelo escritor Ariano Suassuna, que orienta todas as expressões artísticas – música, dança, literatura, artes plásticas, teatro, cinema, arquitetura – a criar uma arte erudita, porém popular.

É inegável a importância e os desdobramentos da Semana de Arte de 22. É que o evento, considerado um divisor de águas nas artes do País, mudou para sempre a forma do País se ver.

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