Este ano, as mulheres comemoram os 80 anos da conquista do direito ao voto no Brasil. Quem viveu esse momento, de alguma forma, tem na memória a lembrança do sentimento que deu um novo brilho ao execício da cidadania no País. A dona de casa Celeste Colares Maia, 90 anos, sente orgulho dos bons tempos da busca consolidada. “Lembro que me penteei, me arrumei e me maquiei. Fui com os meus pais, minha irmã Maria, meus irmãos João e Raimundo. Guiomar como era a mais nova dos irmãos só foi para nos acompanhar. Não esqueço jamais desse dia em que votei pela primeira vez. Era um papelzinho com os nomes dos candidatos e a gente marcava um "X" no nome do candidato escolhido. Hoje não voto mais porque não consigo sair de casa sozinha, mas quando votava sempre me arrumava toda ” afirma.
Getúlio Vargas era o presidente que, em 24 de fevereiro de 1932, através do Decreto nº 21.076, instituiu o Código Eleitoral Brasileiro. Segundo o texto, podiam votar livremente as casadas e as viúvas. As solteiras, apenas aquelas com renda própria - dois anos mais tarde tais restrições foram eliminadas. Apesar da liberação do voto, até 1998 as mulheres ainda eram minoria no eleitorado brasileiro e somente em 2000 elas passaram a representar a maioria desse universo. Já nas últimas eleições, em 2010, o número de mulheres aptas a votar superava o de homens em cinco milhões.
Em 2011 um novo marco histórico nas conquistas femininas foi registrado no país, com a eleição da Dilma Rousselff à presidência da República, sendo a primeira mulher brasileira a assumir a presidência do Brasil. Sua vitória ocorreu no segundo turno contra José Serra (PSDB), com 56% dos votos válidos. “A igualdade de oportunidades para homens e mulheres é um princípio essencial da democracia. Gostaria muito que os pais e as mães de meninas olhassem hoje nos olhos delas e lhes dissessem: Sim, a mulher pode!”, disse Dilma após confirmada sua eleição. Este “Sim, a mulher pode!” Dilma ecoou em sua gestão ao nomear para cargos públicos estratégicos outras mulheres, especialmente em alguns dos ministérios.
Para a PHD em Ciências Políticas e professora da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE), Alexandrina Sobreira, apesar das mulheres terem o que comemorar em 80 anos de voto, ainda há muito a ser conquistado. “Nosso espaço apesar de ter sido ampliado, especialmente dos anos 80 para cá, não fez crescer nossa representação nos poderes executivo, legislativo e judiciário, sendo um número ainda pequeno. Você vai às instituições do governo e encontra poucas mulheres ocupando cargos políticos”.
Dos congressistas, apenas 8,9% são mulheres. Nas Assembleias Legislativas e nas Câmaras Municipais o percentual médio é de 12%. De acordo com Alexandrina Sobreira, o ideal seria que a representação feminina correspondesse a metade. “Assim como nos Estados Unidos a representação das mulheres deveria ser fifty fifty (cinquenta por cinquenta), meio a meio. Assim seria mais equilibrado”. Contudo, a Lei de Cotas brasileira determina a participação mínima de 30%.
Presidentes na América Latina - Nos 33 países da América Latina, eleger uma mulher como presidente do país não é nenhuma novidade. Em 1974, a argentina María Estela Martínez de Perón, mais conhecida como “Isabelita” Perón, foi a primeira mulher a assumir o governo de um país, na região. Ela era vice-presidente na chapa do marido, Juan Domingo Perón, e com a morte dele passou a ser presidente da Argentina.
Além da Argentina, que já teve duas mulheres no poder, e também do Brasil, agora com Dilma Rousseff, países como a Bolívia, Haiti, Nicarágua, Equador, Guiana, Panamá, Chile e Costa Rica também já elegeram mulheres para a presidência. Hoje, na região ainda pode se ressaltar a Cristina Kirchner, eleita em 2007 e reeleita em 2011 na Argentina e a costarriquenha Laura Chinchilla, eleita em fevereiro de 2010.
“A presença de mulheres ocupando a presidência de países da América Latina significa que as pessoas desejam renovação. As mulheres têm a característica de serem mais agregadoras e conciliadoras, além de conseguirem executar várias tarefas ao mesmo tempo. Já os homens são monofocais, realizam uma ação por vez. A administração feminina também costuma ter uma característica importante porque as mulheres costumam fazer o monitoramento das ações, enquanto os homens preferem conferir apenas o resultado final”, observou a cientista política.
Mas Alexandrina faz ressalvas em relação a gestão feminina e afirma que a mulher deve ser firme nos seus propósitos de luta." Apelar para a fragilidade e apelo estético não são boas estratégias para líderes políticas. Outra prática que deve ser combatida é uma mulher ocupar um cargo político sem ter currículo para isso. Por exemplo, uma primeira dama de um município ocupar o cargo de secretária de ação social apenas por ser a mulher do prefeito”, avaliou.
Segundo ela, o voto é canal garantido de expressão silenciosa mais importante na vida de uma mulher, especialmente há 80 anos, quando ela ainda era sustentada por seu pai ou marido. Apesar de não usar a mesma frase da presidente do Brasil, “Sim, a mulher pode!”, a aposta da cientista para os próximos 80 anos de voto feminino, se afina com a de Dilma. “Foi através desse instrumento democrático que pudemos mudar parte de nossa trajetória política e minha aposta para os próximos 80 anos é que conseguiremos conquistar um espaço ainda maior na política e em outras áreas. O espaço que é justo: fifty fifty. Ou seja, espaços iguais ”, salientou.