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No dia 13 de março de 2020, uma recomendação expedida pelo Ministério da Saúde estabelecia que durante o atual período de emergência na saúde pública, fossem adiados ou cancelados eventos de massa governamentais, esportivos, culturais, e/ou políticos, bem como cruzeiros turísticos. A orientação chegava como protocolo de segurança no enfrentamento à pandemia do novo coronavírus, que rapidamente espalhou-se pelo mundo impactando nossa maneira de viver. 

A partir da recomendação do Ministério, as unidades federativas do Brasil foram publicando decretos que proibiam a aglomeração de pessoas, sendo assim, eventos como shows, espetáculos teatrais e até a mais ‘inofensiva’ sessão de cinema ficariam impossibilitados de acontecer por tempo indeterminado. Era o ínicio de uma fase de dificuldades para milhares de profissionais da cadeia cultural no país que, até o momento, passados cinco meses desde o primeiro cancelamento, se vê sem trabalho nem perspectiva. 

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Até 2017, os setores cultural e criativo representavam 2,61% de toda a riqueza gerada em território nacional, sem falar na  capacidade de geração anual de 25,5 mil postos de trabalho. Anteriormente à pandemia, esses segmentos tinham a previsão de contribuir com U$ 43,7 bilhões para o Produto Interno Bruto Nacional (PIB), até 2021. No entanto, com o  impacto do coronavírus, só o período entre maio e agosto deste ano representou uma perda de receita de 44,4% no segmento, segundo a pesquisa Percepção dos Impactos da Covid-19 nos setores cultural e criativo do Brasil. 

De acordo com os entrevistados da pesquisa, os próximos seis meses serão de manutenção das perdas já registradas. A maioria avalia que, no período de agosto a outubro/2020, perderá 100% da receita. Já uma pequena parcela, entre esses, acredita que  sua receita aumentará menos de 50% neste período e da mesma forma entre novembro de 2020 e janeiro de 2021. O cenário geral é de desânimo e preocupação, além da sensação de desamparo pela falta de políticas públicas eficientes voltadas para a área. 

Produção cultural

Atrás dos palcos dos grandes eventos estão os produtores culturais. Esses profissionais, que correm por trás para fazer o show acontecer, também estão amargando dificuldades neste período de crise, e a necessidade de fazer uso da criatividade e do jogo de cintura para não sucumbir a ele os tem acompanhado na lida diária. 

Multifacetados, estes trabalhadores costumam atacar em diversas áreas para suprir as necessidades dos clientes e contratantes. Marah Rúbia, por exemplo, é produtora cultural, executiva, de palco, artística e assessora de comunicação, além de fazer monitoramento de redes sociais. Em entrevista ao LeiaJá, ela conta que seu faturamento diminuiu em 60% desde o início da pandemia e que foi preciso criar alternativas para enfrentar o problema. “Tive que me reinventar. Buscar outros meios pra suprir esse ‘buraco’. Mas como trabalhava com assessoria, revi novas formas, junto aos meus assessorados, para divulgações, como lives, por exemplo, novos  formatos de trabalhos nas redes sociais, etc’.

Marah Rúbia é produtora cultural, executiva, de palco, artística e assessora de comunicação. Foto:Reprodução/Facebook

A produtora, atualmente morando no Rio de Janeiro, se jogou no estudo de novas ferramentas e aplicativos, para entrar com tudo na onda das lives, e o retorno, ainda que vagaroso, tem sido favorável. “O ganho vem aos poucos. Mas tem sim como conseguir ganho. Os eventos online são um ótimo atrativo, quando bem executados”.

Há mais de uma década produzindo bandas, shows e festas, Claudia Aires, radicada na Paraíba,  também sentiu o baque da pandemia no dia a dia e no bolso. “Me viro nos 30 para a economia em crise não me abater, já que o psicológico e o receio de que tudo isso realmente vá melhorar é um dilema diário, não só meu, mas de toda a minha bolha e mercado”. 

Além da produção, Claudia também atua na área da publicidade,  na condução de uma galeria de arte virtual - a Nuvem Store -, e como DJ. Os projetos paralelos a ajudaram a driblar a falta de trabalho na área de produção e têm sido um respiro nesse momento. Ela também tem se dedicado às lives, e vê nesse formato uma boa forma de se manter atuante. “As lives remuneradas, e com grandes custos de produção, são uma realidade, porém, ainda muito restritas a grandes nomes. Os pequenos produtores ainda estão envoltos nessa onda de incerteza da volta de eventos e shows presenciais. Enquanto isso, uns usam as lives para não adormecer seu produto nem sucumbir”

Claudia Aires trabalha com produção cultural há mais de 10 anos. Foto: Reprodução/Instagram

Aldir Blanc

Em meio às incertezas e a necessidade de se adaptar aos tempos de crise, os profissionais da cadeia criativa receberam de bom grado a chegada da Lei Aldir Blanc. A lei, sancionada em tempo recorde devido a urgência da situação, prevê um aporte de R$ 3 bilhões a serem repassados para pequenas e microempresas, trabalhadores informais e organizações da área da cultura, em todo o país. 

As produtoras ouvidas pelo Leiajá vêem a chegada da ajuda emergencial com otimismo, porém com algumas ressalvas. “ Prevejo um cenário de recuperação para as atividades culturais, neste segundo semestre. Nunca vai compensar o tamanho das perdas, mas tem uma boa chance de recuperação para o setor com essas verbas, é possível dar uma movimentada”, diz Marah Rúbia.

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Já Claudia Aires se mostrou atenta em relação às circunstâncias em que se darão os repasses do dinheiro. “A luta é grande para que a burocracia e a politicagem não prejudiquem esse grande objetivo final que é fomentar, com urgência, toda uma cadeia produtiva que foi brutalmente atingida pela pandemia. Vejo com bons olhos os movimentos, fóruns, assembléias e discussões sobre o tema. Só espero que isso sensibilize o poder público, das esferas municipal, estadual e federal, para que essa ajuda seja disponibilizada o mais breve possível, aliviando a angústia de todos esses profissionais que fazem parte dessa importante cadeia produtiva”.

E o amanhã?

Após cinco meses de muita luta e enfrentamento ao coronavírus no Brasil, os estados começam a retomar suas atividades econômicas à medida que as normas de isolamento vão sendo relaxadas. A abertura de bares e restaurantes, shoppings e do comércio de maneira geral acendeu uma luz no fim do túnel para aqueles que trabalham com arte e cultura. 

Em Pernambuco, a expansão do horário de funcionamento dos bares veio acompanhada da liberação de apresentações musicais, ainda que com algumas restrições. As apresentações no estilo drive-in também já começam a ser realizadas no estado. No entanto a previsão de uma retomada plena das atividades culturais ainda divide opiniões, mesmo entre os profissionais da área. “Conheço lugares que não gostariam de voltar, mas devido à urgência em sobreviver, se reorganizaram para manter seus espaços de pé e seus poucos funcionários e proprietários na ativa. Eu vislumbro que volta em pouco tempo, mesmo tendo a consciência de que ainda estamos passando por um momento difícil. Se todos tomarem suas precauções e o público entender o seu papel no estímulo a esses espaços, acredito que haverá de se chegar a um consenso”, diz Claudia Aires.

Já Mara Rúbia, não vê com bons olhos a volta de alguns setores. Para a produtora, a existência de uma vacina é fator imprescindível para que as atividades voltem com o mínimo de normalidade e segurança possíveis. “O ciclo de volta do setor cultural deve levar em consideração alguns pontos importantes, como protocolos de curto prazo e a  longo prazo, considerando acolher artistas e público em uma nova fase e formato. Mas, não consigo ainda ver um retorno seguro neste momento, sem uma vacina”.

 

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