Ele chega a passos bem lentos, com a ajuda inseparável de uma bengala. Com 83 anos, a idade de Alípio Bordalo já não o permite andar por toda a Santa Casa, como fazia antes. Mas é só começar a falar do Museu, fundado por ele, que traz a história do hospital mais antigo de Belém, a voz ganha vigor e imponência. “O que me motivou a criar esse museu foi o idealismo. Sentia a necessidade de reunir todo o acervo histórico em um local determinado, que pudesse ser visitado, estudado e pesquisado, como realmente está sendo feito. Foi um trabalho de formiguinha, porque a maioria do material estava abandonado. Mas hoje, me sinto realizado porque isso aqui é um patrimônio histórico e cultural. Quem não tem memória, é um povo apagado”, diz.
O médico, que durante 45 anos trouxe ao mundo centenas de bebês paraenses na Santa Casa - o primeiro hospital de Belém -, hoje se realiza ajudando a contar, com a ajuda do acervo do museu, cada detalhe da história do lugar, que se confunde com a própria história de Belém. Fundado em junho de 1987, em uma sala do antigo pavilhão das “Filhas de Santana”, o museu traz um acervo constituído por 15 coleções, entre elas a de louças e utensílios, farmácia antiga, esculturas, documentos, mobiliário artístico, lápides e fotografias. Entre os bustos de alguns ex-diretores da Santa Casa, Alípio vai falando, com altivez: “ Todos eles são de mármore maciço, feitos, em sua maioria, na Itália”.
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A Santa Casa foi o primeiro Hospital de Belém. Construído 34 anos depois da fundação da cidade, no dia 24 de fevereiro de 1650, com o nome de Irmandade da Santa Casa de Misericórdia do Pará, o Hospital sempre foi referência no atendimento de pessoas carentes. Atualmente o museu/arquivo Alípio Bordalo guarda parte dessa memória da saúde e da medicina feitos no século passado.
Após longa polêmica, tudo faz crer que a Irmandade da Santa Casa de Misericórdia do Pará foi fundada aos dias 24 de fevereiro de 1650. O fundador é desconhecido. A princípio, a igreja e o albergue eram de taipa e pilão e se localizavam na antiga rua Santo Antônio dos Capuchos, com o Largo da Misericórdia, hoje, Praça Barão de Guajará, onde está o prédio da loja Paris n' América.
D. Afonso VI, rei de Portugal, conferiu em 12 de julho de 1667 à Irmandade da Misericórdia paraense o diploma concedendo as mesmas isenções, graças e privilégios de que gozava a Irmandade da S C da Misericórdia de Lisboa. Após sérios desentendimentos políticos entre o Bispo do Pará, D. Manoel d' Almeida Carvalho, e as autoridades civis da província, especialmente com o Juiz de Resíduos e Capelas, José Marques da Costa, a Irmandade da Santa Casa de Misericórdia tomou posse de todos os bens da Confraria da Caridade, instituída pelo grande benemérito D. Frei Caetano Brandão, 6° Bispo do Pará, inclusive o Hospital "Senhor Bom Jesus dos Pobres", inaugurado em julho de 1787, pelo referido Bispo, no antigo Largo da Sé. Isso aconteceu no dia 18 de abril de 1807.
O Hospital "Senhor Bom Jesus dos Pobres" pode ser considerado o 1° nosocômio de alvenaria do Pará, e atendeu a população carente durante as epidemias decólera, varíola e febre-amarela, durante o século XIX. Durante o primeiro governo republicano de Justo Chermont, conforme o Decreto Estadual n° 291, de 20 de novembro de 1890, houve, pode-se dizer, a 1° intervenção do Estado junto à Irmandade da Santa Casa, com ampla reforma dos estatutos regimentais, passando a se chamar - Associação Civil de Caridade Santa Casa de Misericórdia do Pará. Motivos político-religiosos diminuíram a influência da Igreja Católica e aumentaram a do Estado.
Em janeiro de 1990, com apoio do Governo do Estado, a instituição passa ao regime jurídico de Fundação Santa Casa de Misericórdia do Pará, sendo nomeado presidente Clodoaldo Ribeiro Beckman. Além dos dois hospitais de caridade, a Santa Casa de Misericórdia do Pará, dirigiu também o antigo Lazareto do Tocunduba, o Hospital Domingos Freire, Serviços de Loterias e Funerário. Em 2013, foi inaugurada a Unidade Materno Infantil “Dr. Almir Gabriel”, dotada de uma moderna estrutura.
Há 29 anos funcionando como centro de valorização da memória da Santa Casa e de Belém, o Museu/Arquivo histórico da Santa Casa tem o objetivo de preservar, pesquisar e divulgar o valioso patrimônio científico, histórico e cultural do Estado. O orgulho do fundador Alípio é dividido também com a servidora do Estado Tammy Bernal, coordenadora do museu. “Eu me sinto muito feliz, contribuindo, como servidora e moradora de Belém, podendo guardar, fazer algo em prol da nossa própria cidade, da nossa criação, nossa história.”
Por Syanne Neno, da Agência Pará.
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