A ocasião é especial e Gilmar Barbosa se vestiu a caráter com um paletó novo e sapatos brilhantes. Aos 35 anos, ele participa de sua primeira formatura e vai receber o diploma de “pedreiro de alvenaria”, no Teatro Beberibe, Centro de Convenções de Pernambuco, em Olinda, nesta terça-feira (21). Nos próximos meses, mexerá no cimento e construirá casas.
Há três anos, a vida de Gilmar mudou completamente. Ele foi usuário de entorpecentes por 18 anos e descobriu na prática o real significado de como é viver no “mundo das drogas”. Mas não só Gilmar deu um grande passo para a mudança, nesta terça-feira. Ao todo, se formam 198 concluintes de cursos profissionalizantes oferecidos pelo Programa ‘Integra Recife’, que é a parte do Sistema Mais Recife de Políticas sobre Drogas responsável pela inserção social e produtiva de ex-usuários. As turmas foram formadas por ex-dependentes químicos e pessoas em situação de vulnerabilidade social.
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Aos 14 anos, Gilmar relembra que amizades da época de adolescente o apresentaram às primeiras substâncias químicas e dentro de poucos anos ele se viu trabalhando com a venda dos produtos. “Comecei utilizando maconha, depois drogas mais pesadas e terminei no crack. Eu fui assistindo tudo que eu tinha se afastar de mim, minha família e meus filhos. Mas a gente não consegue parar porque é um ciclo viciosos e quase ninguém te apoia”, conta Gilmar.
Preso três vezes pelos crimes de tráfico de drogas, associação criminosa e homicídio, Gilmar explica que chegou a não ter esperança na vida, principalmente porque dentro das penitenciárias o crime e o consumo de drogas é muito comum. “Tudo que eu tinha construído se acabou. É como se a droga me consumisse e eu não tinha mais forças para tentar me libertar”.
Dentro da Penitenciária Professor Barreto Campelo, em Itamaracá, no Litoral Norte de Pernambuco, no mesmo lugar onde se viu sem rumo, Gilmar tirou forças para se livrar do vício. “Eu estava muito drogado em uma certa noite e ali eu comecei a falar não queria mais aquilo para mim. Essa noite foi inesquecível porque há três anos eu não uso mais nada”, celebra o ex-dependente químico.
Longe das salas de aula e fora do mercado de trabalho, os ex-usuários de drogas lidam diariamente com o preconceito e a falta de oportunidades. A dependência química afeta cerca de 5% da população brasileira, índice que representa mais de 8 milhões de pessoas. Há tratamentos na rede de saúde pública, mas reinserir essas pessoas no mercado profissional ainda é um tabu.
Para o diretor regional do Serviço Nacional de Aprendizagem Industrial em Pernambuco (Senai), Sérgio Gaudêncio, não há essa facilidade para o mercado de trabalho, mas muitas empresas reservam vagas especiais para esse público. “O preconceito existe, mas tenho percebido que isso vem mudando com os tempos. A participação dos que já foram dependentes de droga é fundamental nesse processo. Eles precisam reivindicar esses espaços que precisam ser deles também”, disse.
Ao todo, 460 pessoas foram beneficiadas por esta parceria entre a Secretaria Executiva de Políticas sobre Drogas (Sepod) da PCR e o Senai, que ofereceu cursos de mantenedor de sistemas automatizados, eletricista industrial, operador de computador, panificação e pedreiro de alvenaria. As aulas foram realizadas em unidades móveis do Senai, na escola Senai de Areias e no Instituto dos Cegos.
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