Descubra como funciona, na prática, a LGPD

Presidente do Instituto de Pesquisa em Direito e Tecnologia do Recife (IP.rec) explica como a Lei Geral de Proteção de Dados vai ajudar a proteger suas informações pessoais

por Katarina Bandeira sex, 25/09/2020 - 17:18
RawPixel Lei serve para proteger dados pessoais dos usuários RawPixel

Você sabe o que é feito com os dados que você cadastra na internet? Seu e-mail, nome completo, endereço, documentos ou até mesmo o número de CPF solicitado na farmácia? Sabe para onde vão as informações? A Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD), que entrou em vigor na última sexta-feira (18), chega para garantir que todos os cidadãos brasileiros saibam, exatamente, para onde vão suas informações pessoais e o que empresas de todos os tamanhos estão fazendo com elas.

Para jogar uma luz sobre esse assunto ainda tão pouco explorado, mas tão importante, o LeiaJá conversou com Raquel Saraiva, advogada, mestre e doutoranda em Ciência da Computação e Presidenta e do Instituto de Pesquisa em Direito e Tecnologia do Recife (IP.rec).

“Eu considero a LGPD uma vitória da sociedade civil. Porque a gente, enquanto usuário de tecnologia e enquanto consumidor, é justamente quem sai perdendo quando os dados pessoais são usados para fins abusivos”, diz Raquel Saraiva. Ela também explica que lei chega justamente para proibir esse tipo de prática.

“A LGPD vai regular o tratamento dos dados pessoais, ela conceitua o que é dado pessoal e faz a regulação desse mercado, para que a gente enquanto consumidor tenha a possibilidade de brigar, de exigir, de se defender quando a gente se sentir prejudicado”, acrescentou.

O que são dados pessoais?

De acordo com a LGPD, dado pessoal é “a informação relacionada à pessoa natural identificada ou identificável”, ou seja, todas as informações que identificam diretamente alguém ou que podem levar a esta identificação com a combinação de dados chave. Dentro da lei é possível encontrar outras subdivisões como Dados Sensíveis, por exemplo, que precisam de ainda mais proteção e com os quais se identificam a origem racial ou étnica, convicção religiosa, opinião política, filiação a sindicato, entre outros detalhes do cidadão. 

De acordo com Raquel, uma das formas em que a LDPD se propõe a proteger os dados dos consumidores é a transparência. “Se uma empresa está vendendo [seus dados] para outra empresa como, por exemplo, a farmácia que pede o CPF para dar o desconto, se ela está vendendo meu documento para qualquer outra companhia ela tem que pedir autorização para fazer isso, que é o que chamamos de ‘consentimento", explicou.

Com a vigência da Lei Geral de Proteção de dados, companhias de todos os tamanhos, tenham suas sedes no Brasil ou não, agora também são obrigadas a mostrar, de forma clara, para onde vão os dados coletados e por que eles foram necessários para aquele serviço. Para se adaptarem, as empresas precisam ter cláusulas de privacidade, dizendo aos cidadãos o que elas fazem exatamente com os dados coletados, incluindo as farmácias.

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Crianças, adolescentes e as redes sociais

Plataformas como Tik Tok, Twitter, Twitch e YouTube estão entre as preferidas dos jovens. Tanto que, de 2019 para cá, os donos dessas redes precisaram rever suas políticas de privacidade e uso de inteligência artificial para lidar melhor com este público. Para o YouTube, o Google tornou mais rígidas os conteúdos veiculados e proibiu vídeos que induzissem, mesmo que indiretamente, crianças a se interessarem por jogos ou brinquedos. 

As redes do Facebook são proibidas para menores de 13 anos, mesmo com o consentimento dos pais. Há diretrizes que seguem a COPPA (Ato de Proteção Online à Criança, na sigla em inglês), uma lei de proteção à vida privada das crianças na internet. No Brasil, essa proteção ganha o reforço da LGPD que exige que a coleta de dados infantis só pode ser feita com o consentimento específico de seus responsáveis legais. 

Além disso, as empresas não podem armazenar essas informações ou repassá-las para outras pessoas assim como não é permitido condicionar o consumo de jogos, aplicativos e outras ferramentas com base nos dados captados. 

A chave está no consentimento 

Para todos os pedidos, seja de cadastro para pegar o cartão de consumo no bar ou para começar a usar um aplicativo no celular, a empresa terá que explicar o porquê precisa daquela informação. Além disso, caso você não concorde com o uso, ou desista de fazer parte de uma rede social, por exemplo, pode pedir para que todas as suas informações sejam excluídas em definitivo. 

“Se ela não excluir você pode entrar com uma ação judicial e caso haja algum dano, exigir reparação”, afirma a advogada. Ela diz que as sanções só serão aplicadas a partir de agosto de 2021, mas que já é possível fazer uma denúncia. “Ela começa com advertência, depois poderá ser obrigada a reconhecer publicamente que houve vazamento de dados [por exemplo], até uma multa de 2% do faturamento da empresa”, explica.

Raquel também cita que é preciso ter um pouco mais de senso crítico na hora de aceitar as permissões de um aplicativo. “Se eu tenho um app de lanterna e ele pede para acessar os meus contatos, é claramente abusivo. Não é possível que uma lanterna só funciona se ela tiver acesso aos meus contatos”, disse.

Quando é possível usar os dados sem pedir permissão

Mas como tudo na vida, existem exceções. É possível que órgãos públicos ou privados tenham acesso aos seus dados  - sem o seu consentimento -, mas só quando isso for indispensável. Ou seja, para cumprir uma obrigação legal, executar uma política pública, defender direitos em processo, prevenir fraudes e crédito, preservar a vida e a integridade física, entre outras situações.

“A LGPD não vai impedir as empresas de tratarem esses dados, ela regula o mercado para que haja transparência nesse processo e para que a gente possa questionar quando se sentir abusado. E tudo isso protegendo um direito fundamental que é um direito à privacidade”, afirmou Raquel.

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