Elas no Funk une mulheres para barrar o machismo no baile

Primeiro coletivo feminino do movimento funk no Recife vem atuando para que as mulheres possam curtir as festas sem maiores problemas

por Paula Brasileiro sex, 23/09/2022 - 12:11
Cortesia O 'Elas no Funk' existe - e resiste - desde 2018. Cortesia

A expressão “lugar de mulher é onde ela quiser” nunca foi mais possível do que nos últimos anos. Cada vez mais seguras de si e donas de suas escolhas, as mulheres contemporâneas vêm ocupando espaços antes impensáveis para elas. Nos bailes funk do Recife, capital pernambucana, não tem sido diferente graças a uma iniciativa coletiva fundada em 2018, o Elas no Funk, primeiro grupo exclusivamente feminino de minas que curtem um bom pancadão.

O ‘Elas’, como chamam suas integrantes, surgiu após uma inquietação da cabeleireira Rayane Andreza Dias. Convidada por uma amiga para conhecer um baile funk, em 2018, ela se apaixonou de cara pela música e dança da festa. Mas, apesar do ‘amor à primeira vista’, algo chamou a atenção da jovem: no evento, a presença masculina era massiva enquanto o número de mulheres era muito inferior.

Diretoria do 'Elas no Funk'. Foto: Cortesia

Incomodada com a situação, Rayane decidiu mudar o cenário. Uniu-se a outras três amigas - hoje todas diretoras do coletivo -, e criou o ‘Elas no Funk’, primeiro grupo feminino de mulheres do movimento. “A gente queria o respeito dos homens, poder dançar sem sermos interrompidas, por exemplo”, explica a fundadora. 

O projeto teve ótima recepção entre as garotas e a ajuda de um outro coletivo, a Fape, ‘equipe’ que atua em prol do movimento funk. “No início tiveram situações de preconceito, alguns ‘bondes’ (grupos formados em bairros) diziam que era modinha, mas lutamos pelo nosso espaço e conseguimos. Depois que a gente foi ganhando nome, os rapazes de cada bonde foram abraçando o movimento e nós fomos acolhidas”, diz Rayane.

Desde o início, o Elas no Funk vem reunindo mulheres de diferentes localidades da Região Metropolitana do Recife e, após o surgimento do coletivo, vários outros ‘bondes’ femininos foram surgindo nos bairros. Juntas, elas ocupam os bailes para se divertirem em segurança e também promover a “união, o respeito e a igualdade”. “Os homens estão aprendendo com a gente”, declara a diretora.

Rayane idealizou o coletivo em 2018. Foto: Cortesia

Débora Leão, a Negrita MC, é outra mulher que vem se beneficiando do trabalho do Elas. Atriz, rapper, produtora e comunicadora social, ela deu seus “primeiros passos” no funk em 2018, embora já tivesse o conhecimento do movimento desde sua infância, vivida no bairro do Ibura, localizado na Zona Sul do Recife. “Minha relação com o Elas surgiu a partir do momento que eu vi esse movimento trazendo várias outras mulheres, agregando outros bondes femininos e ocupando todo baile. Foi daí que eu vi que eu queria tá nessa articulação e tá representando junto com elas esse movimento que aonde chega mostra cada vez mais resistência”, diz a artista.

Para Negrita, também muito atuante na cena Hip Hop. a falta de visibilidade para as mulheres desses segmentos e o predomínio dos homens neles ainda continuam a despeito de iniciativas como das que ela participa. A MC consegue apontar alguns detalhes que ainda precisam de atenção nesse sentido. “Sinto falta de mais bailes voltados pra mulheres, mais bailes onde nós mulheres sejamos as que produzem e que outras MCs sejam chamadas pra somar no palco. Falo isso na minha perspectiva, seja como ouvinte mas como MC também. Espero que com o passar do tempo e principalmente com mais resistência e força (isso mude). Mas com o surgimento do 'Elas’' vejo mais mulheres curtindo bailes, abrindo rodas, fazendo ações sociais, realizando outros movimentos e isso é importante”.

Débora Leão, a Negrita MC. Foto: Cortesia.

Juntas

As mudanças no movimento funk promovidas pelo Elas comprova o quão poderosa pode ser a união das mulheres. Dentro desse coletivo, minas de diferentes idades vêm derrubando estereótipos, exterminando preconceitos e ressignificando todo um movimento antes hostil para elas. Tudo com muita persistência, força de vontade e, sobretudo, resistência, como coloca a diretora Rayane: “Ainda falta melhorar muita coisa, é uma evolução constante, mas a gente está aí na luta”.

 

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