Estudo oferece esperança para o tratamento da dengue
Testes em culturas de células e ratos revelaram que um composto identificado recentemente é capaz de desarmar o vírus
A dengue é uma doença que afeta quase 100 milhões de pessoas no mundo todos os anos, provocando sintomas como febre alta e dores intensas. Agora, uma nova pesquisa talvez tenha a resposta para um possível tratamento para o vírus.
Testes em culturas de células e ratos revelaram que um composto identificado recentemente é capaz de desarmar o vírus, impedindo o mesmo de se replicar e prevenir a doença, de acordo com um estudo publicado nesta quarta-feira (6) na revista científica Nature.
A pesquisa também indica que o composto pode ser efetivo se administrado de forma preventiva, antes da infecção, ou como um tratamento após a instalação do vírus.
Para Scott Biering e Eva Harris, especialistas da Escola de Saúde Pública da Universidade da Califórnia em Berkeley, nos EUA, a descoberta é um desenvolvimento "empolgante" na batalha contra a dengue.
"[O estudo] representa um grande avanço no campo da terapêutica da dengue" afirmou a dupla, que não participou diretamente da pesquisa, em resenha publicada na Nature.
Não há dúvida de que o vírus transmitido pelo mosquito aedes aegypti representa uma ameaça para a saúde pública global, já que as estimativas indicam que ele infecta pelo menos 98 milhões de pessoas por ano e está presente em 128 países.
Além disso, como existem quatro cepas diferentes do vírus, ser infectado por uma delas não garante proteção contra as outras, e as reinfecções costumam evoluir para complicações mais graves, a chamada dengue hemorrágica.
Até o momento, não existe tratamento para o vírus, e as estratégias de mitigação se concentram no foco da transmissão, que são os mosquitos. Apenas uma vacina, a Dengvaxia, foi aprovada em alguns países, mas sua efetividade é limitada a uma única cepa.
- 'Sem precedentes' -
O composto, chamado de JNJ-A07, mostrou efeitos "sem precedentes em animais infectados", comentou à AFP Johan Neyts, professor de virologia da Universidade de Leuven, na Bélgica, que fez parte do estudo.
"Mesmo se o tratamento for iniciado no pico de replicação viral, há uma atividade antiviral significativa", acrescentou.
O JNJ-A07 age sobre a interação entre duas proteínas no vírus da dengue, que são fundamentais para a sua replicação. Testes em células, tanto humanas quanto de mosquitos, mostraram que o composto foi efetivo contra as quatro variantes.
Além disso, como o vírus evolui rapidamente, os especialistas avaliaram como o composto JNJ-A07 se sairia na medida em que o vírus sofresse mutações.
"Em células infectadas em laboratório, levou quase seis meses até que pudéssemos obter uma resistência importante [ao tratamento]", disse Neyts. "Dado que a barreira à resistência é tão alta, é muito improvável que isso se torne um problema clínico", acrescentou.
Curiosamente, as mutações que causaram resistência também pareciam tornar o vírus incapaz de se replicar nas células do mosquito. Isso poderia sugerir que, mesmo que o vírus desenvolvesse resistência ao JNJ-A07, ele não seria mais transmissível por mosquitos.
- Exames clínicos em progresso -
Segundo Neyts, a versão do composto reportada na Nature foi "otimizada" e está em desenvolvimento clínico pelo laboratório Johnson & Johnson. No entanto, muitos questionamentos ainda pairam sobre o JNJ-A07, especialmente se ele poderia aumentar a vulnerabilidade à reinfecção.
Segundo Biering e Harris, dado que o JNJ-A07 age para reduzir a viremia, que é a presença do vírus no sangue, são necessários mais estudos para determinar se o tratamento pode deixar as pessoas mais suscetíveis a contraírem dengue hemorrágica.
Apesar disso, Neyts acredita que o estudo traz possibilidades interessantes. "Ver o composto agindo de forma tão potente em animais foi de tirar o fôlego", frisou.