Chuvas: familiares lamentam perdas e falta de soluções
O município de Jaboatão foi o mais atingido pelas chuvas de 2022, contando o maior número de vítimas fatais, 64
Em maio de 2022, quando chuvas torrenciais atingiram a Região Metropolitana do Recife (RMR), causando a morte de 129 pessoas, o município do Jaboatão dos Guararapes contou o maior número de vítimas fatais, 64. As regiões mais afetadas foram em bairros próximos de morros e encostas, como a região de Monte Verde, no bairro de Dois Carneiros, onde mais de 20 pessoas perderam suas vidas, e o deslizamento de terra foi a tragédia mais comum no município.
A Prefeitura do município alega possuir planos de prevenção que, segundo nota, serão colocados em prática “em breve”, como a construção de 138 muros de arrimo em áreas de risco e a implantação de geomantas. O processo de seleção de 95 profissionais temporários para trabalharem na Defesa Civil ainda está em etapa de análise de currículo dos candidatos, e tem previsão para ser concluído ainda no mês de março.
O LeiaJá visitou o a região dos morros em Monte Verde para verificar se já foi feito algum serviço de reestruturação da área das encostas. As casas que não foram levadas pelos deslizamentos haviam sido interditadas pela Defesa Civil do município à época, mas voltaram a ser habitadas pelos moradores pelo simples fato de eles não terem para onde ir. Na Rua Serra da Boa Esperança, conversamos com Vanessa*, 22 anos, que mora na mesma casa desde que nasceu. O local foi inundado de barro e lama do morro que cedeu em maio do ano passado. Mesmo diante da tragédia vivida, de ter perdido quatro parentes na época, vítimas de soterramento, ela diz que não tem condições de deixar o local de vez. No entanto, a sensação de insegurança é constante, principalmente pela falta de apoio por parte das autoridades competentes.
“Nenhum suporte [da prefeitura], que até então eles só fazem projetos, mas projetos que nunca saem do papel. Foi bem traumático, eu perdi quatro pessoas da minha família, e até hoje nada foi solucionado. O restante dos meus familiares moram de aluguel, e não têm nenhum suporte da prefeitura nem nada.”, explicou Vanessa.
Vanessa vive em casa própria, mas após os deslizamentos, ela e sua família tiveram de morar temporariamente com parentes em outra localidade, até a situação se resolver e ela conseguir abrir novamente sua residência. Seu maior receio é que as chuvas deste ano sejam piores do que as do ano passado e, segundo ela, as autoridades não fizeram muito pela população. “Eles [órgãos competentes] mesmos disseram que quando chegar o inverno, eles não vão poder trabalhar, e por que eles não fazem antes? Até o momento a gente está no aguardo, mais nada.”, comentou.
Desamparados, os moradores da região não veem outra solução. A moradora ainda comentou que não recebeu nenhum auxílio financeiro por parte da prefeitura após as chuvas, e dessa forma não haveria como viver de aluguel em outro lugar. No início de fevereiro o município recebeu um acumulado de mais de 100mm de chuva em apenas 24h, na madrugada do dia 6.
Falta de verba
O investimento previsto pela gestão atual para a construção dos muros de arrimo é de R$ 26,5 milhões, mas o gabinete não informou quando as obras terão início. O LeiaJá tentou contato mais de uma vez acerca do andamento do projeto, mas a resposta dada pela assessoria de imprensa da prefeitura foi de que "a verba ainda não havia sido liberada pelo governo federal".
Na nota enviada anteriormente, a prefeitura informou o desenvolvimento de um Sistema Inteligente de Monitoramento e Alerta nas áreas de risco de deslizamentos e inundações. O projeto, realizado pela startup Porang e a Universidade de Pernambuco, núcleo de Caruaru, conta com financiamento da Fundação de Amparo à Ciência e Tecnologia de Pernambuco (Facepe). A promessa é que a ferramenta permita um acompanhamento dos pontos em tempo real e o envio de mensagens à população.
Outra parte do plano da cidade para o enfrentamento das chuvas do meio do ano é a implantação de 15 estações integradas, cada uma com raio de alcance de cinco quilômetros. “Com o sistema, se necessário evacuação de áreas, isso poderá ser feito de forma ordenada e antecipada. As inspeções de espaços que podem funcionar como abrigos e refúgios já foram realizadas, bem como o Plano de Contingenciamento em caso de desastres passa por atualização e treinamento de equipe”, diz a nota.
O principal problema enfrentado pelos moradores de áreas de risco é o constante medo de haver novos deslizamentos. Imagens de satélite captadas antes das chuvas de maio de 2022 mostram como era a região de Monte Verde, em comparação com a visita feita pelo LeiaJá essa semana (galeria de imagens). As estruturas de algumas casas ainda estão de pé, e elas possivelmente ainda estão sendo habitadas.
Em janeiro deste ano, a Agência Pernambucana de Águas e Clima (APAC) publicou a previsão climática para o primeiro trimestre em todo o estado. A estimativa "indica acumulado de chuva de normal a acima da média" para todas as regiões. Basta aos moradores esperarem por dias melhores.
*O nome foi modificado para preservar a identidade da entrevistada.