Além da técnica: a função social dos Institutos Federais

Em 2018, os Institutos Federais de Educação, Ciência e Tecnologia comemoram dez anos de existência e se consolidam como uma rede de educação profissional, científica e inclusiva

por Eduarda Esteves ter, 04/12/2018 - 12:12

O que antes eram os conhecidos Centros Federais de Educação Tecnológica (Cefets), as escolas técnicas e agrotécnicas passaram a se chamar Institutos Federais de Educação, Ciência e Tecnologia. Foram criados pela Lei nº 11.892, de 29 dezembro de 2008, através do Ministério da Educação (MEC). Nos dez anos seguintes, a expansão dessas instituições foi significativa e transformou a vida de milhões de jovens e adultos, principalmente da classe trabalhadora, que conseguiu ingressar na educação profissional e superior. Em 2018, já são 644 campi que funcionam em 568 municípios brasileiros, com mais de um milhão de estudantes matriculados e cerca de 80 mil servidores, entre professores e técnico-administrativos.

Nessa década de história, os IFs se consolidaram como uma rede de educação profissional, científica e inclusiva, através de um modelo inovador de educação e de gestão que busca diminuir, sobretudo, as desigualdades sociais por meio da educação gratuita, técnica e superior. As instituições promovem a pesquisa aplicada, a inovação tecnológica e uma série de projetos sociais para levar ensino às minorias. Pró-Reitor de Ensino do Instituto Federal de Pernambuco, Assis Leão da Silva contextualiza o histórico de conquistas do IF e sua função social que tornou os centros de estudos mais democráticos.

Arte: Reprodução/Rede Federal

“No caso do Instituto Federal, em particular de Pernambuco, temos um destaque do alcance da política de educação profissional e educação superior junto a essas minorias. Os quilombolas, os indígenas, a população LGBT, as populações em condições de vulnerabilidade social e econômica, através da nossa política de assistência social e de cotas. Eu cito o nosso campus Pesqueira, que é onde se concentra o maior número de indígenas do país. Isso nos proporciona um alcance social muito grande, de pessoas que jamais teriam a oportunidade de estudar educação profissional e muito menos educação superior. Existem campus nossos com o raio de alcance de até 55 municípios e com moradia e refeitório. Dessa forma, a gente proporciona estudo para essas populações de forma verticalizada”, destaca Assis.

A principal estratégia adotada pelo IF para disseminar e desburocratizar o acesso a educação técnica e tecnológica para diversos locais do país foi apostar em campi descentralizados e com autonomia financeira para atender às particularidades de cada região de forma singular. A ideia era que pessoas que não poderiam se mudar de sua região para estudar nas cidades grandes fossem contempladas com instituições mais próximas ou até mesmo em seu município. A interiorização dos institutos federais representou na prática a inclusão de milhares de pessoas que antes estavam apenas à margem.

Na visão de Assis Leão, a estrutura multicampi e o processo interiorização dos IFs foi uma conquista muito importante para a história da educação brasileira. “Isso proporcionou o avanço no ensino profissional de qualidade e essa oferta permitiu também o acesso a segmentos historicamente excluídos dessa modalidade de ensino, tanto na educação profissional, quanto na superior. Os institutos possuem uma maior inserção territorial do que as próprias universidades públicas, porque na maioria dos casos, elas estão nas grandes cidades e nos centros urbanos. Já os IFs estão fixos em locais de pequeno e médio porte, como é o caso do Instituto Federal de Pernambuco (IFPE), com unidades de ensino no Sertão, Agreste e Zona da Mata, além do Recife”, complementa o pesquisador.

Para ele, o grande desafio agora é garantir a permanência desses alunos, já que o acesso tem sido viabilizado pelas políticas sociais. “Devemos investir em atividades de reforço, atividades pedagógicas, de nivelamento, para essas populações que estavam excluídas do processo de educação profissional e superior. Além disso, é preciso que haja o investimento pesado do instituto federal na criação e ampliação de bibliotecas e acervo para garantir a cultura de estudo. Dessa forma, vamos unir a qualidade e permanência desses estudantes em nossa instituição. Tendo a infraestrutura resolvida e a política de acesso garantida, a tendência nos próximos anos é a consolidação dessa qualidade educacional”, garante.

Além da inclusão dessas camadas mais pobres da população no ensino técnico e superior, a interiorização também gerou a criação de vários campos do conhecimento na educação. “O ganho na variação de cursos foi muito grande por causa da descentralização e funcionalidade de cada região de forma independente. Uma série de cursos de licenciaturas, bacharelados e tecnólogos foi montada, além da política de assistência estudantil como projeto pensado para o acesso dos estudantes, a permanência e o êxito”, afirma.

Além das políticas de inclusão, um dos pilares importantes dos institutos federais é a função social que o aluno após formado deverá prestar à sociedade. Na essência do projeto dos IFs, todos os cidadãos formados nas modalidades de ensino que são ofertadas são fundamentados nos valores humanos da igualdade, solidariedade, ética, competência, atuação solidária no mundo do trabalho e gestão do seu conhecimento, sobretudo nas áreas da sua atuação profissional.

Seguindo o pesquisador Leonardo Boff, esses ambientes de aprendizado têm o papel de servir à população e possuem o poder da transformação da realidade já existente. No caso dos IFs, projetos de extensão são desenvolvidos para que a população tanto local, como nacional seja beneficiada dos estudos e pesquisas realizadas nas instituições públicas. Para diminuir a distância entre o ambiente acadêmico e a sociedade, torna-se cada vez mais necessário que as atividades de pesquisa desenvolvidas pela instituição sejam planejadas de acordo com as características de cada região, por exemplo, servindo assim, para criar uma “utilidade social” à instituição.

Na série jornalística “Além da técnica: a função social dos Institutos Federais”, esta matéria e mais quatro reportagens produzidas pelo LeiaJá contam a história dos dez anos dos Institutos Federais de Educação, Ciência e Tecnologia, traçando um paralelo entre a contribuição dos projetos de extensão das instituições e o respaldo na sociedade, seja na forma de inclusão de classes mais baixas na educação, como também no benefício direto da população pelas pesquisas realizadas nos institutos.

Confira, a seguir, um resumo das matérias e os links que direcionam para os textos multimídia na íntegra:

Segunda reportagem: Do campo ao campus: conheça a trajetória de José. A reportagem conta a história de José Marques, filho de agricultores que em 2015 foi aprovado em primeiro lugar, nas vagas reservadas a moradores de Zona Rural, no vestibular para cursar agronomia no Instituto Federal de Pernambuco (IFPE), no campus de Vitória de Santo Antão, Zona da Mata do Estado. Confira detalhes na reportagem.

Terceira reportagem:  Sons da inclusão: grupo cria óculos 3D para cegosInspirados na condição de vida dos morcegos e na ecolocalização, professores e estudantes criaram um óculos 3D capaz de fazer com que cegos sintam os ambientes físicos ao redor. Por meio de sensores que transformam em sons a distância entre os deficientes visuais e os obstáculos, o projeto, batizado de Synesthesia Vision, busca mais autonomia na mobilidade dos usuários. Confira detalhes na reportagem.

Quarta reportagem: IFs: tecnologia assistiva a serviço da qualidade de vida. A reportagem versa sobre o empenho da equipe de tecnologia assistiva de um Instituto Federal em desenvolver dispositivos que melhorem a qualidade de vida e o tratamento de pessoas acometidas pela doença de Parkinson. Confira detalhes na reportagem.

Quinta reportagem: Dez anos dos IF’s: uma Coreia dentro do ensino brasileiro. A reportagem resgata a história do ensino técnico no Brasil e a trajetória da Rede Federal até a criação dos Institutos Federais. Agora, eles batalham com o orçamento reduzido para manter sua expansão. Confira detalhes na reportagem.

Expediente da série:

Reportagens: Nathan Santos; Eduarda Esteves e Marília Parente 

Edição de textos: Nathan Santos 

Repórteres fotográficos: Chico Peixoto, Rafael Bandeira e Júlio Gomes.

Edição de vídeos: Jr. Oliveira

Artes: João de Lima

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