Conheça o tareco: tradição da culinária pernambucana

A fama do biscoito doce rendeu a ele o título da canção ‘Tareco e Mariola’, do compositor Petrúcio Amorim

por Eduarda Esteves qui, 31/08/2017 - 11:07
Chico Peixoto/LeiaJáImagens Chico Peixoto/LeiaJáImagens

A diversidade da gastronomia popular de Pernambuco é capaz de deixar qualquer um com água na boca. Dentre a infinidade de comidas regionais, um biscoito doce de forma arredondada, cor amarelada e com a consistência firme se destaca pela simplicidade e sabor. Conhecido como "tareco" entre os pernambucanos, a iguaria é feita basicamente com ovos, açúcar e farinha de trigo. É encontrada em padarias, lojas de doces, na beira das estradas que ligam a capital ao interior do estado e até em barraquinhas mais simples no Centro da cidade.

Não há um consenso sobre a origem do tareco, mas pesquisadores argumentam que provavelmente surgiu em Pernambuco e ganhou o Nordeste ao longo dos anos. Na Bahia, por exemplo,  a comida é conhecida por “biscoito paciência” e segue uma receita semelhante ao consumido em Pernambuco. A fama do tareco é tão grande que a iguaria deu título à canção ‘Tareco e Mariola’, do compositor Petrúcio Amorim.

Seja pelas receitas tradicionais das avós, nos lanches feitos em padarias acompanhados de café ou no consumo durante uma viagem para o interior do estado, quase todo pernambucano já comeu tareco. O biscoito tem muitos anos de história, mas por causa da carência de fontes, pouco se sabe sobre quando começou a ser vendido em Pernambuco. De acordo com o professor de gastronomia João Lima, a culinária do Estado sofre direta influência dos portugueses, africanos e indígenas, mas o tareco parece ter surgido de um “erro de culinária”.

“Muitas coisas na gastronomia nasceram de alguns erros, como o brownie e o petit gateau. Acho que o tareco pode ter alguma história semelhante, justamente porque a receita é parecida com a de um bolo, mas sem o fermento. Talvez, a primeira pessoa pode ter esquecido do fermento e aí se originou o tareco como conhecemos hoje”, explica.

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Tradição no Recife

No bairro da Boa Vista, a padaria Santa Cruz, uma das mais antigas da cidade e com mais de cem anos de história, vende o biscoito pelo menos desde o ano de 1959. O responsável pela produção da iguaria há 17 anos é o pasteleiro Jairo da Costa. Atento aos procedimentos do preparo, ele conta que aprendeu a cozinhar o biscoito quando veio trabalhar na padaria, mas antes do ofício já gostava de comer o tareco durante a infância. De acordo com Fidelis Amorim, dono do estabelecimento, são produzidos 40kg do biscoito por mês e as vendas continuam fortes após anos.

Na Padaria Imperatriz, também no bairro da Boa Vista, a produção do tareco é uma tradição e a responsabilidade  fica por conta do pasteleiro Genival de Amorim, o funcionário mais antigo da casa, desde 1969. “Aprendi a fazer o tareco com a primeira pasteleira da padaria. Acho que ao longo dos anos a produção caiu um pouco porque hoje em dia nem todo mundo conhece o biscoito, mas a tradição ainda é forte, principalmente entre os mais velhos”, conta.

Para ele, não tem um segredo para se fazer a massa do biscoito, mas o cozinheiro tem que estar atento as medidas corretas dos ingredientes. A produção leva cerca de vinte minutos, entre o preparo da massa e o processo no forno. Quem retira os biscoitinhos quentes do fogão insdutrial é o ajudante de pasteleiro João Batista, funcionário da Padaria Imperatriz. Ele conta que sua família adora quando ele leva tareco para casa, principalmente as crianças. “Não sei se a moda voltou entre os mais novos, mas meu filho adora levar para lanchar na escola”. 

O tareco é tão querida em Pernambuco que além da fabricação manual para quantidades menores, existem fábricas que vendem o biscoito em larga escala. Em Bezerros, no Agreste do Estado, a fábrica ‘Produtos Matinal’ produz o biscoito há dez anos em escala industrial. De acordo com Pedro Guaraná, idealizador da empresa, o tareco é feito em uma máquina de pingadeira para biscoitos e pode seguir mais de uma receita.

“As receitas podem variar dependendo do equipamento, manual ou industrial, e do público que se quer atingir. Nossa empresa produz o tipo popular, o que mais vende, e um mais rico na receita, com leite e ovos, para um público mais exigente”, explica.

Como uma forma de preservar a cultura, anualmente no mês de junho, há oito anos, é realizada em Caruaru, no Agreste de Pernambuco, a ‘Festa do Tareco e Mariola’, no bairro de Vassoural. Este é um dos eventos da tradicional Festa das Comidas Gigantes da cidade. Ao som de muito forró, a população sai em caminhada pelo bairro e no fim se deliciam com mais tarecos gigantes de 50 centímetros, além demais de 30kg do biscoito distribuídos em saquinhos menores.

Para o professor João Lima, é inegável que o tareco traz uma série de lembranças nostálgicas da infância e sua preservação representa a resistência da culinária nordestina. “A gastronomia faz parte da nossa identidade e dos nossos hábitos. Um povo sem a preservação da história de seus alimentos não tem cultura”.

Fotos: Chico Peixoto/LeiaJáImagens

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