Caso da AstraZeneca relança debate sobre anticoncepcional
No caso das pílulas, o risco de trombose é conhecido e levado em consideração na hora da prescrição. No entanto, esse não é o caso da vacina AstraZeneca, que é um produto novo
Por que suspender a vacina anticovid da AstraZeneca por medo de trombose, mas não certas pílulas anticoncepcionais, para as quais esse risco é comprovado? A comparação aumenta entre o público em geral, mas os especialistas a rejeitam, porque o estágio do conhecimento é muito diferente.
Há "dois pesos e duas medidas", denunciou nesta quarta-feira (17) a Avep (Associação Francesa de Vítimas de Embolia Pulmonar e AVC relacionados à contracepção hormonal).
Esta associação "se espanta com a indiferença com que milhares de mulheres vítimas de trombose e embolia são tratadas por causa de sua contracepção na França e na Europa". Muitas mensagens semelhantes foram postadas nas redes sociais nos últimos dias.
"Acho que não podemos misturar", respondeu à AFP a especialista em doenças infecciosas Odile Launay, membro do comitê de vacinas contra a covid criado pelo governo francês.
Como sempre, quando se trata de medicamentos, a questão central é a relação risco-benefício, ou seja, se as vantagens superam as desvantagens.
No caso das pílulas, o risco de trombose é conhecido e levado em consideração na hora da prescrição. No entanto, esse não é o caso da vacina AstraZeneca, que é um produto novo.
"Devemos absolutamente especificar a relação risco-benefício" da vacina, destaca a professora Launay.
- Bula -
"A trombose, que pode ser fatal, é conhecida por ser um efeito colateral muito raro das pílulas anticoncepcionais. É mencionada na bula de informações ao paciente", explica o instituto médico Paul-Ehrlich, que assessora o governo alemão.
"Cada mulher deve ser informada desse risco pelo médico que prescreve a pílula", continua o instituto em um documento bastante educativo sobre a vacina AstraZeneca divulgado na terça-feira.
A situação é diferente no caso desta vacina, para a qual "atualmente se suspeita que pode haver um efeito colateral muito raro e às vezes fatal, a trombose venosa cerebral (coágulos de sangue no cérebro) acompanhada por um déficit de plaquetas" , acrescenta o instituto Paul-Ehrlich.
Por enquanto, não há evidências de que haja uma ligação entre a vacina e esses problemas muito raros. A autoridade europeia de medicamentos EMA, que continua "firmemente convencida" dos benefícios da vacina, deve voltar a se pronunciar na quinta-feira, após análise dos dados transmitidos pelos vários países.
Nesse intervalo, vários suspenderam a vacina.
Mas mesmo que esta ligação seja confirmada, a EMA e as autoridades de saúde em cada país ainda poderiam decidir que "a vacina pode continuar a ser usada, embora possa causar este efeito colateral muito raro (adicionando-o, se necessário, nas instruções)", conclui o instituto Paul-Ehrlich.
Nesse caso, as autoridades de saúde estimam que a relação risco-benefício continua a se inclinar em direção à vacina.
- AVC -
Essa é a posição adotada em relação às pílulas, ou "anticoncepcionais orais combinados" (AOC), apesar do comprovado risco de trombose, em particular com as mais recentes (chamadas de 3ª ou 4ª geração).
"Os benefícios dos AOCs continuam a superar os riscos", explica a EMA em sua página dedicada a esses medicamentos.
Além de citar o risco, a bula aponta os fatores que podem agravá-lo, como idade, tabagismo, histórico familiar ou obesidade.
De acordo com a EMA, os médicos devem "considerar os fatores de risco individuais ao prescrever anticoncepcionais" e cada mulher deve "discutir com seu médico para determinar o tipo de contracepção mais adequado".
Vários estudos têm mostrado nos últimos anos que as pílulas mais recentes aumentam o risco de acidentes por trombose venosa.
De acordo com um estudo britânico de 2015, o risco pode ser duplicado em comparação com mulheres que tomam pílulas mais antigas e quadruplicar em comparação com aquelas que não tomam a pílula.
Mulheres vítimas desses acidentes entraram com ações judiciais. Um dos casos emblemáticos é o da francesa Marion Larat, gravemente incapacitada após um AVC em 2006 que atribui à pílula Méliane, da farmacêutica alemã Bayer.