Antropólogo associa comportamento das TO's às represálias

Eduardo Araripe Pacheco de Souza acredita que o Estado precisa dar "punições enérgicas"

por Carol Dias ter, 06/05/2014 - 06:00
Ascom UFPE/Divulgação Eduardo Araripe Pacheco de Souza, é mestre em Antropologia pela UFPE Ascom UFPE/Divulgação

"As torcidas agem de acordo com o grau de represália que estão sofrendo". Esta é a opinião do mestre em Antropologia Eduardo Araripe Pacheco de Souza, que analisou por dois anos as TO's. O professor da UFPE avalia a morte do torcedor do Sport, Paulo Ricardo Gomes da Silva, 26 anos, após o jogo entre Santa Cruz e Paraná, no estádio do Arruda. Para o estudioso, a reação das autoridades públicas deverá ser o divisor de águas para a reeducação ou a intensificação de violência nas torcidas uniformizadas em Pernambuco.

Sobre a melhor medida a ser tomada, Eduardo Araripe Pacheco de Souza acredita que se não forem tomadas atitudes enérgicas sobre este assunto o efeito poderá ser potencialmente negativo. "A proliferação de mais violência em detrimento deste último caso dependerá exclusivamente da postura adotada em relação à punição dos culpados. Se forem encontrados e punidos severamente pode ser que tenha um efeito positivo", declarou. E explicou: "No sentido de que outras pessoas passem a repensar os atos antes de cometê-los. Caso não aconteça algo enérgico, ou se os culpados não forem encontrados, o temor maior será a represália em outras torcidas.​"

Ainda de acordo com o antropólogo, as principais tragédias que envolvem as torcidas unformizadas não são realizadas durante os 90 minutos de jogo. "A violência das organizadas são acometidas principalmente fora dos estádios. Este caso que aconteceu foi bem atípico. Dentro dos estádios elas são contidas, porque existe uma força maior como o policiamento, e até mesmo a estrutura fechada. Nas ruas, eles agem como se fossem os donos. A violência deste fim de semana transbordou os limites"

O antropólogo foi bastante enfático também sobre a rivalidade entre as uniformizadas. "​Devemos lembrar que da mesma forma que a uniformizada do Sport tem ligação direta com a torcida do Paraná, a do Santa Cruz também é aliada da organizada da Bahia", avisou. E avisou, como que em mais uma pedra cantada: "Se a postura adotada não for a correta, quem garante que os torcedores não irão se infiltrar em outras organizadas para cometer um grande ato de vandalismo?​ O poder p​ú​blico tem que estar atento. ​Os atos dependerão muito do que será feito."

Eduardo Araripe Pacheco de Souza lamenta o que ocorreu, mas também acredita que, às vezes, só uma tragédia é capaz de gerar mudanças em problemas de convívio social. "Espero que aproveitem esse momento para que os bons torcedores possam vir à tona e dar o seu exemplo. Atualmente, os estádios são apenas para os jogadores. A torcida prefere ficar em casa, e essa atitude já vem sendo manifestada naturalmente. Os horários dos jogos tardios, as torcidas organizadas nos estádios e a violência fazem com que ninguém queira mais ver um jogo de futebol", comenta.

Sobre banir torcidas uniformizadas dos estádios, o especialista não acredita que seja a melhor opção. "Atualmente, o Nordeste tem se destacado, de forma ruim, no cenário das cidades mais violentas relacionadas a torcidas organizadas. A mera proibição e extinção das TO's não promete que a violência seja extinta. Quem garante que os grupos e torcedores que estão envolvidos em atos de vandalismos irão acabar? Os componentes continuarão frequentando os estádios, independente se em organizadas ou não."

As torcidas uniformizadas não podem ser analisadas isoladamente, sem levar em conta suas raízes e contexto social, como esclareceu o antropólogo." É importante registrar que, enquanto a violência das torcidas for tratada meramente como um ‘caso de polícia’, nós vamos continuar repetindo erros passados, que atribuíam a violência no Brasil à pobreza”, conclui.

Medida preventiva - ​Eduardo Araripe Pacheco de Souza acredita que uma medida importante para combater a violência nos estádios seria o cadastramento dos torcedores. Líderes de organizadas não têm todo o controle dos participantes justamente pela falta do cadastro. A liderança tem contato com os mais presentes. Para se ter uma ideia, qualquer pessoa pode comprar as camisas das organizadas e, em dias de jogos, praticarem crimes, que são associados a elas de uma forma geral. “O anonimato provocado pela falta de cadastramento estimula a violência”, afirma.

Lançamento do livro - O mestre em antropologia Eduardo Araripe Pacheco de Souza lançará o livro Paixão perigosa. Uma etnografia das torcidas do Recife no dia 21 de maio, no Centro de Filosofias e Ciências Humanas da Universidade Federal de Pernambuco. O lançamento acontecerá durante um fórum, em que será colcocado em debate as manifestações culturais e a violência das organizadas. O evento acontece a partir das 9h e a entrada é gratuita.

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