Após casos de intoxicação alimentar no restaurante universitário da Universidade Federal de Pernambuco, campus Recife, ocorrido em setembro de 2023, o relatório da vigilância sanitária aponta falhas na manipulação e armazenamento de alimentos servidos à comunidade acadêmica da instituição. O documento reúne dados coletados dois dias após cerca de 1200 estudantes apresentarem sintomas como vômitos, diarreia e dores abdominais depois do consumo de alimentos servidos pelo RU, que é gerido pela empresa General Goods.
Na ocasião, algumas vítimas precisaram de acompanhamento médico em uma Unidade de Pronto Atendimento (UPA) e um protesto, em frente ao restaurante universitário, que foi reaberto em maio de 2023 após dois anos sem funcionamento, foi realizado para pedir a saída da General Goods e melhorias na qualidade e segurança do serviço de alimentação oferecido à comunidade acadêmica.
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Estudantes realizam ato no RU da UFPE ( Júlio Gomes/LeiaJá/Arquivo)
O relatório aponta problemas como: presença de alguns insetos (moscas) e vestígios de baratas e contaminação por bactérias, alimentos armazenados em embalagens furadas ou sem embalagens, produtos com validade inelegível, carnes expostas, possível vazamento de gás e panelas em estado precário de conservação. Confira o documento na íntegra aqui.
Parte do relatório realizado pela vigilância à saúde do Recife
Estudantes relatam serviços precários e riscos à saúde
Em entrevista ao LeiaJá, a universitária e moradora da Casa do Estudante Ana* relata que o cardápio oferecido pelo restaurante universitário não apresenta variação, principalmente, quem é vegetariano. “Semana após semana costuma ser as mesmas opções de mistura e guarnição, consequentemente, tendo baixa variedade de nutritiva. Os grãos são mal cozidos, gerando má digestão e dores de estômago, os vegetais da guarnição também são mal cozidos, o que pode ser prejudicial, porque alimentos como a batata, por exemplo, precisam ser minimamente cozida para eliminar substâncias que podem ser tóxica. Digo isso pois recorrentemente pego batatas tão duras que parecem cruas”, afirma.
Além disso, a estudante aponta má higienização das verduras e que esses são servidos em um estado ruim de conservação. “O tomates são maduros que estão perto de estar estragado, alfaces já “passados” (sic), com partes pretas”. À reportagem, ela conta que é “recorrente encontrar objetos estranhos na comida, como o pedaço de uma máscara, assim como insetos, larvas, e outros bichos”.
Paula*, que é graduanda do curso de psicologia da UFPE, avalia o serviço prestado pela General Goods como “bem precário, feito sem cuidado e responsabilidade pela empresa que organiza”. A universitária cita que em alguns momentos chegou a não consumir a refeição toda por causa da qualidade. “A qualidade é bem baixa, uma vez ou outra alguma refeição está levemente saborosa, mas maioria das vezes são arroz e feijão requentado de sabe-se lá quantos dias, restos de carnes de outros dias também e as opções vegetarianas são feitas com pouco empenho. Muitas vezes tive que estragar comida, pois estava intragável ou suspeita”.
Ao LeiaJá, Paula* afirma que já presenciou estudantes com dúvidas sobre “o que estavam vendo nos pratos eram larvas ou algum tipo de bicho, eu mesma já estive nessa posição e normalmente, tanto eu como as pessoas que convivo, descartam a comida quando estranham algo. Já encontrei cabelo na comida, o qual claramente não era meu ou de qualquer pessoa que estivesse almoçando comigo”, frisa.
O que diz a UFPE
Procurada pela reportagem, a Universidade Federal de Pernambuco (UFPE), através da Superintendência de Comunicação, salientou que a nota emitida no início de dezembro destaca que “a empresa [General Goods] cumpriu com adoção de medidas corretivas relativas ao controle da potabilidade da água, no manejo de resíduos sólidos, na seleção de fornecedores, armazenamento de alimentos e higienização do local, equipamentos e utensílios. Mantendo, portanto, a licença sanitária até dia 15 de setembro de 2026”.
No comunicado, a instituição de ensino salienta que, antes da divulgação do laudo da vigilância, “a UFPE tomou medidas administrativas para ampliar as ações de fiscalização e acompanhamento do serviço no restaurante. O quadro de nutricionistas da equipe técnica da instituição foi ampliado, assim como o apoio de profissionais especialistas na área de saúde e alimentos no apoio à comissão de acompanhamento, que conta também com representação estudantil. A empresa General Goods também ampliou seu quadro e fez substituições do responsável técnico”.
A Superintendência de Comunicação da UFPE também reforça que, apesar das falhas apontadas, o relatório finaliza esclarecendo que “em 18/12/2023, foi realizada inspeção sanitária pela equipe VISA DS/IV, e foi constatado que as exigências feitas anteriormente foram cumpridas e continuam sendo mantidas as boas práticas de higiene e manipulação de alimentos”.
General Goods e casos de intoxicação alimentar
Este não é o primeiro episódio de intoxicação alimentar envolvendo a General Goods. Em março de 2022, 60 estudantes da Escola Técnica Estadual Luiz Alves Lacerda, no Cabo de Santo Agostinho, Região Metropolitana do Recife, tiveram mal-estar após a merenda, de responsabilidade da terceirizada. Na época, a empresa alegou que não houve irregularidades nas refeições servidas na instituição. A empresa foi escolhida após processo licitatório e a contratação da terceirizada foi publicada no Diário Oficial, em março de 2023
. No episódio de intoxicação alimentar, ocorrido em setembro deste ano na UFPE, a reportagem questionou Fernando José do Nascimento sobre a contratação da General Goods, diante de uma caso semelhante no Estado, após todo o processo de licitação realizado pela UFPE. O pró-reitor afirmou que todos os documentos solicitados à empresa foram entregues e não havia nenhuma sinalização sobre o caso ocorrido no Cabo de Santo Agostinho.