Jobson sonha com a volta ao futebol na várzea do Pará
Ex-jogador do Botafogo tenta retomar a carreira depois de uma das trajetórias mais polêmicas e conturbadas do futebol recente
Conceição do Araguaia, cidade distante 979 quilômetros de Belém, no Pará, costuma receber alguns poucos turistas interessados em conhecer a região onde militantes do Partido Comunista enfrentaram a ditadura militar na "Guerrilha do Araguaia" no início dos anos 70. No futebol, a cidade pequena, de 50 mil habitantes, que vive do plantio de abacaxi, milho e arroz, quer entrar para a história com a recuperação física e emocional do atacante Jobson, seu filho mais famoso.
É lá que o ex-jogador do Botafogo tenta retomar a carreira depois de uma das trajetórias mais polêmicas e conturbadas do futebol recente. Só para ficar nos fatos mais importantes, Jobson foi suspenso por dois anos pelo uso de cocaína em 2009, foi parar na delegacia acusado de agredir a mulher em 2013, foi preso por dirigir embriagado neste ano e está suspenso até 2019 por se negar a fazer exame antidoping quando jogava na Arábia Saudita.
Agora, ele decidiu começar do começo. Bem do começo mesmo. Atualmente, o atacante disputa um campeonato de futebol amador organizado pela Liga Esportiva de Conceição do Araguaia (Leca). Ele mesmo batizou seu time como Botafogo de Emerêncio, homenagem ao clube que defendeu até junho. Emerêncio é o bairro onde ele nasceu.
Os "parças" de Jobson são amigos de infância, vizinhos, parentes - a maioria do time -, além de jogadores que sonham com uma chance no profissional e até ex-atletas. Um deles é o volante Elson, que atuou no Palmeiras, Cruzeiro e Sttutgart (Alemanha). "O pessoal marca pesado. A gente pensa que o futebol amador tem muita diferença do profissional, mas a pegada é a mesma", disse o jogador aos 27 anos.
Everaldo Lisboa, presidente da Leca, afirma que o atacante ainda está em forma. "Ele é um jogador diferenciado. Em qualquer campo. Precisa ver ele batendo falta", contou o dirigente, que também foi o primeiro treinador de Jobson.
Jobson quer se manter em forma porque ele tem uma chance real de voltar aos gramados no ano que vem. Seus advogados entraram com um recurso no CAS (Corte Arbitral do Esporte), na Suíça, pedindo uma anulação da extensão da punição de quatro anos. O julgamento será no mês de janeiro e o veredicto deve ser conhecido em 60 dias. "Estamos otimistas. É um caso difícil, mas temos chances", afirmou Bichara Neto, advogado do jogador.
Trocando em miúdos, a defesa do jogador argumenta que a punição por se negar ao fazer o antidoping deve ser válida apenas no território da Arábia Saudita e não no mundo todo. Com isso, ele poderá atuar no Brasil. O principal argumento é que a suspensão do Al-Ittihad foi na verdade um retaliação pela cobrança que o jogador fez na Fifa em relação a salários atrasados. O clube saudita tem força nos bastidores da entidade. "O caso tem algumas peculiaridades. Pode ter sido uma forma de pressioná-lo", disse o defensor.
O jogador está otimista. Decidiu participar do torneio para manter a forma quando tiver o aval da Fifa para voltar. Ele também faz exercícios físicos em uma academia da cidade e planeja voltar a morar no Rio no ano que vem para recuperar a forma no próprio Botafogo. Paralelamente, trabalha para melhorar sua imagem e tem participado de jogos beneficentes com frequência. No contato com a reportagem pediu para não comentar o caso na Fifa. "Estou até frequentando a igreja", contou, sem entrar em detalhes.
O Botafogo ainda está com o freio de mão puxado até o último dente nessa questão. Embora não exista um contrato entre as duas partes - ele terminou em junho e não poderia ser renovado por causa da suspensão imposta pela Fifa -, existe um ligação afetiva entre o clube e o atleta. O clube cedeu os uniformes de treino para o time de Emerêncio, mas não quer queimar seu filme com a Fifa. "O Jobson não tem relação com o Botafogo. O contrato acabou em junho e, enquanto houver a punição da Fifa, ele não pode nem frequentar as dependências do clube. Nem no Botafogo nem em qualquer agremiação", disse o presidente Carlos Eduardo Pereira. "Quando acabar a punição, aí é outra história", desconversou.
Por enquanto, o campeonato de Jobson é a Copa Primavera. O estádio Carecão, que tem capacidade para cinco mil pessoas, fica quase cheio para os jogos. Combatente, Cruzeiro, Canudinho, Carajás e Leãozinho são alguns dos times que lutam, todos contra todos, em turno único, para chegarem à final, no dia 12 de dezembro.
Os jogos são pegados mesmo, correria e alguns lances de efeito. O atacante ainda é rápido e habilidoso como em 2009, seu auge. Ele se sente em casa e acredita que voltar a Conceição do Araguaia, que já foi a terra da guerrilha, foi o melhor remédio para colocar a cabeça em paz.