Império econômico de Trump ameaçado pela Justiça

Ex-presidente poderá perder o controle de parte do seu império por inflacionar repetidamente o valor dos seus ativos e ter mentido aos bancos

qui, 28/09/2023 - 12:58
ANDREW CABALLERO-REYNOLDS Ex-presidente dos EUA e candidato nas primárias republicanas, Donald Trump, em Washington, em 15 de setembro de 2023 ANDREW CABALLERO-REYNOLDS

Donald Trump lançou a sua carreira política depois de fazer fortuna no setor imobiliário, mas agora que ambiciona retornar à Casa Branca, poderá perder o controle de parte do seu império por inflacionar repetidamente o valor dos seus ativos e ter mentido aos bancos.

Antes do início de um julgamento civil na segunda-feira contra a empresa familiar Trump Organization e sua equipe sênior, incluindo Donald Trump e seus filhos Donald Trump Jr e Eric Trump, o juiz da Suprema Corte do estado de Nova York, Arthur Engoron, deu razão parcialmente à procuradora Letitia James, que iniciou o processo judicial neste caso.

Em uma resolução contundente, o magistrado considera que houve "fraude continuada" e descreve um sistema de supervalorização de ativos relacionados, por exemplo, com a emblemática Trump Tower em Nova York e outras propriedades do grupo – de "812 milhões e 2,2 bilhões de dólares (4 bilhões de reais e 11 bilhões de reais, na cotação atual)" – para negociar empréstimos mais vantajosos com os bancos.

Entre as consequências, ordenou o cancelamento das licenças comerciais de Donald Trump e dos seus filhos no estado de Nova York e pediu às "partes' que propusessem "liquidatários" encarregados de gerir a "dissolução das empresas" em questão.

As empresas afetadas pela denúncia da procuradora-geral controlam alguns dos carros-chefe do bilionário republicano, como a Trump Tower, os seus restaurantes e lojas na prestigiada 5ª Avenida de Manhattan e o arranha-céu quase centenário de Wall Street, no distrito financeiro, que segundo o juiz Engoron foi supervalorizado em "mais de 300 milhões de dólares (1,5 bilhão de reais na cotação atual).

- "Nacionalização" -

"Essa decisão simplesmente põe fim à possibilidade de Trump fazer negócios no estado de Nova York", resume o ex-procurador de Nova York e professor de direito da Pace University, Bennett Gershman.

"Os liquidatários vão gerir os ativos. Isso significa que Trump e a sua organização não poderão fazê-lo", portanto perderão o controle, acrescenta à AFP.

A equipe de Trump anunciou que irá recorrer da decisão judicial, o que surpreendeu muitos especialistas devido ao seu alcance. Para um de seus advogados, Chris Kise, o juiz Engoron quer "nacionalizar um dos impérios corporativos mais prósperos dos Estados Unidos e assumir o controle da propriedade privada, mesmo reconhecendo que não há evidências de falta de pagamento, inadimplência, pagamentos atrasados ou reclamação de danos".

Os advogados de Trump também apresentaram recursos para tentar atrasar o julgamento e reduzir o seu alcance.

Há muita coisa em jogo para o bilionário republicano de 77 anos, que quer regressar à Casa Branca em 2024, e para o seu grupo familiar. Segundo a revista Forbes, em março de 2023, os bens imobiliários em Nova York representavam 720 milhões de dólares (3,6 bilhões de reais na cotação da época) da fortuna do ex-presidente (de um total de 2,5 bilhões de dólares, 12,8 bilhões de reais na mesma cotação).

Fora de Nova York, a Trump Organization está presente em hotéis de luxo, clubes de golfe e clubes privados, como a residência Mar-a-Lago em Palm Beach, Flórida.

- "Golpe duro" -

Para Will Thomas, professor adjunto de Direito Empresarial da Universidade de Michigan, ainda há muitas incógnitas após esta primeira decisão, até porque "os liquidatários vão esperar pelo resultado do julgamento" antes de agir.

Embora o juiz tenha decidido parcialmente a favor da procuradora-geral, ainda deve haver um julgamento para decidir as possíveis sanções financeiras, já que James pede 250 milhões de dólares (1,2 bilhão de reais na cotação atual) em indenizações em nome do Estado de Nova York.

Seja como for, a decisão do juiz Engoron, descrito como "perturbado" pelo ex-presidente dos Estados Unidos (2016-2020), representa "um golpe simbólico na história que Donald Trump conta sobre si mesmo como empresário", acrescenta o acadêmico.

"Sabíamos, mesmo antes de ser presidente, que Donald Trump valorizava a sua riqueza como um símbolo do seu talento", lembra o professor. "E o que vimos (na terça-feira) é que um tribunal declarou que não havia dúvidas de que Donald Trump mentiu sistematicamente sobre a sua riqueza, em enormes proporções, de centenas de milhões a bilhões de dólares", acrescenta.

Donald Trump enfrenta acusações criminais em vários outros processos judiciais importantes, incluindo acusações de tentar anular o resultado das eleições presidenciais de 2020, mas continua sendo o favorito nas pesquisas para as primárias republicanas.

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