Relatório mostra repressão da ditadura militar no Pará
Documento final da Comissão Estadual da Verdade sobre o golpe de 1964 será apresentado nesta sexta-feira (31), em sessão solene na Assembleia Legislativa do Estado, em Belém
Histórias da repressão no regime militar de 1964 no Pará são resgatadas no "Relatório Final Paulo Fontelles Filho" que será apresentado em sessão solene nesta sexta-feira, 31 de março, no auditório João Batista, na Assembleia Legislativa do Estado do Pará (Alepa), às 10 horas. O documento é formado por uma coleção de três obras, divididas em Tomos I, II e III, e apresenta distintas dimensões sobre os Direitos Humanos e a Ditadura Civil-Militar.
O Tomo I apresenta os antecedentes históricos da Comissão Nacional da Verdade (CNV) e a luta pela criação da Comissão Estadual da Verdade do Pará (CEV-Pará). O primeiro documento também faz uma breve contextualização da política paraense.
Já o Tomo II contempla a imprensa paraense na ditadura. Enquanto o Tomo III é composto por um capítulo que trata de Ditadura e Gênero, relacionado ao debate sobre Justiça de Transição (situação atual, sugestões para efetivação nacional, repercussões no Estado do Pará e as recomendações).
Segundo o deputado estadual Carlos Bordalo (PT), presidente da Comissão de Direitos Humanos e Defesa do Consumidor da Assembleia Legislativa do Estado do Pará (Alepa), a Comissão Estadual da Verdade foi instalada a partir de lei estadual enviada pelo Executivo. “Ela foi designada legalmente para investigar e levantar o contexto do regime militar em território paraense e seus significados para a construção e formação democrática no exercício da cidadania paraense”, explica o parlamentar.
A Comissão, que foi instalada em 1° de setembro de 2014, desenvolveu investigações em três frentes. Foram as Comissões Estaduais da Verdade do Jornalista, da Universidade Federal do Pará (UFPA) e Camponesa.
“Ela desenvolveu atividades que foram desde oitivas (que são atos extrajudiciais em que testemunhas e acusados são ouvidos sem a presença de advogado) com ex-governadores, ex-deputados, como também líderes sindicais cassados no período da ditadura, com torturados políticos do período da ditadura. Foram também levantadas informações da imprensa do período”, diz Carlos Bordalo sobre a Comissão.
Vítimas do regime
As informações investigadas pela CEV-Pará estão reunidas nos três volumes do Relatório Final da Comissão da Verdade e Memória do Estado do Pará. Esse é o último documento oficial que narra, com detalhado registro documental, as graves violações aos direitos humanos cometidas durante o regime militar na Amazônia paraense.
Histórias como a de Virgílio do Sacramento, liderança rural assassinada nos anos 80, do escritor e jornalista Benedito Monteiro, das ex-presas políticas Isa Cunha e Hecilda Veiga e o assassinato do deputado estadual João Batista estão entre os casos violentos do período que constam na obra.
A data escolhida para o lançamento do Relatório marca os 59 anos do golpe militar de 1964. Para além do dia do evento, o título também carrega grande significado. “O ativista político Paulo Fonteles Filho (morto em 2017) junto com o doutor Egídio Sales Filho, que também já faleceu, foram os dois expoentes maiores da mobilização e da construção do projeto da Comissão Estadual da Verdade”, explica o deputado Bordalo.
“Homenagear Paulo Fonteles Filho é homenagear esse esforço, mas também a tradição, a luta deste ativista e do seu pai Paulo Fonteles”, continua o parlamentar. O pai do ativista que dá nome ao Relatório Final foi assassinado por pistoleiros em 1987 por conta das lutas políticas em prol dos camponeses e da reforma agrária no Pará.
Fio da História
O presidente da Comissão de Direitos Humanos explica ainda a importância de que documentos como o Relatório Final cheguem ao conhecimento da sociedade. “Cada vez que um acontecimento histórico vai se distanciando das gerações presentes é muito importante que esse fio condutor histórico seja oferecido para as gerações do presente compreenderem e entenderem os significados da história”, diz o deputado.
A publicação do documento, de acordo com Carlos Bordalo, é uma maneira de fazer com que as memórias dos chamados “Anos de Chumbo” não sejam esquecidas e evitem que propostas ditatoriais virem realidade novamente. “É fundamental que a memória e a justiça sejam constantemente relembradas para que nunca mais se repitam etapas sombrias, nebulosas”, completa o parlamentar.
O deputado ainda acrescenta a necessidade do apoio ao regime democrático. “Sem democracia não é possível construir justiça social; não é possível pensar-se num país menos desigual, no respeito aos direitos fundamentais, porque qualquer projeto que tem que se viabilizar fora da democracia é antagônico à ideia de uma sociedade plural, democrática, de uma sociedade que lida bem com a sua própria diversidade”, diz Bordalo.
A publicação do Relatório foi feita pela Imprensa Oficial do Estado do Pará (IOEPa), por meio da Editora Pública Dalcídio Jurandir, com recursos de emenda parlamentar do deputado estadual Carlos Bordalo e da ex-deputada estadual Marinor Brito. Os 300 exemplares impressos serão enviados com prioridade para as Bibliotecas Públicas do Estado e para outras de referência nacional. A obra estará disponível na íntegra, para o público em geral, no site do Poder Legislativo do Estado e da Sociedade Paraense de Direitos Humanos.
Por Maria Clara Passos, Victor Sampaio e Beatriz Rodrigues (sob a supervisão do editor prof. Antonio Carlos Pimentel).