Lixo e mau cheiro já são parte do Centro do Recife

“No dia de sol o Recife acordou com a mesma fedentina do dia anterior”. Eternizou em "A Cidade", Chico Science e Nação Zumbi

por Jameson Ramos qua, 02/05/2018 - 10:00

“No dia de sol o Recife acordou com a mesma fedentina do dia anterior”. Esse foi um trecho cantado por Chico Science e Nação Zumbi, na música "A Cidade", isso em 1994. Vinte e quatro anos passados, o Recife parece continuar acordando com o mesmo problema do dia anterior. Lixos amontoados em diversos lugares do centro do Recife, fezes e urina pelo chão, praças públicas em estado de abandono e tomadas por pessoas em situação de rua.

Trabalhando no Centro do Recife há 32 anos, estando na rua do Imperador há 20 anos, Luzinete Maria da Silva, de 52 anos, diz que é obrigada a conviver com o mau cheiro cotidianamente. “Aqui se mistura a fedentina do esgoto com o xixi”, já que no edifício que fica bem em frente ao seu ponto comercial, muita gente realiza suas necessidades fisiológicas “a céu aberto”. “É tanto mijo que o suporte de ferro que segurava a porta de vidro do prédio foi corroído”, exclama a comerciante.



A sensação de falta de preservação do Recife parece ser compartilhada por muitas pessoas: desde comerciantes a transeuntes - se mostrando evidente um sentimento de desorganização urbana da capital de Pernambuco. Marcelo Queiroz, 61 anos, acredita que muitos dos “descasos” que acontecem com a cidade tem a ver com o poder público. “Eles só pensam neles, não pensam na cidade e como fazer para melhorar as nossas vidas”, destaca. Marcelo, que chegou no Recife aos cinco anos de idade, vindo da Paraíba, é enfático em dizer que a capital, ao seu ver, não era assim. “Nós éramos umas das mais importantes e lindas cidades do país, depois de São Paulo e Rio de Janeiro. Mas agora o poder público sangra a cidade”.

Por sermos rodeados pelas águas, é evidente que muitos desses lixos, fezes e urinas “descartados” nas ruas e becos da capital pernambucana iriam acabar, uma hora ou outra, tendo os rios como seu “ponto fim”. O vento e as chuvas fortes que caem no Recife levam pelos córregos e canais toda e qualquer coisa que encontrem pela sua frente.



O professor da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE) e urbanista, Tomás de Albuquerque Lapa, acredita que não só o poder público mas também a população tem que ter noção de suas obrigações com a cidade. “É difícil melhorar as condições ambientais se a própria população não tomar consciência de que esses rios são nossos, que a vegetação é nossa; somos nós que temos que tomar conta (do ambiental)”, aponta Tomás.

Corroborando com o que foi dito pelo urbanista,  o lavador de carros Carlos Alberto dos Santos diz: “eu acho que não só o poder público, mas a própria população tem que ter noção de suas obrigações com a cidade. Os próprios recifenses, muitas vezes, são os culpados pelos problemas que a cidade enfrenta”, afirma Carlos, que desde os 10 anos de idade tem a Avenida Guararapes, no centro da capital pernambucana como o seu ponto de trabalho.

Em frente ao mercado de São José, situado no Bairro de São José, por conta do comércio e do grande fluxo de pessoas transitando pelo local, vários pontos de lixo foram encontrados pelas ruas e, mesmo tendo alguns depósitos para recolhimento dos mesmos, parece que não era suficiente para a quantidade de lixos produzidos naquela localidade. "Aqui deveria ter um container para que a gente pudesse colocar todos os nossos lixos, mas não tem. Já ouvi muitos clientes reclamando por conta disso e do mau cheiro que causa", informa um dos comerciantes do tradicional mercado, que não quis se identificar.  

Tomás Lapa afirma que o Recife é uma cidade que teve a sua ocupação de espaço de forma espontânea, então a partir daí já se encontra dificuldades para ordenar esse mesmo espaço. “Eu penso que um processo sistemático de educação patrimonial e ambiental na escola, desde cedo, possam contribuir para que em médio e longo prazo as novas gerações tomem consciência para se viver numa cidade ambientalmente sadia”, conclui. “Só levando as crianças para as ruas da cidade e ensinando a elas o que não se deve fazer (com o meio ambiente) é que conseguiremos um melhor resultado em médio e longo prazo, finaliza o professor.

Posicionamentos do poder público

Lixo no Recife

A Emlurb informa que a coleta de lixo domiciliar nas ruas do centro do Recife é realizada diariamente, além das ações de varrição. Porém, parte da população realiza o descarte irregular de resíduos fora dos horários da coleta, gerando a poluição das vias. A Emlurb pede a colaboração das pessoas para evitar o descarte irregular, mantendo a limpeza urbana em ordem.

Urina e fezes pelo centro da capital ocasionando mau cheiro

A Autarquia de Manutenção e Limpeza Urbana do Recife (Emlurb) esclarece que as equipes do órgão realizam diariamente os serviços de lavagem das ruas e calçadas na área central do Recife. O trabalho é feito com auxílio de caminhões pipas, geralmente durante a noite, quando o movimento de carros e pedestres é menor. No último domingo, por conta de um problema no caminhão, o trabalho foi temporariamente interrompido. Mas, o veículo já foi consertado e o trabalho de lavagem está normalizado desde a quarta-feira (18/04).

Praça do Diário

Nas andanças pelo Recife, a equipe de reportagem do LeiaJá encontrou uma das principais praças de Pernambuco, a Praça da Independência - mais conhecida como Praça do Diário - em estado de abandono. Chafariz sem funcionar, água parada e com lodo, mato alto e lixos tumultuados. A Emlurb, que também é responsável pela limpeza desse local, informou que "o local conta com funcionário fixo responsável pela manutenção e limpeza diária do local", informação essa que foi negada pelas próprias pessoas que dormem no local, segundo elas, já fazia quase um mês desde a última limpeza na praça. Ao que o órgão responsável continua: "periodicamente existe uma equipe volante para a execução dos serviços de capinação, podas, jardinagem, reparos na estrutura, pintura e consertos em equipamentos geral".

Uma semana depois que o LeiaJá entrou em contato com a Emlurb, a equipe de reportagem voltou ao local e verificou que o mato alto que tinha no local foi capinado e a fonte de água foi limpa; restando a retirada do lodo e limpeza geral do chafariz.

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