Rejeitado no NE, Bolsonaro cumprirá as demandas da região?
O Nordeste foi a única região na qual o militar perdeu na eleição presidencial de 2018
Na eleição presidencial de 2018, o então candidato Jair Bolsonaro (PSL) derrotou o Fernando Haddad (PT) em um pleito acirrado que entrou para a história do Brasil. Na época, um fato foi bastante repercutido logo após o resultado: o Nordeste foi a única região na qual o militar perdeu e onde o Partido dos Trabalhadores elegeu quatro governadores. Entre os nordestinos, Haddad teve 69,7% dos votos válidos, contra apenas 30,3% de Bolsonaro.
Na posse de Bolsonaro, no último dia 1° de janeiro, consolidado como reduto petista na última disputa, o Nordeste não teve nenhum representante na cerimônia de transmissão de cargo: todos os nove governadores eleitos na região programaram as respectivas solenidades no período da tarde, no horário que batia com a da posse presidencial.
Todo esse panorama ainda pouco consolidado abriu uma série de questionamentos: Bolsonaro vai atender as demandas do Nordeste? Irá se aproximar dos governantes da região? O presidente concluirá, por fim, as importantes obras inacabadas nos governos anteriores como a Transposição do Rio São Francisco?
Em entrevista concedida ao LeiaJá, o senador Magno Malta (PR) chegou a afirmar que Bolsonaro ama o Nordeste e que fará muito pelos nordestinos. Malta ainda falou que a tecnologia de Israel que, segundo ele, é capaz de “tirar água de pedra”, seria trazida. “Os irmãos nordestinos terão com Bolsonaro o melhor presidente da sua história”, chegou a dizer com muito entusiasmo.
Para o cientista político Rodolfo Costa Pinto, o problema envolvendo o governo Bolsonaro e quais serão suas prioridades vão muito além dessas questões pontuais. Uma das primeiras coisas que deve ser destacado é que o militar foi eleito em um momento de transição política no Brasil. “Onde o “velho” já morreu, mas o “novo” ainda não criou forma. Ou seja, é um governo sem um planejamento claro, composto por ao menos quatro grupos que divergem e convergem a depender da pauta em questão. Essas partes são: militares, economistas [liberais], justiça e o grupo evangélico”, observou.
“Cada um desses grupos tem suas prioridades e suas lideranças. Nenhum é capaz de dominar claramente os outros, então precisam estar constantemente avaliando o cenário, decifrando a vontade do presidente e construindo alianças com os outros grupos. Há ainda um outro grupo influente no atual governo federal, esse ainda mais difícil de ser compreendido e analisado, que é a família do presidente. Essas partes precisam ser levadas em consideração para tentarmos avaliar as medidas de Bolsonaro em relação a Pernambuco e ao Nordeste”, explicou.
Rodolfo Pinto destacou que é a primeira vez, na formação de um ministério, que se exclui pessoas de origem do Norte ou Nordeste. “É algo que importa mais em termos de imagem do que em termos de políticas de governo. Mas ainda assim, fará falta nas reuniões do primeiro escalão alguém capaz de defender seriamente o ponto de vista do Nordeste e de Pernambuco”.
De acordo com o cientista, não é fácil navegar em um cenário polarizado como o atual. Ele acredita que a certa “desorganização” do grupo que atualmente ocupa o Planalto pode abrir oportunidades para que o governador Paulo Câmara (PSB), junto com os representantes de Pernambuco no Congresso, traga investimentos para o Estado.
“É um momento desafiador e Pernambuco precisará de toda ajuda com que puder contar. Deputados pernambucanos mais próximos do provável presidente da Câmara, Rodrigo Maia, tendem a ganhar espaço devido a sua capacidade de articulação política. O deputado Luciano Bivar também deve ser favorecido devido a seu papel de presidente do PSL, segundo maior partido em número de representantes e partido do presidente Jair Bolsonaro, isso numa perspectiva mais pragmática, pensando no Estado”, avaliou Pinto.
Paulo Câmara, por sua vez, vem mudando o tom ao falar sobre o militar. O pessebista tenta um encontro com o presidente ainda em janeiro para discutir os projetos necessários. Já antecipou que a discussão será com “espírito público e serenidade”. A esperada reunião deve acontecer após mais uma cirurgia que o ex-deputado vai enfrentar, desta vez para a retirada da bolsa de colostomia.
Rodolfo ainda ressaltou que o governo Bolsonaro possui uma série de outras implicações políticas que não são fáceis de prever. “Por exemplo, a influência da retórica do presidente em como as principais figuras locais vão se posicionar para disputar a prefeitura do Recife. Quem vai ser o candidato, ou candidata, aqui em Recife a vestir a camisa de Bolsonaro? Quem vai ser contra? São muitas questões pra surgir ainda”.
Em meio a tantas perguntas, uma esperança. Nesta semana, a Política Nacional de Recursos Hídricos (PNRH), que está sendo elaborado pelo governo Bolsonaro, divulgou que das 114 obras estruturantes para ampliar o abastecimento de água no País, 66 estão alocadas no Nordeste, área que mais sofre com a seca.
O especialista ainda disse acreditar que, caso seja aprovada, a reforma da previdência pode desafogar verbas para a conclusão das obras, mas é preciso esperar para ver essa realidade se concretizar. “A Transposição e a Transnordestina são os principais projetos do governo federal na região nordeste e ambos estão praticamente parados. O maior problema é a falta de recursos no orçamento para dar continuidade aos investimentos”.
A privatização dos aeroportos também é uma pauta que pode afetar positivamente a economia local, consolidando o aeroporto do Recife como um dos principais pontos de parada da malha aérea brasileira. “De maneira mais ampla, a desregulamentação da economia e incentivos a PPPs também podem atrair investimentos importantes para Pernambuco, mas a elaboração e execução desses contratos precisará ser muito bem fiscalizada para assegurar que a sociedade como um todo se beneficie dos projetos”, finalizou.