Prefeito de Manaus teme 'tiro e morte' em lockdown

Apesar de recomendação do Ministério Público e de entender que há um colapso na saúde pública da cidade, prefeito ainda não pretende implementar o fechamento total

sex, 08/05/2020 - 10:50
Márcio James/Semcom Gestor veio às lágrimas durante entrevista ao descrever situação de Manaus Márcio James/Semcom

O prefeito de Manaus, Arthur Virgílio Neto (PSDB), chorou mais uma vez ao comentar a situação enfrentada pela capital do Amazonas durante a pandemia do novo coronavírus em entrevista à BBC News Brasil. O gestor disse que ainda não implementou o lockdown (isolamento total), mesmo com recomendação do Ministério Público, por temer que a situação termine em "tiro e morte".

 "Eu penso, por exemplo, numa rebeldia popular grande. Daqui a pouco tem eleição. Um oportunista joga uma pedra… Eu já enfrentei uma ditadura. Apesar da minha idade, se tivesse outra, e não vai ter, eu enfrentaria de novo. Eu sei o que é a repressão, ela nem sempre depende do comandante. Dizia-se que na ditadura, não se tinha tanto medo do general, tinha medo do guarda da esquina. Então, joga uma pedra em alguém, começa um tiroteio com bala de borracha, que pode cegar alguém, começa a reação das pessoas, que vivem uma situação de desespero. Algo que termina dando em tiro, dando em morte. Eu acho que é uma medida que deve ser tomada em ultimíssimo grau, assim como nós fazemos com a intubação", comentou ele sobre o fechamento total.

 Segundo o prefeito, todas as pessoas importantes com quem ele conversou não passaram segurança sobre o lockdown. "Eu encontrei pessoas que dizem que nós não temos instrumentos de repressão para sequer reprimir de verdade uma rebeldia popular de grandes proporções. Então, eu olho com responsabilidade o lockdown. O MP sugeriu, sugeriu. Vamos analisar, fazer uma teleconferência e discutir. Mas, eu não posso declarar um lockdown sem ter absoluta segurança de que preciso dele como a gente usa um respirador."

 Ele também comentou o episódio em que chorou na televisão, dizendo ser muito sentimental. "Não fui criado em uma família em que homem não chora. Eu explodi sim porque você vê a pregação do 'vai para a rua' e eu dizendo 'não vem para a rua', e o pessoal não me atende e vai para a rua. E as pessoas morrem", disse à BBC News Brasil.

 O gestor continua: "Isso só não mexe com uma pessoa com o coração muito ruim. Um coração muito desonesto até, você não sentir uma coisa dessa. E a impotência, e a falta de recursos, os recursos não vinham, e não vieram ainda, nós estamos lutando com nossas próprias forças. E morrendo gente, morrendo gente. Coveiro quase espancado por filho de uma pessoa que ia ser enterrada. O coveiro! O coveiro! Se tivesse que espancar, espancasse o governador, espancasse a mim, mas o coveiro."

 Virgílio Neto disse tratar a pandemia como uma guerra. "A gente sabe que guerra é guerra. Nós temos uma guerra. Eu encaro o corona como uma guerra. Nós tivemos que enterrar as pessoas. Nós não poderíamos simplesmente olhar um para o outro, indecisos, como aconteceu em alguns hospitais, doentes juntos com mortos. Nós não podíamos fazer isso", ele diz, lembrando das imagens de valas comuns abertas e tratores abrindo fileiras.

 O prefeito recentemente gravou vídeos pedindo ajuda a líderes mundiais, como o presidente da França Emmanuel Macron. Questionado se não temia uma tensão com o presidente Jair Bolsonaro devido a isso, ele disse não estar preocupado "Vou te dizer como lido com o Bolsonaro. Bolsonaro todos os dias me cria tensão. Quando ele briga com fulano, com beltrano, com não sei quem. Ele tem um inimigo por dia. E eu crio de vez em quando problemas para ele quando respondo, quando falou ou dou uma entrevista. Isso aí não me importa o mínimo. Eu não concordo com a política externa dele, não concordo com o ministro de Relações Exteriores dele. Não é uma escolha sequer madura, se tratava de um embaixador júnior. Então, não estou nem um pouco preocupado."

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