Uma prova em busca de inclusão
Enem passou a oferecer atendimentos inclusivos. Nome social e adequação dos locais de prova para pessoas com deficiência são algumas das medidas
O Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep) oferece atendimento especializado para candidatos do Enem com com baixa visão, cegueira, visão monocular, deficiência física, deficiência auditiva, surdez, deficiência intelectual (mental), surdocegueira, dislexia, déficit de atenção, autismo e discalculia. Além disso, gestantes, lactantes, idosos e até estudantes que estejam em classe hospitalar têm direito a fazer a prova em condições especiais. Desde 2014, pessoas transexuais também podem solicitar o uso de nome social para realizar a prova.
O estudante Juno Dias foi um dos 303 transexuais que solicitaram a utilização de nome social no Enem deste ano. É a primeira vez que suas solicitações são aceitas. “Eu recebia um e-mail dizendo que eu não havia preenchido o formulário corretamente. Não especificam nada, mas acredito que isso se deve à exigência de um aspecto mais masculino, pois não tenho a aparência exigida. Este ano não tive tanta dificuldade em relação a isso”, comenta. Juno acredita que a possibilidade de utilizar o nome social na prova contribui para a redução da evasão escolar das pessoas transexuais. “Uma das grandes razões pelas quais deixamos de estar presentes nos espaços é justamente o nome. O respeito ao nome é algo extremamente simbólico, um importante reconhecimento da nossa cidadania”, afirma.
Para a técnica da Diretoria LGBT da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE) Geovana Borges, embora a possibilidade de usar o nome social seja uma importante conquista das pessoas transexuais e travestis, o processo seletivo do Enem peca ao exigir que o nome civil no ato de inscrição, para só depois possibilitar a solicitação do nome social. Este ano, o prazo para realização das inscrições no Exame foi o dia 19 de maio, enquanto o período de requisição do nome social foi liberada apenas no dia 30 de maio. “A identidade e a dignidade das pessoas trans são desrespeitadas quando o nome social é desconsiderado no ato da inscrição. A violência institucional acontece no primeiro contato da(o) estudante com o processo seletivo”, opina.
Já a cadeirante Bárbara Ferragut diz não ter tido dificuldade para solicitar condições especiais de realização da prova. “Na hora da inscrição, é questionado se o candidato tem necessidade especial. Coloquei que tinha deficiência física e ganhei o direito de fazer a prova no térreo, com mobília especial”, explica. Bárbara acredita que o atendimento evita constrangimento às pessoas com dificuldade de locomoção. “Se não existisse essa possibilidade, seria complicado para mim, porque nem todo edifício tem elevador. Eu precisaria achar rapazes fortes que pudessem carregar a cadeira e isso geraria até uma tensão durante a prova, por eu não saber como desceria do prédio”, completa.
A estudante Cintia Maria Gondim possui baixa visão e também teve o pedido de atendimento especializado bem-sucedido no Enem de 2016. “Pude receber uma prova ampliada, ou seja, com fonte e figuras maiores, e um transcritor, que tem a função de pegar minhas respostas e colocar no gabarito, que não vem aumentado”, conta. Embora não tenha solicitado um ledor- responsável por ler a prova para o candidato com deficiência visual-, a estudante relata que recebeu apoio do transcritor quando a vista cansou. “Ele foi bem paciente e leu a prova para mim quando pedi. Todo o processo foi bem tranquilo, achei impressionante, porque pude fazer a prova sem me incomodar”, conclui. Este ano, de acordo com o Inep, cerca de 52 mil participantes solicitaram Atendimento Especializado para o Enem.
Conheça os documentos exigidos pelo Inep para solicitação do Nome Social:
1) Fotografia atual nítida, individual, colorida, com fundo branco que enquadre desde a cabeça até os ombros, de rosto inteiro sem o uso de óculos escuros e artigos de chapelaria, tais como boné, chapéu, viseira, gorro ou similares;
2) Cópia digitalizada da frente e do verso de um dos documentos de identificação oficial com foto;
3) Cópia assinada e digitalizada do formulário de solicitação.
Novo recurso: videoprova traduzida
Este ano, pela primeira vez, será possível que pessoas surdas ou com deficiência auditiva participem do Enem através de videoprova traduzida em língua brasileira de sinais (Libras), uma opção à participação de um intérprete de Libras no processo seletivo. Através do novo recurso, as questões e as opções de respostas serão apresentadas em sinais por meio de um vídeo. Apenas as questões de língua estrangeira deixarão de ser traduzidas. Segundo Inep, dos candidatos que solicitaram atendimento especializado no Enem de 2017, 4.957 são deficientes auditivos e 2.184 são surdos.
Quem optar pelo novo método receberá um notebook para fazer as provas, junto ao Caderno de Questões, à Folha de Redação e ao Cartão-Resposta, podendo escolher por qual área de conhecimento deseja começar, assim como assistir os vídeos na ordem que preferir. Quem optar por utilizar o recurso com a companhia de intérprete terá direito a 60 minutos adicionais. Caso o candidato vá utilizar o recurso sozinho, serão acrescentados 120 minutos adicionados ao tempo regulamentar.
Reportagem integra o ‘Especial Enem: da prova ao sonho do ensino superior’, produzido pelo LeiaJá. As matérias abordam a história do Exame e de que forma ele se tornou uma das principais provas educacionais do Brasil. A seguir, leia as demais reportagens:
--> A origem do Enem e o trajeto evolutivo da prova
--> A popularização do Enem e o caminho rumo à universidade
--> Uma prova, várias possibilidades
--> Enem mudou características dos cursos preparatórios