Comunicação acessível resgata direitos e cidadania

Jornalista Aretha Fernandes afirma que somente 1% dos sites brasileiros cumpre todos os requisitos de acessibilidade

qua, 14/09/2022 - 13:23

Aretha Souza Fernandes atua há 20 anos no mercado de comunicação. A jornalista é focada em comunicação acessível e na área da saúde. Em Belém, foi repórter do Jornal Amazônia e editora do Diário do Pará, além de ter atuado em agências e assessorias de imprensa do Governo do Estado. Em Marabá, onde mora atualmente, Aretha trabalhou na comunicação do Hospital Regional do Sudeste do Pará e, hoje, é analista de comunicação da agência Planet, onde atende projetos culturais.

O interesse de Aretha pela comunicação acessível nasceu do contato com a comunidade surda da sua igreja. Ela começou a pesquisar sobre o assunto, aprendeu Libras e levou essa expertise para a comunicação. Segundo pesquisa divulgada pela Agência Brasil, apenas 1% dos sites brasileiros cumpre todos os requisitos de acessibilidade. Nesta entrevista, a jornalista detalha os aspectos positivos do uso desse tipo de comunicação.

 O que é comunicação acessível?

 Comunicação acessível é tornar a informação livre de barreiras, para que qualquer pessoa possa entendê-la. Por exemplo, quando uso legenda em vídeos, a comunicação se torna acessível para surdos oralizados ou pessoas que estejam em um local com ruídos. Se garanto um intérprete de Libras - Língua Brasileira de Sinais, torno acessível para o surdo. Se disponibilizo o recurso de áudio para leitura de textos em veículos digitais, possibilito que analfabetos funcionais acessem a notícia. E assim por diante. A comunicação acessível é um direito de todos e fundamental para o exercício da cidadania.

O assunto parece novo, porém é a base da comunicação, do jornalismo, da publicidade. Em 1948, a Declaração dos Direitos Humanos reconheceu a informação como um direito humano. Infelizmente, a maioria dos profissionais da área não discute o assunto e desconhece os recursos de acessibilidade já existentes.

Segundo dados levantados pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) em 2019, são pelo menos 45 milhões de brasileiros que contam com algum tipo de deficiência. Qual a importância da comunicação acessível para essas pessoas?

 Pessoas com deficiência têm necessidades como as de pessoas sem deficiência. Elas se alimentam, vestem roupas, sonham... isso significa que elas também consomem. A diferença é que existe uma grande barreira comunicacional no mercado. Somente 1% dos sites brasileiros cumpre todos os requisitos de acessibilidade. Com isso, coisas simples para a maioria das pessoas, como comprar uma passagem de viagem pela internet ou pedir uma pizza por um aplicativo, podem ser bem complexas. Essas barreiras excluem, além das mais de 45 milhões de pessoas com deficiência, outros 11 milhões de analfabetos funcionais e 2 milhões de autistas, dentre muitos outros segmentos. Falamos até aqui em relação à esfera privada, ao mercado de consumo. Mas e nos órgãos públicos? Sim, também precisamos avançar nesse aspecto. Estamos evoluindo, é verdade, mas há um caminho longo pela frente.

Como fazer comunicação acessível?

 Há muitas maneiras de começar a fazer comunicação acessível. Uma delas é colocar a acessibilidade como regra em qualquer processo da comunicação. Por exemplo, meu cliente se comunica pelo Instagram, Facebook ou outra rede social? Eu preciso conhecer os recursos de acessibilidade, passar a fazer descrição de imagem para facilitar a compreensão por pessoas com deficiência visual, usar cores com bom contraste para leitura, escrever com linguagem simples e clara. Enfim, preciso pensar a comunicação sob a perspectiva de quem tem dificuldade para enxergar ou ouvir, tem baixa escolaridade, déficit de atenção.

No passado, as pessoas com deficiência faziam parte de um grupo "esquecido", mas a partir da lei de cota em 1991, eles começaram a ganhar novas oportunidades de se desenvolver profissionalmente e intelectualmente, tornando-se pessoas produtivas, empreendedores e até mesmo potenciais consumidores.

Vale a pena empresas ou instituições investirem nesse tipo de comunicação?

 Sim, vale muito a pena. Vivemos em sociedade e precisamos ter empatia pelo outro. Comunicação acessível é um investimento. Jamais deve ser considerado um gasto. É responsabilidade social, engajamento, postura humanizada e respeito à diversidade. É inegável que hoje em dia o consumidor está de olho no posicionamento das marcas em relação a assuntos como esse. Portanto, vale muito a pena.

Na sua avaliação, o que já tem sido feito no Brasil e o que ainda pode ser feito em relação à comunicação acessível?

Avançamos em alguns aspectos, mas ainda estamos longe do ideal. O eixo Sul-Sudeste está na frente, claro. Grandes empresas e instituições como bancos e varejistas já criaram áreas de diversidade para tratar o assunto. Isso é um avanço. Porém, nossas TVs ainda não disponibilizam o recurso de Closet Caption em toda a sua programação, como previsto em lei, as faculdades de Comunicação pouco discutem o tema e a maioria dos veículos de comunicação continua tratando a deficiência de maneira capacitiva (preconceituosa). Se conhecermos os recursos tecnológicos já disponíveis no mercado e cumprirmos as leis já sancionadas a favor dessas minorias, o cenário pode ser outro. Isso é respeitar a diferença. E respeito muda tudo.

Por Suellen Santos (sob a supervisão do editor prof. Antonio Carlos Pimentel).

 

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