"Marambiré" leva para o cinema tradição quilombola do Pará
Documentário da produtora Lamparina Filmes, que já foi premiada no Festival de Cannes, na França, resgata a tradição afrorregional do Baixo Amazonas, no oeste paraense
Ritmo com um toque tropical que vai além de uma simples música, o marambiré é uma manifestação cultural que atravessa gerações e envolve dança e cantos marcados fortemente pelo som da caixa e dos pandeiros. Esse movimento cultural oriundo do Baixo Amazonas, da comunidade quilombola do Pacoval, município de Alenquer, no Pará, foi o tema escolhido pela produtora Lamparina Filmes para um documentário, o "Marambiré".
A dança homenageia São Benedito, um santo católico que ao ser trazido de Portugal para o Brasil, pelos padres portugueses, foi logo adotado pelos escravos, tornando-se um santo negro de grande devoção. Além do forte aspecto religioso, o marambiré representa um símbolo de resistência étnica para diversas localidades do Baixo Amazonas. Os cânticos carregam referência à África, com letras que retratam todo o sofrimento de um povo escravizado, e revelam grande identidade afrodescendente.
O marambiré se desenvolve de forma ritualística e teatral, em fileiras ou em rodas, com uma mistura de lundum, carimbó, marabaixo e apresentação de personagens que são o Rei do Congo, a Rainha do Congo, as rainhas auxiliares, o caixeiro, o contramestre e os valsares. A presença de uma “corte” é muito comum em diversas manifestações culturais de origem africana.
O diretor da produtora Lamparina Filmes, André dos Santos, explica que foi o medo de perder as histórias que são passadas oralmente de geração a geração que o levou a querer fazer o documentário. “Como a manifestação cultural está muito na oralidade, eu achei que o audiovisual tem esse poder de difundir e divulgar, e de certa maneira guardar esse tipo de cultura, que é um tanto esquecida”, explica.
André conta como foi difícil escrever o roteiro para o documentário, pois sempre surgiam coisas novas e importantes no decorrer da filmagem. O filme, que estava previsto sair com 52 minutos, terminou com 80 minutos. “Na realidade, é muito difícil escrever um roteiro de documentário, pois sempre acontecerão mais coisas ali no momento de produção. ‘Marambiré’ também se confunde com a vida dessas pessoas. Tem toda essa questão de agradecimento com relação à conquista de terra, com os plantios e outras culturas, como a Pastorinha, o Boi-Bumbá, a cura de veneno de cobra. Uma série de coisas que a gente não estava esperando do projeto inicial. Acho que está muito maior e melhor”, conta.
A produtora Lamparina Filmes foi premiada no Festival Internacional de Cannes, na França, com o documentário “Samba de Cacete”, que também fala do resgate da cultura afrorregional. “Espero que o Marambiré seja semelhante, eu sou suspeito para falar, mas eu creio que por se tratar de um longa- metragem ele é um filme mais completo. O outro filme, ‘Samba de Cacete’, tinha que ter 26 minutos, por conta que o edital rezava isso. Esse, por ser um filme maior, vai contemplar coisas maiores, ele se encaixa também no maior número de festivais com mostras competitivas. Então espero que ele tenha um longo caminho de prêmios”, almeja o diretor.
O documentário foi contemplado pelo Rumos Itaú Cultural, que é um dos primeiros editais públicos do Brasil. Oferece apoio para projetos em diversas áreas de expressão artística ou de pesquisa.
Serviço
Lançamento será dia 1° de novembro, às 18h, no Sesc Boulevard. Projeto foi contemplado pelo Rumos Itaú Cultural 2015-2016.
Por Maria Clara Silva.