Óleo: Diante do desastre, governo deveria tomar as rédeas

Plano Nacional de Contingência não parece ter sido colocado literalmente em prática. As cidades e estados continuam tendo que montar e arcar com os custos das operações no combate ao avanço das manchas de óleo

por Jameson Ramos ter, 22/10/2019 - 18:32
Chico Peixoto/LeiaJá Imagens Enquanto isso, centenas de voluntários se dedicam na limpeza dos locais atingidos Chico Peixoto/LeiaJá Imagens

Desde que as primeiras manchas de óleo apareceram nas praias de João Pessoa, na Paraíba, no dia 30 de agosto, vem crescendo as discussões sobre de quem seriam as competências para combater o avanço desse petróleo no litoral nordestino, além do custeio dessas operações. De acordo com a doutora em direito marítimo, Ingrid Zanella, o Plano Nacional de Contingência (PNC), instituído em 2013, diz que essas competências são rigorosamente do Governo Federal.   

O que está acontecendo é que, se não todas, mas a maioria das cidades e estados estão tendo que montar e arcar as ações para conter o avanço do óleo em sua região. Para se ter ideia, só nesta terça-feira (22), que o Governo Federal reconheceu a situação de emergência em seis das 12 cidades atingidas na Bahia. Agora, passados 53 dias do surgimento desse desastre ambiental, recursos federais serão liberados para essas cidades baianas que estavam custeando a limpeza das praias.  

Zanella aponta que o plano nacional institui que é dever da união criar as estratégias, acionar as partes necessárias e custear o que for necessário para combater esse desastre - que caracteriza como um “crime ambiental”. 

Esse plano foi instituído para conter acidentes de significativos impactos ambientais de caráter nacional, e uma das hipóteses para ele ser acionado é quando o poluidor é desconhecido - o que está acontecendo no Nordeste. “A gente está diante de um cenário de crime ambiental de significância nacional e ainda não sabemos de onde está vindo esse poluente, a causa e o país. Não sabemos nem o que está por vir e temos que estar preparados para o pior cenário possível”, diz a especialista.

De acordo com o Ministério do Meio Ambiente, além do PNC, o Grupo de Acompanhamento e Avaliação (GAA) também já está em funcionamento, mobilizando vários órgãos da União como Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (IBAMA), Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio), Polícia Federal, Agência Nacional do Petróleo (ANP), Exército Brasileiro, Força Aérea Brasileira e Universidades Federais.

“Mas é óbvio que com base em toda a responsabilidade ambiental o Governo Estadual faz o que consegue. No nosso caso, Pernambuco já contratou uma empresa para monitoramento das áreas. Já os municípios, por sua vez, devem assessorar na coleta dos resíduos”, afirma Ingrid.

Diante de todas as iniciativas dos estados e municípios, Ingrid Zanella acredita que existe “uma certa omissão do Governo Federal”, principalmente por conta da morosidade e a falta de Equipamentos de Proteção Individual (EPIs), entre outras necessidades que deveriam ser disponibilizadas pelo Governo Federal.

Sobre essa lentidão, o Ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles, fala que não é verdade. “Não há nenhuma demora de nenhum órgão. Todos estão trabalhando de maneira ininterrupta, desde o aparecimento da mancha não se poupou nenhum esforço”, reforça. 

“O cenário que temos agora é muito complexo porque o óleo está pesado, já está em contato com o mar há um certo tempo e os órgãos públicos não estão conseguindo identificar ele por sobrevoo e satélites”, pontua a doutora em direito marítimo. Segundo o Ibama, essa dificuldade se dá porque o petróleo que atinge o Nordeste se concentra em camadas subsuperficiais.

Como a lei pode proceder

Ingrid Zanella aponta que o fato aconteceu possivelmente em alto mar, fora da jurisdição do Brasil. “Mas os danos do ato criminoso estão sendo sofridos pelo estado costeiro, que é o Brasil. Isso gera possibilidades para que o país processe e julgue os responsáveis”, diz a doutora. Ela lembra que o Brasil é signatário de diversas convenções internacionais e o crime ambiental é uma prática proibida internacionalmente e, por isso, independente da nacionalidade do culpado por esse desastre ambiental, existem diversos agentes que podem ser responsabilizados.

Governo não conhecia PNC e demorou para formalizar

A formalização do Plano Nacional de Contingência só aconteceu 41 dias depois de terem surgido as primeiras manchas de petróleo no litoral do Nordeste. De acordo com o Estadão, naquela data, o ofício circular assinado por Salles e enviado à Casa Civil da Presidência da República, tratava, na realidade, de apenas designar a Marinha do Brasil como "coordenadora operacional" das ações, para prosseguimento no combate às manchas de óleo.

Membros do governo e especialistas no setor do meio ambiente apontam que o próprio governo não sabia que existia um plano de contingenciamento para lidar com esse tipo de desastre ambiental. 

Dinheiro para combater o avanço do óleo

Nesta terça-feira (22), o Ministério do Desenvolvimento Regional anunciou a liberação de R$ 2,58 milhões para que o Governo de Sergipe empregue no combate ao avanço do óleo no Estado. Esse valor representa pouco mais de 10% dos R$ 22 milhões que o governo estadual havia solicitado ao governo federal. 

Exército

Nesta última segunda-feira (21), o governo federal anunciou que cerca de 5 mil militares do Exército irão ajudar nas ações de limpeza das praias atingidas por óleo no litoral nordestino. 

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