Em 7 meses de pandemia, PE ainda luta contra negacionistas
A indiferença de parte dos pernambucanos perante milhares de vítimas da Covid-19 foi disseminada no estado como o próprio vírus
Neste ano, a celebração da padroeira do Brasil foi ofuscada pela presença indesejada da Covid-19, que superou a marca de 150 mil mortes no país. Em Pernambuco, o feriado desta segunda-feira (12) corresponde ao sétimo mês de circulação do vírus, ampliado no aumento diário de óbitos e contaminações. Apesar dos dados ainda preocupantes, parte da população ainda nega a gravidade da doença em defesa de convicções pessoais e resiste ao cumprimento das normas sanitárias.
“A morte se banalizou”, desaprova o sociólogo Wellthon Leal, que compara o sentimento coletivo de desprezo à conformidade social com a Corrupção e a Violência. Praias e ônibus lotados, e a interdição de pelo menos cinco bares, provam que os 8.441 óbitos e 153.144 infectados listados pela Secretaria Estadual de Saúde (SES), são considerados apenas uma estatística. “Enquanto o número não for nome, isso vai se elevar nas pessoas”, complementa o psicólogo Dino Rangel.
Ideologia acima da Ciência
Na sua visão, ainda que prejudicial, o negacionismo representa uma tentativa de autoproteção, descrito por "um mecanismo de defesa que a pessoa cria para não se permitir flexibilizar a ideologia que ela tem”, aponta o psicólogo. A não compreensão da realidade é fruto do enraizamento dessas convicções, geralmente político-econômicas ou religiosas. “Vivem em função dos outros, das ideologias, dos dogmas, mas não vivem em função de si”, acrescentou, ao destacar que a consolidação desta recusa pode resultar no processo de autodesprezo.
Sem a distribuição de uma vacina ou medicamento comprovadamente eficaz, o respeito às regras contra à Covid-19 é a única forma de prevenção. Reforçar a higiene das mãos, evitar aglomerações e obedecer às indicações da Organização Mundial da Saúde (OMS) traduzem a esperança pela queda dos indicativos negativos.
Ante os negacionistas, a recuperação de 133.312 pacientes no Estado é comemorada pelos pernambucanos. A conquista é proveniente do atendimento de profissionais da saúde, que dividem esforços com pesquisadores na luta para minimizar os impactos da pandemia. “A gente vive um momento político-social em que a Ciência tende a ser negada e questionada por pessoas que nunca estudaram ou tiveram processo crítico sobre a realidade”, adverte o sociólogo.
O exemplo que deveria vir de cima
Essa falta de empatia e desvalorização do ser humano foi incentivada pela irresponsabilidade de influenciadores e figuras públicas, que subestimaram o vírus e usaram da popularidade para enfraquecer o isolamento social. “O processo de comportamento social tem muito a ver com a reprodutibilidade”, comenta Leal.
Embora o governador Paulo Câmara tenha admitido a gravidade da pandemia desde o início, bem como os principais representantes políticos de Pernambuco, para o sociólogo, tal precaução - requisitada por especialistas - deveria ter sido uma regra para a classe gestora do país. “Se a gente tem figuras políticas e o alastramento muito grande desse comportamento, então é óbvio que a sociedade vai começar a reproduzir”, avaliou.
Toda a indiferença diante do aumento de vítimas foi reforçado pela redução de postos formais de trabalho, fechamento de empresas e suspeitas de desvio de recursos destinados ao enfrentamento da doença, como a recaiu sob a gestão do Recife na compra de respiradores. A necessidade de mover a economia pressionou a flexibilização precoce das atividades comerciais e obrigou os trabalhadores a se expor novamente ao risco. “Se elas são obrigadas a pegarem ônibus para ir trabalhar em um espaço apertado, elas também vão começar a se dispor a ir aos espaços de lazer e aglomerações da mesma maneira", entende o sociólogo.
Diante da expectativa de mais um feriado com espaços públicos lotados e novos flagras de irresponsabilidade, Leal lamenta a contrariedade entre economia e saúde pública, e assume a perspectiva social para reconsiderar a crítica aos negacionistas. "Por que aplicar a regra só no momento que o sistema quer que você se aglomere para gerar lucro e num momento de diversão você não vai levar isso em consideração?”, questionou.