Deputada diz que escravidão mudou do chicote para caneta

Para Benedita da Silva (PT), desde o início da gestão de Michel Temer, o luta contra o racismo sofre um "retrocesso inigualável" no Brasil

por Victor Gouveia seg, 11/05/2020 - 12:38
Gabriela Korossy/ Câmara dos Deputados A congressista ainda disse que há resquícios escravocratas na cabeça de governantes e executivos Gabriela Korossy/ Câmara dos Deputados

Às vésperas da data de assinatura da Lei Áurea, que libertou os negros no Brasil em 13 de maio 1888, a deputada federal Benedita da Silva (PT), sem dúvidas é um ícone em relação à representatividade preta e feminina na Política. Em entrevista à Universa, a pioneira em ocupar cargos no Executivo prefere não comemorar a data e avaliou o que entende como "retrocesso inigualável" nas políticas voltadas à população negra.

Aos 78 anos, Benedita é fruto do amor de uma lavadeira e um pedreiro. Natural da favela carioca, seu pioneirismo político emergiu em 1982, quando foi a primeira negra a alçar uma cadeira na Câmara dos Vereadores do Rio. Anos depois, chegou a integrar cargos no Senado e no governo do Estado, antes de assumir a candidatura no Congresso.

A deputada explica que o 13 de maio não é um dia de comemoração, e sim de reflexão, pois "o extermínio da população negra continua até hoje". "A escravidão apenas mudou do chicote para a caneta. Da caneta para a exclusão. É nesse sentido que o 13 de Maio não se festeja", entende.

Seu dia-a-dia no Congresso Nacional é divido ao lado dos demais políticos escolhidos para reger o país. Sua "intimidade" com a classe, a faz cravar que ainda "há essa coisa escravocrata na cabeça de governantes e executivos que querem que a gente morra."

Para Benedita, desde a entrada do ex-presidente Michel Temer (MDB), o Brasil sofre com um "retrocesso inigualável" em relação à luta contra o racismo. A redução das medidas voltadas para promover oportunidades e acesso ao ensino superior é uma de suas principais queixas.

Em relação à gestão Bolsonaro (sem partido), frisou o avanço de gestos antidemocráticos e na escolha de Sergio Camargo para comandar a Fundação Cultural Palmares. Ela relembrou o entendimento distorcido de Camargo, que defende que "a escravidão foi ótima para os negros". "Como entender que a Casa Grande ainda usa negros para bater em negros, como capitão do mato? Chegamos a um 13 de Maio nunca visto antes", compara.

Benedita também garantiu que não sente-se representada pela ministra Damares Alves, responsável pela pasta da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos. "Com esse governo não tem diálogo [...] tudo que seu mestre mandar, faremos todos", no ‘toma lá, dá cá’. Eles falam que não pode ter ideologia, mas eles têm e é perversa", aponta.    

A deputada reforça que o antirracismo deve ser uma luta de todos e “quando você cuida da mulher negra, está cuidando da maioria da população brasileira". A petista também criticou o cenário político, resultante da polarização polarização: "se faz diferente é comunista e não tem fé em Deus", comentou.

Embora evangélica, a congressista enxerga uma contradição entre fé e Política no atual Governo. "Quem ama não mata, nem discrimina, abandona ou julga. E há muita contradição em religiosos que estou vendo ali", afirma.

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