O que esperar da viagem de Lula à China?

A visita está agendada para os dias 28 e 30 de março e as expectativas estão altas diante da viagem ao maior parceiro comercial do Brasil

por Rachel Andrade sex, 24/03/2023 - 15:50
Júlio Gomes/LeiaJá Imagens/Arquivo Lula visita a China pela terceira vez enquanto presidente da República Júlio Gomes/LeiaJá Imagens/Arquivo

O presidente Lula (PT) fará uma viagem à China ainda este mês. Sua ida foi adiada para o domingo (26), dia que já estaria em solo chinês, devido a uma pneumonia leve com a qual foi diagnosticado nesta sexta-feira (24). A visita conta com uma mega comitiva com mais de 200 pessoas confirmadas, além de uma agenda carregada de assuntos a serem travados entre as duas nações. A China é o principal parceiro comercial do Brasil, havendo fortes laços entre os países, e eles ainda fazem parte do bloco econômico que inclui Rússia, Índia e África do Sul, o BRICS.

Os laços entre Brasil e China estão para ser mais estreitados ainda no encontro de Lula com o presidente Xi Jinping, que também está no seu terceiro mandato como chefe de estado. Mas afinal, por que essa viagem está sendo tão falada? Quais as expectativas que os especialistas têm acerca da passagem da comitiva brasileira? Quais os principais benefícios que os acordos que estão para ser assinados trarão para a população brasileira? Para entender mais do assunto, o LeiaJá conversou com o cientista político Augusto Teixeira, que trouxe detalhes sobre o que se esperar da visita, e seus possíveis desdobramentos.

Mega comitiva

Esta será a terceira ida de Lula à China enquanto presidente da República. Um destaque interessante é a quantidade de pessoas que farão parte da comitiva, que já passa de 240 empresários, além de membros do governo, como ministros, deputados, e integrantes do Itamaraty. O órgão afirmou que a viagem dos empresários na comitiva será custeada por cada um deles, sem uso de verba pública para arcar com todos os gastos. “Mas para esse grupo é extremamente importante surfar na cauda do cometa, ou seja, aproveitar a visita do presidente Lula e dos ministros de forma a abrir portas para interlocutores importantes na China e tentar abrir portas no mercado relevante, crescente e em grande medida cada vez mais rico, e que pode ansiar por produtos brasileiros a compor a pauta de consumo cada vez mais.”, ressalta Augusto Teixeira.

Em sua explicação, o cientista político analisa que o grande número de agentes presentes na viagem acaba sendo benéfico tanto para o contexto internacional, quanto para as relações com lideranças brasileiras que são oposição do PT e do presidente. Um dos exemplos é o empresário Joesley Batista, um dos sócios da JBS, que esteve envolvido em um acordo de delação premiada da investigação Lava Jato, e já chegou a acusar o Partido dos Trabalhadores de ter institucionalizado a corrupção.

“Uma parcela importante da economia que esteve do lado do ex-presidente Bolsonaro. E obviamente apoiou o presidente Bolsonaro até o último momento. Inclusive com representação no parlamento em oposição ao Lula. Então, ao trazer essas pessoas para a comitiva, o Lula, de um lado, dá um voto de confiança, estende o tapete e a possibilidade de negociação e articulação de interesses conjuntos com esse grupo. Por outro lado, pode ter aí possíveis incentivos e ganhos econômicos potencialmente relevantes para apresentar nas estatísticas do seu mandato presidencial”, observa Augusto.

Agenda relevante

Tendo em vista que a China é um dos principais parceiros comerciais do Brasil, alguns temas relevantes serão tratados com a importância que têm. Segundo Teixeira, algumas barreiras deverão ser trabalhadas. “Os entraves dizem respeito à tentativa de desobstruir algumas opções e possibilidades de exportação de commodities agrícolas brasileiras, especialmente proteína (carne, frango) para a China, de forma a elevar o nosso volume de exportações e proteína animal para a China.”, explica o professor.

Para além das questões de agricultura, o presidente visa expandir as relações com o país em outros aspectos, por ser algo de interesse mútuo entre as nações. “A China vê o Brasil como um mercado relevante para um campo em expansão, que são os carros elétricos e as tecnologias a si associadas, tal como também investimentos em outras áreas caras ao governo na área de meio ambiente, que são as energias limpas e também em infraestrutura”, Teixeira salienta.

A estratégia do governo é, acima de tudo, se mostrar presente para o comércio internacional, apresentando todas as possibilidades de interação com o gigante asiático. Como diz o especialista, a viagem acaba sendo mais relevante para o Brasil do que para a própria China. “Caso consigamos aumentar o nosso volume de exportações de valores para a China, quer dizer que as nossas reservas em dólar, o nosso recurso em moeda estrangeira no Brasil aumenta. O que é importante como um colchão de segurança para a nossa economia. Se a China aumentar os investimentos externos diretos no Brasil, como na indústria automotiva, especialmente de carros elétricos, baterias e ferro associados, você pode ter uma expansão numa indústria emergente no mundo gerando empregos, investimentos e inclusive inovação em ciências e tecnologia no Brasil.”

Acordos

O Brasil havia sugerido a assinatura de cerca de 30 acordos entre os dois países, mas o governo chinês preferiu reduzir a lista. Entre os mais relevantes estão os termos associados ao agronegócio, exportação de commodities como soja e proteína animal, que são de interesse do país anfitrião. Ainda há uma série de acordos que os dois governos enxergam como vantajosos no campo das tecnologias. “A China não mais é uma economia de cópia, mas é uma economia que tem um setor que consegue inovar, produzir tecnologia e ter meios de alto impacto na sua economia, como por exemplo, fronteira na área da computação quântica, supercomputadores, tecnologia espacial, microprocessadores, semicondutores, entre outros aspectos, assim como tecnologias no campo das telecomunicações, como a tecnologia 5G.”, analisa Teixeira.

Dilma no NBD

Além da visita a Pequim, o presidente passará em Xangai, onde irá se reunir no Novo Banco de Desenvolvimento (NBD), o banco dos BRICS, que será presidido pela ex-presidente Dilma Rousseff. A indicação foi feita por Lula logo quando ele assumiu o mandato no Brasil, e a confirmação de sua indicação foi feita nesta sexta-feira (24). Seguindo uma ordem de indicação para a presidência do banco, a última escolha havia sido do diplomata Marcos Troyjo, pelo ex-presidente Jair Bolsonaro. 

“O presidente [Lula] coloca lá alguém fortemente alinhado aos interesses do Brasil especialmente na tentativa de ter no Banco dos BRICS um importante investidor em projetos de infraestrutura e tecnologia no Brasil, e nesse sentido ter a ex-presidente Dilma na presidência do banco facilita a conexão Brasil-BRICS e recursos provenientes desse banco.”, explica o professor Augusto Teixeira.

O cientista político ainda analisa que a decisão de indicar a ex-presidente da República para um cargo executivo como esse, relativamente longe da política nacional, pode ser benéfica para o Brasil no longo prazo. “Ademais, ao ter a Dilma na China, em Xangai, você tem uma figura política controversa longe do cenário político nacional. Então de certa forma o presidente, caso tenha êxito, ele ganha de dois lados.”, finaliza.

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