Neymar é diferente da Maria da Penha: o projeto e a Lei

Projeto de Lei protocolado nesta última quinta-feira (6), despertou o "Neymar da Penha" diante de um país onde já existe a Maria da Penha

por Jameson Ramos sex, 07/06/2019 - 19:56

O Projeto de Lei que foi protocolado na Câmara dos Deputados nesta última quinta-feira (6), batizado pelos internautas como “Neymar da Penha”, visa endurecer as penas de uma lei que já existe no Brasil contra o crime de denunciação caluniosa. A PL tomou as redes sociais e conversas de amigos por conta do suposto estupro sofrido pela modelo Najila Trindade que, além do abuso sexual, também acusa o jogador Neymar Júnior pelo crime de agressão.

O crime de denunciação caluniosa se configura quando a pessoa faz a comunicação de um crime que, na verdade, não aconteceu, gerando uma investigação policial ou administrativa, processo judicial, inquérito civil ou ação de improbidade administrativa contra alguém (inocente). O caluniador dessa história pode ser responsabilizado pelo crime que está previsto no artigo 339 do Código Penal, estando sujeito a uma pena de 2 a 8 anos de prisão - além de multa.

Foi o deputado Carlos Jordy (PSL-RJ) quem protocolou a PL 3369/19 que visa agravar a pena de denunciação caluniosa de crimes contra a dignidade sexual. No entendimento do pesselista, o atacante Neymar está sendo vítima da mulher que está - segundo Carlos -, querendo "ganhar seus minutinhos de fama". Se o projeto for aprovado, os processados poderão ter a pena aumentada em até 1/3.

No entanto, o nome que o Projeto de Lei ganhou (dos internautas) não vem agradando parte da população. Alguns afirmam que isso demonstra total desrespeito a Lei 11340/2006, batizada de Lei Maria da Penha, que está em vigor no Brasil há 12 anos (prestes a completar 13 anos em agosto). É ela a responsável pelo fortalecimento do combate à violência doméstica e familiar que muitas mulheres sofrem no Brasil. Para se ter ideia, antes da Maria da Penha, as agressões dos maridos contra as suas esposas eram considerados crimes de menor potencial ofensivo, muitas vezes o acusado respondia o crime em liberdade, como foi no caso da farmacêutica inspiradora da Lei, Maria da Penha.

Ela foi vítima de dupla tentativa de homicídio (na época) por parte do seu então marido, o colombiano Marco Antonio Heredia Viveros. Maria da Penha levou um tiro do marido enquanto dormia, foi mantida em cárcere privado e quase foi eletrocutada pelo companheiro enquanto tomava banho. Mesmo paraplégica, Penha conseguiu se tornar um símbolo de resistência e luta pelo fim das agressões domésticas.

Décadas após as agressões sofridas por Maria da Penha, sua história e resiliência serviram para a criação da lei que leva o seu nome. De acordo com o advogado, professor e especialista em ciências criminais Rodrigo Diniz, a Lei 11340/2006 é tida como uma ação afirmativa e visa o princípio da igualdade e equidade entre homem e mulher. “Muita gente ainda não entende que bater em mulher é crime, mas a lei está aí para confirmar isso”, diz.

Quando a Lei estava prestes a completar 10 anos, o Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (IPEA) divulgou uma pesquisa que avaliava a efetividade da lei. De acordo com o órgão, mesmo a Lei Maria da Penha não tendo como foco o homicídio de mulheres, os resultados indicaram que a Lei fez diminuir em cerca de 10% a taxa de homicídios contra as mulheres dentro das residências no Brasil.

Até a década de 70, a tese de legítima defesa de honra era aceita nos tribunais para inocentar maridos que assassinavam seu cônjuge. Segundo levantamento do IPEA, até a sanção da Lei Maria da Penha, os incidentes de violência doméstica eram julgados segundo Lei nº 9.099/1995, sendo considerados crimes de menor potencial ofensivo, nenhuma medida protetiva era oferecida à vítima.

Nesse mesmo tempo, quando os acusados eram condenados tinham suas penas reduzidas ao pagamento de cestas básicas - o que acabou de vez em 2006. "A Lei Maria da Penha modificou a forma de como o Estado tratava os casos envolvendo a violência doméstica: aumentou o custo de pena para o agressor; aumentou o empoderamento e as condições de segurança para que a vítima pudesse denunciar; aperfeiçoou os mecanismos jurisdicionais,  possibilitando que o sistema de justiça criminal atendesse de forma mais efetiva os casos envolvendo violência doméstica", pontua o IPEA.

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