Vale condenada a pagar empregado que viu morte de colegas

O trabalhador estava próximo ao refeitório da sede da empresa em Brumadinho quando houve o rompimento da barragem da Mina do Córrego do Feijão

sab, 30/05/2020 - 12:48
Ricardo Stuckert Vale deverá pagar R$ 100 mil por danos morais ao trabalhador Ricardo Stuckert

A Vale S.A. foi condenada a pagar indenização por danos morais de R$ 100 mil a funcionário de uma construtora contratada pela mineradora, divulgou o Tribunal Regional do Trabalho da 3ª Região (TRT). O trabalhador estava próximo ao refeitório da sede da empresa em Brumadinho quando houve o rompimento da barragem da Mina do Córrego do Feijão. Ele correu e conseguiu se salvar.

A juíza Renata Lopes Vale, titular da 5ª Vara do Trabalho de Betim, destacou que o empregado foi exposto a situação de extremo perigo, com possibilidade de morte iminente e prematura, "além de ver destruído o local de trabalho, com a morte de colegas, o que lhe gerou danos morais passíveis de reparação."

Na decisão, a magistrada ressalta que as consequências do desabamento da barragem ainda são incalculáveis. "Centenas de pessoas morreram, outras muitas ficaram feridas, com milhares de vidas afetadas, além das consequências ambientais, econômicas e sociais que advieram do sinistro", disse.

Duas testemunhas confirmaram que o trabalhador estava no local do rompimento. Ele tinha acabado de sair do refeitório e estava do lado de fora, quando escutou o barulho da explosão e ouviu um rapaz gritando e dizendo que a barragem tinha estourado. O autor da ação e alguns companheiros correram em direção à subestação, que fica em local mais alto, e conseguiram se salvar.

De acordo com a juíza, o direito à reparação por danos é cabível quando se prova a culpa ou dolo do agente, a ofensa a um bem jurídico e a existência de nexo causal entre a ação ou omissão antijurídica do agente e o dano causado. Uma vez detectado o dano e provada a culpa, ocorre a obrigação de reparação ou ressarcimento a fim de se compensar, na medida do possível, os prejuízos causados.

No caso, a julgadora ressalta que é dispensável o exame da culpa ou dolo da Vale, porque, tratando-se de companhia mineradora, a queda de barragem é risco inerente à atividade econômica de mineração, incidindo a responsabilidade objetiva da empresa, nos termos do artigo 927 do Código Civil, conforme, inclusive, jurisprudência do TRT mineiro e do TST.

Além disso, para a juíza, a ré não agiu de forma a prevenir as mais graves consequências do rompimento da barragem em Brumadinho. "Nesse sentido, a construção e manutenção das unidades utilizadas pelos trabalhadores em área extremamente vulnerável, como manutenção do refeitório em área de risco, por exemplo, que viola frontalmente a Norma Regulamentadora nº 24 do MTE", destacou, citando a previsão presente na norma: "O refeitório deverá ser instalado em local apropriado, não se comunicando diretamente com os locais de trabalho, instalações sanitárias e locais insalubres ou perigosos". A magistrada ainda chamou atenção para o fato de que, conforme relato de uma testemunha, não houve treinamento prévio para esse tipo de acidente.

Para a magistrada, a situação vivenciada pelo trabalhador lhe gerou tristeza e sofrimento moral, caracterizando o nexo de causalidade entre o dano e o acidente ocorrido. Para fixar o valor da indenização, a julgadora levou em conta as condições das partes envolvidas e as circunstâncias em que ocorreu a tragédia. Já houve recurso, em trâmite no TRT.

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