Juros abusivos: empréstimo via cartão se espalha em PE

Valores cobrados não seguem nenhuma regra ou base mínima, é de acordo com o que cada um queira

qui, 05/04/2018 - 12:21

“Troque seu limite do cartão de crédito por dinheiro”. O anúncio, que parece atrativo para quem quer dinheiro vivo, está espalhado nas paradas de ônibus e muros da Região Metropolitana do Recife. Mas como se consegue trocar o limite do cartão por dinheiro? Esse tipo de serviço é lícito? 

"Se você precisa de dinheiro vivo e tem limite no cartão de crédito, pode trocar o saldo disponível por dinheiro. Eu vou até você com a maquineta, passo o cartão e o valor conseguido liberado é pago em prestações que vão até 12 vezes. Mas quanto maior o número de parcelas, maior os juros que você vai pagar", diz um dos que oferecem o serviço, que se identifica como "consultor financeiro".



Os juros não seguem nenhuma regra ou base mínima para serem cobrados, é de acordo com o que cada um queira. Quem quiser mil reais, por exemplo, tem que ter disponível no limite do cartão de crédito pelo menos R$ 1.400, porque R$ 400 são dos juros. “O trâmite é como se você estivesse comprando numa loja normal, só que com a gente você vai pegar o dinheiro. Passa mil e quatrocentos e pega, em dinheiro vivo, mil reais; pode confiar, não é furada”, diz. 

Segundo a delegada Beatriz Gibson, titular da Delegacia de Crimes Contra o Consumidor, a ilusão do 'dinheiro fácil' dura pouco. "Esses empréstimos clandestinos cobram juros altíssimos, já que não seguem a base de juros do Banco Central. Dois dias depois o consumidor se arrepende, quer voltar atrás e não conseguem mais”. Para ela, não há nada que a polícia possa fazer nestes casos. "Não tem como responsabilizar o 'vendedor', já que não houve pressão nem ameaças. As pessoas viram aquele anúncio e foram até esses agiotas por vontade própria”, explica.

Porém, para o Gerente de Fiscalização do Procon, Roberto Campos, esse é um ato de desvirtuação da finalidade dos cartões de crédito. "Serve como método de pagamento para a aquisição de bens ou serviços; por isso a caracterização de agiotagem. É simulada uma operação, como se fosse a contratação de um serviço, que não existe".

Mas erra quem pensa que as máquinas de cartão estão ligadas a estabelecimentos suspeitos. Segundo Beatriz Gibson, "é muito comum constar na fatura (depois do empréstimo) que a operação foi realizada por restaurantes”.

Ao ligar para alguns dos números que encontrou nas ruas da cidade, a reportagem do LeiaJá constatou que eles detém vários pontos no Recife, Paulista, Olinda e Jardim Atlântico; e com o “diferencial” de levar o dinheiro até o local em que o contratante quiser. “A gente trabalha de forma correta, com nota fiscal e tudo mais. Até declarar imposto à Receita Federal a gente faz”, informou um dos "consultores".

Além dos anúncios colados pelas ruas, alguns contratam promotores para distribuir panfletos nas ruas. Um dos que contactamos tem ponto fixo na Dantas barreto (Centro do Recife), além de outras cidades do Estado.

Roberto Campos, do Procon, acredita que a procura por esse serviço é um exemplo do desespero de muitos brasileiros. "Boa parte da população está super endividada e procura esse serviço, fazendo dívidas por cima de dívidas".

A exemplo da delegada, Campos diz que o Procon não pode impedir que isso aconteça. "A gente não tem muito o que fazer porque quem procura esse tipo de serviço é o consumidor e não há uma regulamentação do Estado para isso".

Se a pessoa usar o limite do cartão de crédito para pegar dinheiro e não receber, esse serviço pode ser cancelado pelo próprio consumidor, ligando diretamente para a administradora do cartão. “Se acaso não conseguirem solucionar esse problema, elas podem procurar a Delegacia do Consumidor para que possamos tentar solucionar”, aconselha Beatriz Gibson.

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