Luciana Browne

Luciana Browne

Direito do Consumidor

Perfil: Sócia fundadora da Browne Advocacia e Consultoria. É mestre em Direito Privado pela UFPE e professora na Escola de Magistratura de Pernambuco e da Faculdade Maurício de Nassau. É também presidente da Comissão de Ensino Jurídico da OAB/PE.

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O aumento das mensalidades dos planos de saúde em “contratos novos e antigos”

Luciana Browne, | sex, 16/09/2011 - 13:41
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Atualmente, verifica-se que os chamados “contratos novos” de planos de saúde representam a maioria das relações estabelecidas com as operadoras de saúde. São chamados assim aqueles contratos firmados entre o consumidor e a empresa antes de 1º de janeiro de 1999[1]. Os demais, aqueles anteriores a essa data, são classificados de “contratos antigos”. Mas qual seria a diferença prática do ponto de vista jurídico entre esses contratos?

Ocorre que os “contratos antigos” não seriam atingidos pelas disposições normativas previstas pela Lei dos Planos de Saúde (Lei nº 9.656/98), ficando, portanto, à margem da intervenção direta da ANS (Agência Nacional de Saúde Suplementar – criada pela Lei 9.961/2000).

Logo, os “contratos antigos” estariam órfãos do intervencionismo da agência reguladora, em matérias delicadas, que vão desde o controle do aumento dos planos de saúde até o rol de procedimentos mínimos a serem custeados por essas empresas.

Em síntese, na hipótese de estarmos restritos à aplicação da Lei 9.656/98 e às normas da ANS, o cenário jurídico estaria delineado da seguinte forma: os “contratos novos” ficariam sob o manto da chancela da agência reguladora, e os “antigos” ao alvedrio das condições gerais previstas nos contratos de adesão, ou seja, subordinados ao estabelecido contratualmente.

Por outro lado, não se pode nem se deve deixar de lado que essas relações contratuais têm natureza consumerista, portanto, são regidas pelo Código de Proteção e Defesa do Consumidor, lei de ordem pública e de interesse social. Assim, independente da intervenção da ANS ou da aplicabilidade da Lei 9.656/98, o CDC deve ser aplicado aos chamados “contratos novos e antigos”, indistintamente, com o propósito de fazer prevalecer o equilíbrio contratual.

Com efeito, não é correto afirmar que os “contratos antigos” estão condenados ao pacta sunt servanda, pois essa assertiva iria de encontro aos princípios que regem as relações contratuais, notadamente ao princípio da equivalência material dos contratos, da boa-fé objetiva e da função social das relações negociais.

Desse modo, o usuário de plano de saúde (independente de se tratar de contrato “novo” ou “antigo”), que se sentir preterido por um aumento abusivo imposto pela operadora de saúde ou mesmo impedido de ter acesso a determinado tratamento médico-hospitalar, deve procurar o Judiciário, a fim de compelir o plano ou seguro a seguir o previsto no Código de Proteção e Defesa do Consumidor.

Todavia, não obstante o CDC incidir nesses negócios jurídicos de forma indistinta, o consumidor precisar ficar atento, já que, administrativamente, as operadoras de saúde (planos e seguros) vêm atuando da seguinte forma, inclusive, com o crivo da ANS:

Quanto ao aumento das mensalidades, as operadoras de saúde alegam aplicar reajuste por variação de custos e ainda levando em consideração a inflação anual. Para tanto, repassam o aumento para o consumidor ano a ano, considerando a data de aniversário de cada contrato. Além desse aumento, o consumidor ainda sofre o reajuste por faixa etária[2]. Logo, são dois aumentos anuais.

O aumento imposto aos “contratos novos” só ocorrem mediante autorização prévia da ANS. Já os “antigos” seguem o índice previsto contratualmente, a exemplo do IGPM, IPC etc. Caso não haja disposição contratual expressa nesse sentido, a operadora deve aderir a um acordo coletivo firmado junto à ANS ou fixar o teto do reajuste previsto para os “contratos novos”.

Portanto, os consumidores que mantêm contratos “antigos” devem ficar atentos a esses aumentos. O mesmo ocorre com os chamados “contratos coletivos”, aqueles estabelecidos para um grupo/classe ou categoria, através de uma empresa e a operadora. Nestes contratos, os reajustes se dão de acordo com o índice estabelecido na negociação, ficando a operadora apenas com a obrigação de comunicar o aumento à Agência reguladora.

Nesse ano, o reajuste autorizado pela ANS (aplicável de maio de 2011 a abril de 2012), a partir do aniversário de cada contrato, chegou a 7,69%. Foi o maior aumento dos últimos 04 anos[3]. Algumas operadoras de saúde ainda firmaram acordo coletivo com a ANS fixando o percentual do aumento para os “contratos antigos” variando entre 7,15% a 7,35%.

O fato é que os usuários a cada ano arcam com um custo mais elevado com os seus respectivos contratos de saúde, sem, contudo, receberem como contraprestação um serviço adequado. As operadoras, por sua vez, não repassam esses aumentos sucessivos aos prestadores diretos dos serviços, já que os preços pagos aos profissionais e empresas de saúde são publicamente conhecidos pela sua insignificância frente à natureza da prestação e o valor pago pelo usuário à operadora.

Pelo que se pode extrair dos depoimentos recorrentes dos dois pólos dessa relação tripartida estabelecida por intermédio das operadoras de saúde, quais sejam, os médicos e os pacientes, é que essa situação não pode perdurar, ante o seu manifesto desequilíbrio. E como mudar essa realidade? Por meio de um manifesto popular? Da intervenção do Ministério Público? E a ANS, o que tem feito? É um caso a se pensar.

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