Tópicos | Charles Esche

Ao contrário do usual, a Bienal de São Paulo do escocês Charles Esche e seu time de seis curadores que atuam de forma igualitária e sem hierarquias, não ocupará linearmente o prédio de Oscar Niemeyer com obras ou artistas separados por paredes divisórias. O projeto do curador-arquiteto Oren Sagiv propõe a compartimentação do espaço em três áreas, como se fossem três diferentes exposições ou experiências, que estão sendo moldadas de acordo com as obras ou projetos ainda em processo de execução por artistas pelo Brasil e mundo a fora. A abertura do evento acontece a 6 de setembro.

A ideia é que os visitantes fiquem menos cansados, mais orientados e que haja uma maior intimidade entre o público e a história contada em cada projeto. Segundo Esche, é como dividir um livro em capítulos. E, de acordo com a curadora israelense Galit Eilat, que tem todos os gráficos arquitetônicos em seu laptop e é quem está todo o tempo ligada eletronicamente com os artistas, as áreas próximas à rampa, nos três andares, formará um espaço independente e haverá obras ocupando verticalmente os três andares. Algumas paredes ganharão cores, tudo em sintonia e harmonia com os artistas. As próprias paredes e os trabalhos, de forma orgânica e tranquila, deverão indicar ao visitante o caminho a seguir e facilitarão a observação das obras.

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Também ao contrário do usual, o grupo de curadores não despacha todos os dias nos escritórios do prédio da Bienal. Depois de terem viajado o Brasil de norte a sul, de terem descoberto artistas desconhecidos através de encontros e conversas organizadas em cada estado, e sem recorrer a galerias estabelecidas, o time pode se reunir na Casa do Povo, uma escola fundada por judeus no Bom Retiro, na casa alugada onde três deles se hospedam, no Sumaré, em parques onde podem "sentir" a cidade ou num prédio da Faap no centro, próximo a Praça do Patriarca onde alguns artistas fazem residência.

Partindo da constatação de que o mapa das artes mudou totalmente em eras pós globalizadas, que não são Paris ou Nova York que ditam a arte para o mundo, mas que a criatividade e a imaginação podem estar em lugares como África, Indonésia, Líbano, Egito ou outros tantos, Charles Esche é da opinião que as Bienais, para sobreviver, têm de inventar uma nova razão de viver.

Não é preciso se preocupar em mostrar o melhor do mundo. São hoje, a seu ver, apenas uma ferramenta para contar uma história, mostrar a temperatura do momento e a diversidade de linguagem entre os artistas. Têm de ser um retrato do contemporâneo e não podem olhar para trás. E os artistas, não importa de que canto do mundo venham, têm de mostrar como lidam com tópicos ligados ao ambiente em que vivem. Esche acredita também que a arte, embora não seja política, pode ter uma influência positiva sobre a política, provocando a imaginação, fazendo com que tanto a direita como a esquerda se emancipem, possam fazer algo novo e deixem de se apegar ao passado. "A arte deve refletir a ideia de um momento de transformação no mundo."

O trabalho da pernambucana Ana Lira, entre alguns dos nomes anunciados em primeira mão pela reportagem, como os dos brasileiros Marta Neves e Eder Oliveira, dos libaneses Walid Raad, Tony Chakar e da egípcia Anna Boghngian, discorrerá sobre a fugacidade da política. Seu trabalho constará de uma série de fotografias de cartazes com o rosto de políticos espalhados pelas ruas do Recife, alguns desbotados pelo sol, outros grafitados ou com os olhos arrancados em interferências feitas por passantes. Impressas em material transparente, as fotografias de Ana Lira mostram como tudo é mutável e pode desaparecer na paisagem urbana, estarão expostas em paredes também transparentes. Para Esche, uma arte como essa, trabalhada em cima de acontecimentos, e a fotografia sendo usada para fazer arqueologia, pode conceitualmente colocar os políticos em seus devidos lugares.

O trabalhos da egípcia Anna Bognghian, descoberta por Galit Eilat numa viagem a Cartagena, giram em torno da vida dos ribeirinhos às margens dos grandes rios e sua relação com a vida em metrópoles como Cairo, Nova Délhi e São Paulo.

Atualmente excursionando e registrando através de desenhos pelo Rio Amazonas, Anna já fez o Nilo, no Egito, e o Ganges, na Índia. Para falar de democracia, a artista usa como metáfora a colmeia das abelhas onde a abelha rainha impõe um sistema monárquico.

Já o libanês Walid Raad faz um questionamento em cima da arte no mundo árabe, onde, à base do dinheiro, estão sendo criadas coleções milionárias e grandes fundos de pensão voltados para a arte. Estaria sendo criada na região, em torno desse fenômeno, uma tessitura entre o real e o fictício, e sendo imposta uma história onde ela não existe. Raad cria objetos com forte impacto visual que podem ser considerados pinturas e que usam a proporção e a sombra como elementos de apoio.

Já é possível adiantar que os 70 projetos que vão compor a Bienal abrigarão 250 obras, entre pinturas, desenhos, objetos ou vídeos, de 100 artistas de diferentes gerações, alguns deles trabalhando em conjunto. Dos 50% dos trabalhos feitos especialmente para a Bienal, 25% são de brasileiros e estão em fase de execução, o que aumenta o clima de expectativa e surpresa até mesmo para os curadores. A ideia é compor a Bienal com artistas menos atrelados ao sistema monetário. As diferentes proveniências dos artistas brasileiros devem aportar para a Bienal uma narrativa nacional, talvez desconhecida até dos brasileiros.

De boa paz com o mundo, o escocês Charles Esche, que torce pelo "sim" no referendo marcado para setembro próximo que decidirá sobre a independência de seu país do Reino Unido, "pois é preciso acabar com essa coisa de império britânico", tenta não ultrapassar os limites do orçamento de que dispõe a Bienal. À vontade no Brasil e desde sempre um amante do futebol, anda à cata de entradas para os jogos da Copa. Pergunto se o curador contemporâneo não seria de certo modo também um artista. Sua resposta é não. Nem apenas um mero organizador. Seria uma pessoa que atua entre o público e o artista para manter a discussão sobre o papel social da arte. As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.

"Não temos um tema, mas um título, e decidimos ir atrás de trabalhos e experiências sobre a nossa condição no mundo, de conflito", afirma o escocês Charles Esche, curador da 31.ª Bienal de São Paulo, prevista para ser inaugurada em 6 de setembro. O cartaz da edição, com desenho do artista indiano Prabhakar Pachpute, diz em português e inglês a sentença: "Como falar de coisas que não existem" - e o verbo da frase, frisa a equipe curatorial da mostra, vai ser mudado ao longo do ano, transformando o título em algo dinâmico. "Acho que podemos dizer que a arte nos dá capacidade para a imaginação, nos permite imaginar situações, o que nos faz sentir contemporâneos", completa Esche.

Para a exposição brasileira, a segunda bienal mais importante do mundo - ficando atrás da "mãe" das bienais, a de Veneza -, Charles Esche indica algumas rupturas naturais, parte do que significa ser contemporâneo. A mostra, com orçamento de R$ 24 milhões, terá entre 75 e 80 projetos - e não obras específicas, já que a maioria dos artistas convidados trabalha em grupo (a lista não está fechada, mas a maior parte dos participantes será de brasileiros, diz Esche).

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Não veremos também o "olhar retrospectivo" para o modernismo nesta edição. "É a primeira Bienal de São Paulo que está sendo feita depois que Niemeyer não está mais nesse planeta. E isso é simbólico. Ele morreu, como o modernismo", afirma o escocês, que ganhou, na semana passada, o prêmio Audrey Irmas por Excelência Curatorial, do Center for Curatorial Studies do Bard College de Nova York. "Há muitos artistas na Europa, ou mesmo no Brasil, que ficam cavando os arquivos para ver se conseguem encontrar uma pequena joia, ou um fato obscuro, que mostre como o modernismo é incrível. É como dizer que não temos futuro. Sinto a arte estagnada nesse tipo de pensamento, é entediante", afirma Esche. "Nossa vontade de fazer essa ruptura se dá porque o próprio mundo fez essa ruptura, o mundo mudou."

A menção feita pelo curador a Oscar Niemeyer não é fortuita - a Bienal de São Paulo tem como casa o monumental edifício da década de 1950 projetado pelo arquiteto no Parque do Ibirapuera. O pavilhão da Bienal vai se transformar em "espaço para imaginação coletiva" durante o período expositivo, entre 6 de setembro e 9 de dezembro. "Pense na exposição como um espaço para se imaginar junto, e por isso a mostra não vai se espalhar pela cidade", diz a israelense Galit Eilat, que integra a equipe curatorial da 31.ª Bienal ao lado dos espanhóis Nuria Enguita Mayo e Pablo Lafuente e do arquiteto Oren Sagiv, que, também natural de Israel, é responsável pelo projeto arquitetônico da edição do evento.

Colapso

"A arte é apenas decoração para 1% do mundo ou outra coisa?", pergunta Charles Esche. Autor do livro Art and Social Change: A Critical Reader (Afterall/Tate Publishing) - sobre arte e mudanças sociais -, diretor do museu Van Abbe de Eindhoven, na Holanda (do qual está afastado este ano), e curador com experiência nas Bienais de Riwaq, na Palestina, de Istambul, na Turquia, e de Gwangju, na Coréia do Sul, Esche afirma que a mostra terá artistas de várias partes do mundo, mas com menos ênfase nos dos Estados Unidos ou do Norte da Europa: "Eles já têm muitas oportunidades". Outra característica do processo curatorial é a realização de encontros abertos com a comunidade artística de cidades como Recife, Belém, Salvador, Brasília e Belo Horizonte.

Algumas questões vêm à tona na era dos conflitos e de ondas de protestos em todo o mundo, segundo Esche. "Existe muita coletividade, colaboração hoje no mundo, é isso se dá através da internet", explica Esche. "Nesse momento, existe um equilíbrio entre dois pensamentos: o de que nada poderá ser mudado, e igualmente, do outro lado, de que as coisas não podem continar como são, têm de mudar."

A equipe curatorial apresentou ao Estado como exemplo de trabalho para a 31.ª Bienal o projeto do artista israelense Yochai Avrahami (1970), que vai ao Museu do Escravo, em Belo Horizonte, para iniciar sua pesquisa.

"Um dos sintomas do momento contemporâneo é o colapso do modo de representar a democracia, sonhos e aspirações, como vimos com as pessoas indo às ruas aqui, em Istambul, ou antes em Nova York ou Madri", diz Galit Eliat.

"Yochai está trabalhando sobre a representação e narrativas, olhando museus que são memoriais, que tratam de catástrofes e tentam apresentar o sofrimento humano, mas que são vozes de quem, afinal?", pergunta a curadora. Já o desenho do artista Prabhakar Pachpute (1986) para o cartaz da mostra é uma torre carregada por homens em seu interior, como os trabalhadores das minas de "ouro negro" de sua região natal na Índia.

As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.

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