As recentes revoltas no mundo árabe, apelidadas de Primavera Árabe, contagiaram 2000 pessoas ou 4000 mil pessoas no Rio de Janeiro. Segundo relatos, três jovens cariocas decidiram imitar as ações dos jovens árabes (Mas não foram só jovens!) e convocaram através das redes sociais uma macha contra a corrupção na República brasileira.
A expectativa quanto ao sucesso da passeata era grande. Os seus organizadores e parte da imprensa especularam que cerca de 30 mil pessoas poderiam participar da passeata. Ontem à noite, na Rádio CBN, após a passeata, escutei: “Segundo a Polícia Militar, 2000 pessoas participaram. Segundo os organizadores, 4000 pessoas participaram”. Conclusão: 26000 ou 24000 pessoas deixaram de ir à passeata contra a corrupção.
Os cientistas sociais precisam perguntar sempre: qual é a razão de dado evento? Neste caso, por que apenas 4000 mil (Optei por ficar com a contagem dos organizadores) pessoas foram à passeata contra a corrupção? Uma causa óbvia: em várias regiões do Brasil, as quatro estações não existem de fato. Por exemplo: no Rio de Janeiro e em Recife só existem verão e inverno. Portanto, não é possível existir uma primavera brasileira ou uma primavera carioca.
Outra causa: qual é o tamanho do interesse brasileiro em enfrentar a corrupção? Em surveys, certamente, a maioria dos brasileiros vai afirmar que não admitem atos de corrupção.
Em pesquisas qualitativas, é possível identificar, ao cruzar os resultados da pesquisa qualis com a pesquisa quanti, que boa parte dos brasileiros é tolerante com a corrupção. Portanto, é politicamente correto ser contra atos de corrupção. Mas isto não significa que o indivíduo não pratique ou tolere atos de corrupção.
Não esqueçam: o Brasil é o País do “Jeitinho brasileiro”. Como bem mostra a antropóloga Lívia Barbosa, os brasileiros buscam costumeiramente o “jeitinho” para superar etapas burocratas e para conquistar vantagens. Portanto, estas práticas são caracterizadas como corrupção.
O Brasil é também um País hierárquico. Diante do conflito, como bem argumenta Roberto DaMatta, o “Sabe com quem está falando?” pode ser utilizado e, infelizmente, prevalecer. “O sabe com quem está falando?” é mais uma prática social caracterizada como corrupção.
Não tenho dúvidas de que somos solidários, principalmente em festividades como Natal e ano Novo. Nestas festas, damos presentes, praticamos filantropia. Somos plurais, igualitários e tolerantes, em particular no Carnaval. No Carnaval, os foliões se abraçam, se beijam, bebem e gritam, independente da profissão, da cor e da classe social.
Após os festejos do final de ano e o Carnaval, os brasileiros, ou melhor, partem deles, voltam a ser o que são: batalhadores (Características das classes C e D), estatistas sonhadores e hierárquicos (Características das classes B e A) e desprovidos de responsabilidades públicas (Características de todas as classes).
É óbvio que as características sugeridas por classes estão se transformando (Mutação de valores) em razão do desenvolvimento econômico dos últimos 20 anos. Entretanto, estas transformações ainda não foram suficientes para possibilitar a reunião de um grande contingente de pessoas contra a corrupção. Afinal, a corrupção atinge todos os brasileiros. Portanto, todos devemos agir contra ela.