Em 18 anos de carreira, os meninos do Mombojó já "dançaram em cima de uma faca molhada de sangue" (em seu primeiro disco que debuta este ano), trocaram o conforto de casa para morar em outras partes do país e viram o grupo se modificar com a morte prematura de O Rafa, em 2007, e a saída de Marcelo Campello no ano seguinte. Durante esse tempo, eles também lançaram cinco discos, fizeram experimentações com os mais diversos estilos de música, se apresentaram em palcos do Norte ao Sul do Brasil e estreitaram os laços com a política ao musicar um discurso do candidato à presidência Fernando Haddad, derrotado nas eleições de 2018.
Hoje, chegando à maioridade, Felipe S (guitarra e voz), Marcelo Machado (guitarra e voz), Missionário José (baixo e voz), Chiquinho Moreira (teclado e vocoder) e Vicente Machado (bateria e voz), já nem tão ‘meninos’ assim, se preparam para lançar o sexto álbum da carreira. MMBJ12 está sendo apresentado ao público em doses homeopáticas. Bem ao estilo ‘moderno’ de se fazer música, a banda está lançando singles a cada mês, todos acompanhados de clipes, como Nunca vai embora, O valor da coragem, e a mais recente, Tudo vai mudar.
##RECOMENDA##
No próximo sábado (14), o Mombojó mata a saudade do público pernambucano com um show no festival MECABrennand, que será realizado na Oficina Cerâmica Francisco Brennand. O vocalista do grupo, Felipe S., falou em entrevista exclusiva ao LeiaJá, sobre os 15 anos do primeiro disco, Nadadenovo; as transformações que a banda vivenciou em quase duas décadas de carreira, e a apresentação deste fim de semana.
LJ - Quando a banda lançou ‘Nadadenovo’ vocês todos eram muito jovens, como o disco soa pra vocês hoje, passados 15 anos?
Ele (o disco) mudou muito. Logo que a gente lançou, a gente dizia: ‘a gente vai tocar muito melhor no futuro’. Hoje em dia, novamente tocando esse disco, eu penso: ‘poxa, a gente fez uma coisa que eu nem percebia que era tão boa’. Mas hoje eu vejo o quanto já era bom. E era um momento de muito incentivo, 2003, primeiro governo Lula, primeiro governo do PT no Recife, a gente aprovou um projeto, a gente tinha um ambiente muito favorável para criar. As pessoas chamavam a gente pra fazer projetos, pra ganhar dinheiro (risos), Hoje em dia, tudo mudou totalmente, a gente só se deu conta 15 anos depois como aquilo era rico e foi muito bem aproveitado, criado por sete cabeças.
LJ - De lá para cá os fãs de vocês certamente se renovaram. Como é ver uma nova geração de fãs se identificando com o Nadadenovo?
Eu ainda não pensei exatamente em quem são os novos fãs. A gente se comunica muito com o pessoal que fez parte daquele 2004, que foi o ano de lançamento do disco, acho que esse disco foi uma coisa muito marcante daquele momento, quem viveu aquilo ali é que dá uma importância grande. Talvez quem não tenha vivido não dê a mesma importância, pelo menos é a impressão que eu tenho.
LJ - Quando vocês surgiram, eram conhecidos como uma ‘banda do Recife’, cria do manguebeat, hoje vocês não carregam mais esse título, até por terem saído do Recife, geograficamente falando, até onde as influências locais ainda impactam o som de vocês?
Eu acho que a gente ainda tem essa identificação forte pelo público da gente. As pessoas remetem muito, é uma coisa que tá implícita, que não tem como tirar. E Recife alimenta muito a gente, a gente gosta sempre de tentar acompanhar de alguma maneira e participar das coisas que acontecem aí. Agora a banda tem dois integrantes que voltaram a morar no Recife, Vicente, nosso baterista, chegou a tocar no Carnaval com Ylana Queiroga; é sempre bacana poder estar vendo as coisas se renovarem, essa é uma característica do Recife que não muda.
LJ - Em 18 anos a banda também teve seus processos de renovação...
É um processo natural para um tempo tão longo. É inevitável, você buscar outras referências, outros modos de fazer, por mais que eu me veja como um cantor bem reduzido assim, não tenho uma variedade muito grande do jeito de cantar e meu sotaque também está sempre ali - acho que isso é a coisa que menos muda -, ao longo da nossa carreira o sotaque vira uma característica muito forte. É importante, se a gente ficasse tentando repetir a fórmula do sucesso não ia dar certo.
LJ - Esse ano vocês musicaram um discurso do Fernando Haddad (O valor da coragem), como surgiu essa ideia ou foi mais uma necessidade de se colocar de maneira mais política?
Foi mais uma vontade que me bateu por ter sido um momento muito marcante. Eu estava no centro de São Paulo e vi uma multidão chorando ao meu redor, fiquei assistindo e fazendo parte daquilo, já tava olhando como um voyeur dizendo: ‘cara, é muito marcante’. Aquele discurso foi um momento que eu senti que ele estava sendo totalmente ele, parece que naquele momento não tinha ninguém dizendo o que ele precisava fazer, ele tava dizendo o que pensava. Depois, quando assisti com calma, achei muito poético. Aí fui editando, tirando as partes que ele falava mais partidariamente e pegando os trechos mais subjetivos. Foi bem bacana porque a gente tava fazendo sem a expectativa de gravar. Quando a gente mandou pra equipe do Haddad o pessoal rapidamente passou pra ele e ele assinou a autorização.
[@#video#@]
LJ - E ele gostou do resultado, depois da música gravada?
A gente mostrou pra ele antes de lançar. Fui na casa dele, toquei no violão, e ele me contou um pouco do que foi aquele momento. Ele me disse que foi um dos momentos mais importantes da vida dele pela responsabilidade de guiar aquela parte da população que tinha perdido a eleição mas que precisava se manter forte pra enfrentar o governo grotesco de pessoas sem idéias que iria assumir.
LJ - Você mencionou a época de lançamento do primeiro disco de vocês, em 2004, um momento muito diferente desse que vivemos hoje, com tão pouca atenção voltada para o fazer artístico e cultural. Como fica a vontade de criar e continuar fazendo arte diante desse contexto?
A gente tá tendo uma escassez total das oportunidades principalmente para a cultura que é sempre a pasta principal que sofre com redução de orçamento. Quando cortam, cortam logo na cultura. Na cabeça dos gestores, a cultura não é prioridade porque não dá retorno, o pensamento crítico não é uma coisa prioritária, o estereótipo de quem tem administrado o Brasil nos últimos anos tem sido esse. Por outro lado, é um momento que bota muito os artistas contra a parede, como na ditadura militar, e sai muita coisa boa. Acho que os próximos anos serão de muita dificuldade, mas também de abundância de bons disco e boas músicas.
LJ - Esse fim de semana vocês tocam no MECABrennand, o que o público que for ao show vai encontrar? O repertório para shows no Recife tem que ser especial?
A gente tem muitas músicas, então quando o show é só nosso a gente toca no mínimo uma hora e meia, esse show vai ser mais reduzido porque é um festival, então a gente tenta tocar as músicas que nosso público gosta mais de maneira geral. Tô tentando pensar em uma coisa especial pra esse show, a gente tá espalhado por Bahia, São Paulo e Recife, então há uma dificuldade de ensaiar, mas a gente vai pensando essas coisas à distância e eu tô na missão de essa semana pensar uma coisa especial pra esse show.
Fotos: Divulgação