A vida é mais forte do que a arte. A conclusão poderia ser facilmente atribuída ao destino da cantora chilena Violeta Parra, que tem sua vida e obra tão bem delineadas em Violeta foi para o céu. Um retrato que ultrapassa as convenções das biografias cinematográficas, sendo, além disso, uma exposição da alma da artista. Mas quem acompanhou a carreira de Violeta sabe que a reflexão não se aplicaria ao seu comportamento enquanto viva.
A luta para preservar o folclore e a cultura tradicional de seu país fizeram da cantora um mito no Chile, equivalente a uma Edith Piaf na França. Em quase duas horas de filme, o diretor Andrés Wood costura as fases da vida da artista numa narrativa não-linear que, de imediato, pode não situar o espectador, mas logo em seguida se firma como um recurso convincente, que não compromete a fluidez e o entendimento do filme. A infância conflituosa ao lado do pai, a morte da filha ainda bebê, as experiências artísticas na França e na Polônia, sua viagem pelo interior do Chile e o romance com o músico suíco Gilbert Favre são intercalados com trechos de uma entrevista à televisão chilena em 1962. Violeta realizou sua primeira mostra de telas e bordados no Museu do Louvre, vivendo alguns anos na Europa e para isso, tendo que deixar os filhos ainda pequenos.
##RECOMENDA##A sequência desses acontecimentos ganha vida na tela como uma sobreposição de imagens, tornando a montagem bem sucedida por apresentar um caleidoscópio da vida carregada de Violeta, quase sempre carente de sossego e insatisfeita por natureza. Depois de alcançar prestígio em palcos internacionais, a cantora volta ao seu país e se dedica à construção de uma tenda nos arredores de Santiago, onde se apresentavam músicos folclóricos. A iniciativa faz parte da insistência numa jornada para salvar e manter aquilo que vê como alimento de sua alma e a essência de seu povo, a arte chilena. A fotografia fria da película reflete o espírito quase sempre melancólico e cansado de Violeta, que, com seu temperamento inquieto e amor visceral pela arte, se perde nos limites entre sua vida e obra.
Versões para as músicas da artista são cantadas no filme pela própria atriz, Francisca Gavilán. Sempre combinadas com o espírito emocional que permeia cada cena, as canções têm função importantíssima na película, uma vez que reforçam o cordão umbilical entre o papel da obra de Violeta e a forma que governou sua vida pessoal. Violeta foi para o céu não teria o mesmo mérito sem a excelente interpretação de Francisca, que, além da semelhança gritante com a verdadeira Violeta, se entrega de corpo e alma às contradições internas da protagonista, desempenhando com maestria o curso de seus sentimentos e a complexidade que move sua vida.
Baseado no romance homônimo assinado pelo filho da cantora, Angel Parra, Violeta foi para o céu estreia nesta sexta-feira (4) no Cinema da Fundação. O filme é uma co-produção entre Chile, Argentina e Brasil e carrega no breve currículo o título de Melhor Filme na mostra Cinema Mundial no Festival Sundance 2012, além de uma indicação ao Prêmio Goya de Melhor Filme Estrangeiro Ibero-Americano.