Tópicos | escravização

Manoel Soares tem dado o que falar desde que concedeu uma entrevista para o podcast Quem Pode, Pod, de Giovanna Ewbank e Fernanda Paes Leme. Em cerca de duas horas e meia de conversa, o apresentador do Encontro discutiu vários assuntos importantes, e acabou viralizando por falar sobre escravização e hiper sexualização negra.

No entanto, Soares não ficou tão feliz com o alto interesse do público em relação a esses temas, principalmente por ter comentado outros tópicos durante a conversa.

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Em uma publicação no Twitter, ele escreveu: "Gente, eu Giovanna Ewbank e Fernanda Paes Leme falamos sobre milhares de coisas no podcast. Mas a repercussão está na escravização de minha mãe e meu comentário sobre hiper sexualização negra. Sério que de 2h30min só conseguimos lembrar disso? Sei lá gente..."

Como você acompanhou, o apresentador chocou ao contar que sua mãe, Dona Ivanete, foi vendida como escrava nos anos 1960.

"A minha mãe é especial não por ser minha mãe, mas porque é a única pessoa que conheço que viveu a escravização e o Facebook na mesma vida. A gente está falando de uma mulher que foi vendida e comprada no Recôncavo Baiano na década de 1960. Imagina que minha mãe foi vendida. E ela viveu essa escravização. Ela tem uma das orelhas cortada porque seus donos rasgaram a orelha dela. Eu me lembro do patrão da minha mãe acochando ela... Me lembro da minha mãe chegando em casa chorando porque a mulher deu um monte de escovas usadas e disse: é só você colocar na água quente que dá para eles usarem. Minha mãe em casa chorando, quebrando as escovas de dentes e no outro dia tendo que ir trabalhar. Isso é o que eu sei. Fora todo o assédio sexual, assédio moral", disse.

A montadora alemã Volkswagen enfrenta nesta terça-feira (14) uma audiência com o Ministério Público do Trabalho (MPT) por alegações de violações dos direitos humanos em uma fazenda durante a ditadura militar brasileira, incluindo trabalho escravo, estupros e torturas.

Os procuradores reuniram em um dossiê de 90 páginas de atrocidades cometidas por gerentes da Volkswagen e capatazes armados em uma fazenda de gado que a empresa tinha na Amazônia nas décadas de 1970 e 1980.

Na mais recente tentativa de fazer justiça pelos abusos cometidos durante a ditadura militar (1964-1985), o MPT convocou representantes da Volkswagen para responder em Brasília sobre as supostas violações, incluindo tortura e assassinatos, na Fazenda Vale do Rio Cristalino, localizada no estado do Pará.

"Houve graves e sistemáticas violações aos direitos humanos, e a Volkswagen sim é responsável", afirmou à AFP o procurador à frente do caso, Rafael Garcia.

A audiência será um contato inicial “para ver se é possível chegar a um acordo" sem a abertura de um processo criminal, explicou ele.

A Volkswagen do Brasil preferiu não comentar detalhes sobre o caso “até que tenha clareza sobre todas as alegações". Mas a empresa “reforça seu compromisso de contribuir com as investigações envolvendo direitos humanos de forma muito séria”, disse à AFP por e-mail uma porta-voz.

Em 2020, o grupo concordou em pagar 36 milhões de reais por colaborar com o Departamento de Ordem Política e Social (Dops) durante a ditadura para identificar supostos opositores de esquerda e líderes sindicais, que depois foram presos e torturados.

Padre determinado

O acordo chamou a atenção do padre Ricardo Rezende, que passou anos colhendo evidências de abusos na fazenda da Volkswagen, depois que se mudou para o Pará em 1977 e começou a ouvir histórias horríveis de vítimas.

Rezende se questionou se a empresa também poderia ser responsabilizada por esse caso, e decidiu compartilhar seu material com os procuradores, contou ele à AFP.

"Uma tortura sofrida não repara uma dívida. O sofrimento das mulheres e mães cujos filhos foram para a fazenda e não voltaram, essa dor não tem reparação", disse o padre, agora com 70 anos.

"Mas essa seria uma reparação simbólica. Eu acho que seria necessário", acrescentou.

O depoimento de centenas de páginas de Rezende e outros documentos convenceram o MPT a formar um grupo de trabalho, que passou três anos reunindo evidências, resultando no dossiê que será agora apresentado à Volkswagen.

Nele, vítimas relatam aos investigadores que foram atraídas para a propriedade de 70.000 hectares com falsas promessas de trabalhos lucrativos. Depois, eram forçados a derrubar a mata sob condições extenuantes para a criação de gado na fazenda, que chegou a ser a maior do Pará.

Os trabalhadores eram mantidos em "servidão por dívida" ao serem forçados a comprar alimentos e suprimentos na loja da fazenda a preços exorbitantes, explicaram os procuradores.

Aqueles que tentavam fugir eram espancados, amarrados a árvores e deixados ali durante dias por guardas armados que vigiavam a força de trabalho com violência.

Em um caso, três testemunhas contaram que um pistoleiro sequestrou e estuprou a esposa de um trabalhador como punição após ele tentar escapar.

"Acho gravíssimos os abusos que houve", declarou Rezende, que estima que centenas - talvez milhares - de pessoas foram essencialmente escravizadas entre 1974 e 1986.

VW na floresta?

Mas o que uma montadora de automóveis alemã estava fazendo criando gado na Amazônia brasileira?

A história é um exemplo de como o regime militar via a Amazônia e ajuda a explicar por quê a maior floresta tropical do mundo está ameaçada hoje.

Era uma época em que o Brasil estava buscando desenvolver com urgência as áreas da floresta, que os militares viam como atrasadas, colonos eram atraídos com promessas de riqueza e o slogan "terras sem homens para homens sem terras".

O governo atraía também empresas. A Volkswagen se beneficiou de isenções de impostos e empréstimos a juros negativos ao desmatar a floresta para criar uma fazenda, sem mencionar os estreitos laços com o regime, disse Rezende.

"De um lado, o Volkswagen adorava a ditadura. De outro lado, era um negócio altamente rentável. Ela podia ter 6.000 pessoas trabalhando quase de graça", comentou.

Segundo as autoridades, práticas como essa eram comuns na região amazônica, mesmo após o fim da ditadura militar.

Conseguir responsabilizar as empresas vai depender do levantamento de provas suficientes, observou Garcia.

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