O historiador e arquiteto Paulo Rezzutti conduzia um grupo de estudantes em tour pelo centro de São Paulo na semana passada. Na parada para visitar o Solar da Marquesa, casa-museu que, no século 19, foi endereço da mais famosa amante de d. Pedro I, Domitila de Castro Canto e Melo, a Marquesa de Santos, uma triste surpresa: não havia mais nada ali, nenhum objeto, que remetesse à moradora.
O episódio é um dos exemplos de como São Paulo trata mal a memória do período imperial - época da qual Rezzutti, membro titular do Instituto Histórico e Geográfico de São Paulo, é especialista. Administrados por diferentes órgãos, Solar da Marquesa, cripta imperial e Museu Paulista, todos elementos contadores de parte dessa história brasileira, passam por problemas.
##RECOMENDA##"Há por aqui uma mania acadêmica de se fazer o desmonte da história em favor daquela que se quer bem contada", avalia o historiador e arquiteto, autor também de D. Pedro - A História Não Contada (Ed. LeYa, 464 págs.). "A exposição que havia com itens da Marquesa foi desativada", critica. "E não há explicação sobre os antigos moradores da casa, nada." Ele também reclama que, mesmo tendo sido restaurada "há tão pouco tempo", a casa já dá mostra de deterioração em pontos como os batentes das janelas.
As críticas são endossadas por outro historiador, professor da Universidade de São Paulo (USP), que pediu para não ser identificado. "Antes, havia uma exposição ali sobre a Marquesa. Agora, a casa parece ter perdido sua vocação, está sem foco", comenta.
De novembro de 2011 até a última semana, objetos que pertenceram a Domitila e que são do acervo do Museu Paulista, da USP, estiveram emprestados ao Solar. O motivo da solicitação: o vencimento da apólice de seguro, condicionante do empréstimo.
Mais casos
Esse não é o único exemplo de descaso. Há também a cripta imperial, monumento localizado no Parque da Independência, no Ipiranga, zona sul, onde estão sepultados o primeiro imperador do Brasil, d. Pedro I, e suas duas mulheres, Leopoldina e Amélia. Ali, o painel externo, de bronze, está deteriorado, assim como o conjunto denominado Monumento à Independência. No mesmo local, a réplica da primeira Constituição brasileira, de 1824, feita de bronze, que ficava em cima do sarcófago onde estão os restos mortais, foi furtada.
Questionada pelo Estado, a Prefeitura informou, em nota, que, no caso da cripta, "o Departamento do Patrimônio Histórico (DPH) vem formulando uma proposta global para tratamento do Monumento à Independência". O último restauro ali ocorreu entre 2005 e 2006, com patrocínio da iniciativa privada.
No ano passado, o DPH fez a contratação, por R$ 160 mil, do restaurador francês Antoine Amarger, o que resultou na elaboração do projeto executivo de todo o complexo. "Inicialmente, será priorizado o restauro do painel externo de bronze, em alto relevo, que reproduz o quadro Independência ou Morte, de Pedro Américo", informa a Prefeitura, ressaltando que a recuperação do painel custará cerca de R$ 1,1 milhão.
Guardião de boa parte desse passado, o Museu Paulista - mais conhecido como Museu do Ipiranga - está fechado ao público desde agosto de 2013, por causa de problemas de deterioração em seu prédio-sede. Não há previsão de reabertura. As informações são do jornal O Estado de S.Paulo.