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O comerciante Rodrigo Rodrigues, de 33 anos, já havia quebrado algumas vezes. Vindo de uma família que atua na área, na última delas investiu demais na reforma da loja de pneus e acabou com suas reservas, numa hora em que as contas não fechavam. Priorizou o comércio eletrônico, mas tinha dificuldade de negociar preços com atacadistas. Até que viu na tela do computador uma oferta de crédito de R$ 130 mil, em sua loja no Mercado Livre. "Estava na sala de casa, ao lado da minha mulher, e decidimos pegar tudo o que ofereceram", diz Rodrigues. "Já tomei mais dois empréstimos depois disso."

Com os recursos, partiu para a ofensiva. Comprou tudo em mercadoria por preços melhores, as portas de vários fornecedores se abriram - e o jeito como era tratado mudou. Saiu de 450 encomendas mensais para 3.500. "O banco tradicional nem me recebia", diz. "Quando há alguma pendência (em relação a dívidas), eles negam o crédito, não importa sua experiência ou vontade de trabalhar."

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Rodrigues é um exemplo da transformação pela qual o mercado de crédito vem passando no País: a desintermediação dos empréstimos corporativos, que têm crescido fora dos bancos.

Alguns fatores estruturais estimulam esse novo momento. Entre eles, a redução do Estado no financiamento a empresas, antes feito via BNDES e bancos públicos. Também a perspectiva de longo prazo para os juros baixos que fazem investidores buscar rentabilidade - e oferecer mais capital a quem precisa. Bem como, a tecnologia.

"Temos o insumo mais importante numa operação de crédito: informação", diz Pedro de Paula, responsável pelo Mercado Crédito, área de crédito do Mercado Livre. "Sabemos quanto o lojista vende, o que o cliente pensa dele e como ele o atende. Com isso, conseguimos inverter a lógica dos empréstimos com modelos estatísticos que entendem os vendedores a quem vamos oferecer crédito e o disponibilizamos online, colocando o dinheiro imediatamente na conta dele."

No caso do Mercado Pago, os empréstimos vão de R$ 300 a R$ 1,5 milhão, mas a média é de R$ 25 mil. Há antecipação de recebíveis e capital de giro e os juros começam a partir de 2% - nem é preciso dizer que é um porcentual muito inferior ao cobrado pelos bancos e um outro estímulo a esse mercado. "Não precisamos ter a estrutura de agências nem o custo imposto pela regulação aos bancos", diz de Paula.

Oxigênio

A desintermediação do crédito corporativo também tem explodido no mercado de capitais, seja por meio de emissões de papéis que representam dívidas ou certificados de recebíveis variados. Os maiores beneficiados são empresas de médio porte, que veem na redução de custos uma nova linha de oxigênio para suas necessidades.

Para negócios menores - e mesmo de algum porte, porém - há uma oferta crescente do que é chamado de empréstimo direto. É como se fosse o Uber do crediário, no qual uma pessoa ou empresa que tem dinheiro empresta a outra pessoa ou empresa que não tem.

"A diferença é que o dinheiro não vai de uma mão para a outra, evidentemente", diz Margot Greenman, presidente e cofundadora da Captalys, que faz a infraestrutura para o sistema de crédito direto. "Os recursos ficam em fundos por segurança."

Uma das maiores empresas do setor, em dez anos de existência a Captalys já movimentou R$ 50 bilhões em empréstimos. Com o avanço da tecnologia dos últimos tempos, porém, o negócio ganhou outra proporção. Hoje, a empresa processa 1,5 milhão de operações de créditos por mês e, apenas em 2018, sua plataforma deu origem a quase R$ 2 bilhões em operações de crédito. "O modelo tradicional está em xeque e há uma tendência crescente de democratização do acesso ao crédito", diz Margot.

Nesse efeito multiplicador, mais uma vez o Mercado Pago é apenas um dos clientes da Capytalis. Estão lá também Bunge, PayPal, Pague Veloz, a empresa de alimentos Enova e a de fretes CargoX, entre outras, todas emprestando a seus clientes. "O que a tecnologia nos permitiu foi desenvolver soluções customizadas às necessidades de cada empresa, da captação à gestão de recursos, passando pelos riscos e plataformas completas", diz Margot.

Nos números, a mudança começa a aparecer. Apenas em fundos creditórios, que dão direito a receber receitas futuras de empresas, o volume de recursos foi de R$ 5,3 bilhões para R$ 7,9 bilhões entre 2017 e 2018. O número de fundos foi de 41 para 52 no período. Ainda é menos de 1% do mercado total de crédito, mas a linha é ascendente. As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.

Agilidade na contratação, pagamento automático no cartão, serviço padronizado, geolocalização. Cada vez mais pessoas se rendem à "lógica Uber" na hora de contar com os mais diversificados tipos de serviços: do cuidador de cachorros na hora de viajar à faxineira semanal.

Cansada de ter problemas com empregadas domésticas fixas, a designer de móveis Renata Távora, de 30 anos, descobriu o aplicativo Parafuzos há um ano. Pelo menos uma vez por semana chama uma faxineira pela plataforma. Por ela, consegue escolher a quantidade de horas desejada e incluir serviços extra - como limpar a geladeira ou vidros de janelas. O preço é calculado automaticamente e a fatura vem no cartão. "Da última vez eu paguei R$ 147", diz ela, que mora em um apartamento em Moema, zona sul de São Paulo.

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Um dos sócios da empresa, Felipe Augusto Brasileiro, de 26 anos, conta que a ideia original foi criar "um Uber de serviços domésticos". "Começamos oferecendo pequenos reparos, há três anos, mas a falta de padronização se tornou um problema. Então partimos para o ramo de limpeza doméstica", explica. Deu certo: hoje 20 mil casas por mês são atendidas pelo app, que tem 2,5 mil profissionais cadastradas.

Regina Nakamura, de 48 anos, decidiu se inscrever no aplicativo há quase dois anos depois de passar por várias dificuldades profissionais. "É muito prático trabalhar assim e sou dona dos meus horários", diz.

Foi uma necessidade particular que levou o empresário Eduardo Baer, de 32 anos, a fundar a DogHero, uma plataforma de anfitriões de cães - quase um AirBnb para pets, voltado a quem vai viajar e não tem com quem deixar o melhor au-migo. Baer foi um dos criadores do aplicativo iFood, de delivery de comida e, depois de uma temporada fora do País, estava de volta. "Falei para minha mulher que gostaria de morar em uma casa e ter um cachorro", conta o empresário. Como o casal sempre gostou de viajar, esbarrou no problema: com quem deixar o bicho? Em agosto de 2014, depois de pesquisar e encontrar soluções semelhantes no exterior, nascia a DogHero: hoje com 10 mil anfitriões em 650 cidades do País e um crescimento mensal de 25%. E Baer, afinal, pode ter um mascote próprio? "Não", ri ele, que mora em uma casa na Vila Madalena, na zona oeste. "Acabei me tornando um dos anfitriões cadastrados, então todo fim de semana tem um cachorro diferente em casa."

Então secretária de um escritório de advocacia, Gabriela Almeida da Silva, 25 anos, precisou recorrer ao serviço em 2015, quando teve de viajar. Gostou e acabou se tornando ela própria uma anfitriã. Em 2016 ficou desempregada e decidiu se dedicar apenas ao DogHero. Quase todo fim de semana tem um hóspede em sua casa. "Mês com feriados, como o de abril, são ótimos", conta ela.

Cliente recorrente dela é a assessora de eventos Mara Lima, 37 anos. Ou melhor, seus cães "pitlatas" - mistura de pitbull com vira-lata - Caco e Thor. "Ela passa toda a confiança e manda informações e fotos deles por WhatsApp", diz Mara.

No gol

Problemas mais inusitados também têm sido resolvidos pelos aplicativos. De olho na demanda dos peladeiros que nunca querem jogar no gol, o empreendedor Samuel Toaldo, de 33 anos, criou o Goleiro de Aluguel. Por R$ 30 a hora, contrata-se um sujeito para jogar no gol enquanto os amigos batem bola. Ele conta que a sua base tem hoje 8 mil goleiros cadastrados e intermedeia cerca de 800 aluguéis por mês.

Ex-auditor de uma metalurgia, Gustavo Peyerle, de 30 anos, morador de Curitiba, no Paraná, é um dos mais atuantes. Chega a fazer 25 jogos por mês. Quando perdeu o emprego, há um ano, "a renda com o aplicativo era o que quebrava o galho". Hoje em dia, é motorista Uber ao longo do dia e Goleiro de Aluguel à noite. "Desde criança, eu sempre joguei no gol", diz.

Há dois meses, a seguradora Ituran lançou no mercado o aplicativo 55 Guinchos, que oferece serviço de guincheiros seguindo a lógica do Uber. "Para o cliente, conseguimos padronizar o valor e garantir a qualidade do serviço", conta o gerente de projetos da empresa Fábio Acorci, de 43 anos. Por enquanto disponível só na Grande São Paulo, o serviço já tem mais de 500 prestadores cadastrados - e já realizou 4 mil operações.

Colecionador de carros antigos, o administrador de imóveis David Pacheco e Silva, de 41 anos, usou duas vezes e foi convencido da eficiência. "Da primeira vez, o guincho chegou em 10 minutos - quando normalmente é um serviço que leva 1h30 para iniciar", conta ele.

Já o aplicativo Loggi, de motoboys, foi o que salvou a administradora de empresas Laura Melaragno, de 30 anos, de não perder um voo para Londrina . "Eu estava na (avenida) 23 (de Maio) quando notei que havia esquecido a carteira com os documentos todos no trabalho. Acionei o aplicativo e um motoboy buscou o material no escritório, e chegou antes de mim ao aeroporto. Paguei R$ 25", conta. As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.

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