Tópicos | Alejandro Iñárritu

O Regresso é um dos principais favoritos às categorias mais importantes do Oscar desse ano, mas sofre do mal de aproximadamente metade dos indicados, como sempre acontece: são boas obras, mas há dúvidas sinceras quanto serem as melhores daquele período, pois certamente chegaram ali através de algum prestígio que seus realizadores têm junto aos votantes da Academia, ou então, de um marketing poderoso realizado dentro do conjunto destes mesmos votantes. Não à toa, vemos ano a ano filmes de caráter duvidoso configurando as principais listas de indicados ou mesmo vencendo tais categorias.

Não me entendam mal. O Regresso é uma produção cercada de méritos, daqueles que engrandecem a sétima arte. De fato, Tom Hardy e Leonardo DiCaprio revelam suas monstruosas capacidades interpretativas aqui. O fraco vilão Bane, de Batman - O Cavaleiro das Trevas Ressurge, não mostrou metade do que  Hardy era capaz de fazer com um bom vilão em mãos. Em muitos trechos, sentimos ódio concreto do personagem, ao passo que sofremos com o batedor Glass, vivido por DiCaprio, cujo sofrimento transcende a tela.

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A trilha sonora contida do filme é outro aspecto que busca firmar a coerência daquele universo cru e cruel, surgindo pontual e abrindo espaço para o silêncio, quando necessário. E é preciso aplaudir a audácia do roteiro em colocar em pé de igualdade raças distintas, como brancos conquistadores e índios que tentam evitar a extinção do seu povo, sem jamais julgar estes ou aqueles como certos ou errados. É uma realidade que simplesmente existiu e reverbera até hoje; assuma o lado que desejar a partir do que se vê.

Porém, então, começamos a analisar os poréns de O Regresso, e estes são muitos. De cara, não é difícil se deixar enganar pela belíssima direção de fotografia de Emmanuel Lubezki. Ela sabe quando buscar a luz e quando evitá-la, e sabe brincar com todo o cenário hiper realista que existe a sua volta, e talvez engane os mais incautos, contudo, aqueles que já tiveram qualquer contato com alguns dos filmes do diretor Terrence Malick, saberão que Lubezki cria lá as mesmas noções de luz, e de A Árvore da Vida podemos, inclusive, retirar planos inteiros que são repetidos quase que milimetricamente neste O Regresso.

Da maneira como a câmera se movimenta pelos sets, e já falarei sobre isto em um instante, o que fica claro para qualquer espectador mais atento e que conheça previamente os nomes de Malick, Iñarritu e Lubeski, é que a cadeira de direção do filme foi dada a este terceiro, totalmente inspirada nos trabalhos do primeiro, e a única coisa que podemos atribuir a Inarritu são os constantes travellings, que de tão exaltados, chegam a causar enjôos no público, que é atirado para fora da obra tão logo tais "andadas" da câmera deixam de ser sutis (problema compartilhado com a obra anterior do diretor, Birdman), e a falta de sutileza é tamanha, que há inúmeras cenas em que podemos perceber a steadicam tocar ou bater em atores, árvores ou objetos de cena.

Todavia, o que mais incomoda em O Regresso é sua duração extrapolada - a produção tem quase três horas, das quais muitas situações se repetem exaustivamente, quando já entendemos tudo o que se quer ser dito pela narrativa. Alguns dirão que não devemos desfazer a montagem de um filme, e que devemos julgá-lo por aquilo que ele é, e não pelo que pretendemos que ele fosse. É um argumento perfeito, se levarmos em consideração apenas a base do nosso contra-argumento. No entanto, para chegar a esta opinião, certamente julguei primeiro a obra como ela me foi apresentada, vi os excessos da montagem e percebi que ela assim não funcionava, para só em seguida apontar o que não funcionava e desencadear na posição de como e por quais razões O Regresso poderia ser um filme mais funcional. É um argumento lógico e não se pode chegar a um sem o outro. E o que não funciona? Ora, das primeiras vezes em que o protagonista sofre das intempéries do ambiente ao seu redor ou por causa dos que lhe perseguem, ainda estamos aflitos, porém, quando situações começam a se repetir, já sabemos que DiCaprio e seu Glass sobreviverão aquilo, assim como passaram pelas dez ameaças anteriores, e mesmo que não soubéssemos, o impacto se dilui. É a repetição de idéias e acontecimentos que leva à exaustão e afinamento do filme, como se este fosse manteiga e tivesse sido esticado em um pedaço muito grande de pão.

Além disso, chega o momento em que Iñarritu deixa evidente que quer ganhar mais um Oscar desesperadamente, quando insere inúmeras cenas que abusam do transcendental da situação vivida por Glass - relembrando a morte de seus entes queridos e tendo contato com estes - e que mais uma vez peca por repetir fórmulas já vistas em filmes de Terrence Malick. A diferença é que o diretor de To The Wonder sabe inserir tais passagens organicamente em sua narrativa, fazendo-nos até duvidar se fazem parte da realidade de seus personagens ou não, enquanto em O Regresso elas surgem cada vez que o protagonista desmaia, e assim sempre sabemos quando novas virão. E se não ficou claro, elas não acrescentam escopo ao background do "herói".

É muito esforço, é muito sangue dado, é o sofrimento atrás do sofrimento, é o movimento constante... São todas as fichas apostadas na tentativa de angariar mais algumas estatuetas douradas. E o filme? Bem, o filme está ali para justificar e dar base a estas tentativas, e o espectador é capaz de sentir isto quando já entendeu tudo com uma hora e meia de filme, mas percebe que há mais uma hora e dez pela frente.

O Regresso representa o mero formalismo da Academia, que se for justa, ignorará boa parte dos concorrentes, incluindo este, e dará seu prêmio máximo ao único e real campeão este ano, àquele que ousou a linguagem estética e narrativa do cinema e quebrou paradigmas que vinham se estabelecendo como status quo na indústria. Que o grande coroado da noite seja Mad Max - Estrada da Fúria e não embustes como este O Regresso.

 

Texto escrito pelo colaborador e crítico de cinema Caio Vianna do blog Zona Crítica, parceiro do Portal LeiaJá.

Começar bem é tudo. E a 71ª edição do Festival de Veneza começou bem nessa quarta-feira, 27, com o primeiro concorrente, Birdman, produção norte-americana dirigida pelo mexicano Alejandro Iñárritu (o González agora ele só abrevia com G.). A história é a de um ator que já viveu um super-herói (O Homem Pássaro do título) e agora deseja mostrar a si e à família que também é capaz de interpretar uma peça autoral, escrita por ninguém menos que o cult Raymond Carver (o escritor de Short Cuts, que deu no grande filme de Robert Altman). Na verdade, trata-se de uma peça de teatro de Carver, De Que Coisa Falamos Quando Falamos de Amor.

Em entrevista no festival que vai até o dia 6 de setembro, Inárritu disse que só poderia fazer esse filme com alguém que de fato tivesse vivido um super-herói na tela, o que é o caso de Michael Keaton, o Batman. "Mas também era fundamental alguém que topasse sair da zona de conforto e transitar entre a comédia e o drama", como faz o personagem de Keaton, o ator Riggan Thomson. Ele é um tipo atormentado, que deseja a fama no palco após ter encarnado o super-herói. Ouve uma estranha voz profunda, que o critica e tenta comandar seus atos. Mantém alguns poderes, como o dom da levitação e a capacidade de mover objetos metálicos apenas com o poder da mente.

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Dito assim, parece risível. E talvez até seja mesmo, porque o diretor calibra seu personagem entre o dramático e o cômico. Sobre esse ponto, de passagem, Inárritu disse que depois de ter feito muitos filmes com grande peso dramático, queria experimentar a leveza da comédia - desejo que estaria na origem deste projeto.

O fato é que, além de contar com bom elenco (além de Keaton, Edward Norton, Naomi Watts e Emma Thompson), Inárritu faz fé num dos traços característicos do seu cinema - a energia que impõe à narrativa, com cenas que vão de closes a planos sequências caprichados e intensos.

Nota-se que, ao trabalhar com atores famosos, Inárritu os tensiona de modo a assumirem riscos. "Fiquei impressionado ao ver o filme sobre Philippe Petit, o francês andou sobre um cabo de aço entre as Torres Gêmeas", diz Inárritu. Fez com que os seus atores e suas atrizes vissem o documentário de James Marsh, O Equilibrista, sobre a façanha de Petit.

Na verdade, ele toma a ousadia de Petit como metáfora para o desafio da arte. Por intermédio dessa história, mesclada de realismo com traços fantásticos, Inárritu toca em questões bastante interessantes: a procura alucinada pela fama que, depois de conquistada parece mais um peso que uma vitória, a competição desabrida no meio artístico, a arrogância da crítica, que se julga capaz de determinar o sucesso ou o fracasso com o mero exercício da opinião.

Coisas da natureza humana, enfim, e exacerbadas num meio e numa sociedade em que o sucesso é a medida de todas as coisas. O espírito latino de Inárritu, talvez ainda não dominado pela indústria, impõe uma visão crítica a essa ordem das coisas, num filme de alguns momentos brilhantes, outros divertidos, exemplo de que se pode fazer boas coisas mesmo no esquema dos grandes estúdios. Em geral, não se faz, mas é possível. E o filme, inclusive, fala dessa possibilidade e dos seus limites.

Messi

Pela seção paralela Giornate degli Autori, foi exibido o documentário Messi, do diretor espanhol Álex de la Iglesia. O filme busca reconstituir a trajetória do jogador do Barcelona com depoimentos de familiares e amigos de infância e também de jogadores e técnicos de futebol. Para quebrar a formalidade, as conversas acontecem num restaurante, onde as pessoas, em torno de uma mesa e saboreando bons vinhos, falam do boleiro.

Há também imagens da infância do menino de Rosário, que já fazia misérias com a bola aos 6 anos, incentivado pela avó. O problema do crescimento, causado por uma deficiência hormonal, é mostrado sem nenhum rodeio. Assim como a admiração de jogadores como o holandês Cruyff e o conterrâneo Diego Maradona. Menotti, ex-jogador e ex-técnico da Argentina, conversa com o atual treinador da seleção dos hermanos, Alejandro Sabella.

Vemos os gols, o incrível domínio de bola, as passadas curtas e rápidas que têm encantado os que gostam do futebol. Cruyff entende que Lionel Messi tira vantagem da pouca estatura, pois as passadas curtas, aliadas ao prodigioso domínio técnico, possibilitam que ele mantenha a bola próxima dos pés e mude de direção de maneira constante.

O Brasil entra no filme com dois personagens. Primeiro, Ronaldinho Gaúcho, ídolo do Barcelona na época em que Messi começava e que tratou o novato como a um filho, inclusive dentro de campo, dando-lhe passes açucarados para que Messi fizesse seus gols.

O outro surge quando Menotti diz que uma característica de Messi lhe parece a mais impressionante. "Ele para uma arrancada veloz em dois centímetros. E arranca de novo na mesma velocidade", espanta-se.

Alguém lhe pergunta se já havia visto coisa parecida. Menotti garante que sim: "Pelé fazia isso". E ajunta: "Mas vamos deixar Pelé de lado, porque não se pode falar dele quando o assunto é futebol. Pelé é um extraterrestre". As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.

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