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Quatro anos depois de permitir o aborto de fetos anencéfalos, o plenário do Supremo Tribunal Federal (STF) deve voltar a tratar do tema nesta terça-feira, 7, quando está marcado o julgamento de uma ação que propõe a descriminalização do aborto no caso de grávidas infectadas pelo vírus da zika.

Ministros ouvidos reservadamente pela reportagem, no entanto, consideram que o novo julgamento é mais delicado e controverso que a anencefalia, por haver maior potencial de vida nas crianças que desenvolvem microcefalia. Além disso, apontam que não há ainda estudos científicos robustos sobre as consequências do vírus da zika. "É um julgamento complexo, que pode abrir precedentes. Também vamos autorizar aborto de fetos com Síndrome de Down?", indaga um ministro ouvido pela reportagem. Na avaliação dele, o debate em torno do tema ainda não está suficientemente amadurecido a ponto de o STF firmar um entendimento. "É um tema que exige maior maturação", opina o ministro.

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O processo é de relatoria da presidente do STF, ministra Cármen Lúcia, que já tem o voto pronto desde setembro. Em 2012, Cármen deu um dos oito votos favoráveis à liberação de aborto em caso de anencefalia - outros dois ministros votaram contra: Ricardo Lewandowski e Cezar Peluso, que já deixou a Corte e se aposentou. Na época, Lewandowski considerou que caberia ao Congresso incluir no Código Penal uma nova exceção ao crime de aborto.

O Código Penal prevê que a interrupção da gravidez no Brasil é permitida apenas nos casos em que a gestante corre risco ou quando a gravidez decorre de estupro. "É um julgamento diferente da anencefalia: nesse caso, há possibilidade de vida, embora haja uma deficiência bárbara", avalia outro ministro, que acredita que há maioria na Corte pela liberação, ainda que por um placar mais apertado que o da anencefalia.

Dentro do STF, pelo menos três votos são considerados certos a favor do direito de aborto no caso de grávidas infectadas pelo vírus da zika: Luís Roberto Barroso, Edson Fachin e Rosa Weber, que já se manifestaram na última terça-feira no sentido de que a interrupção da gravidez até o 3º mês não é crime.

A ação direta de inconstitucionalidade a ser julgada pelo plenário do STF foi ajuizada pela Associação Nacional de Defensores Públicos (Anadep), que também pede a obrigação de haver médicos capacitados para o diagnóstico clínico de infecção por zika em unidades do SUS e a imediata disponibilidade nos hospitais de exames para a detecção da infecção.

CNBB

Para o secretário-geral da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB), Leonardo Steiner, a ação tem aspectos positivos, como a reivindicação por melhores condições de assistência para crianças com microcefalia. "O cuidado deve ser discutido", afirmou. Isso não vale, no entanto, para o aborto. "Somos contra qualquer atitude que possa diminuir a aceitação da vida. Sempre nos manifestamos contra", disse. Para ele, a discussão vem acompanhada de um risco, o de se rejeitar as deficiências. "Estamos entrando numa sociedade onde a finitude humana não é mais aceita. Entramos num perigo grande, o de valorizar apenas pessoas sadias", avaliou.

O ministro da Saúde, Ricardo Barros, não quis opinar sobre o tema. Numa entrevista ao Estado, logo ao assumir ele havia afirmado que qualquer discussão sobre o tema deveria ser feita ouvindo setores religiosos.

Números

Até novembro, foram confirmados 2.189 casos da má-formação no País e outros 3.113 estão em investigação. As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.

O Conselho Federal de Medicina criou na manhã desta sexta-feira uma comissão especial para definir critérios de diagnóstico da anencefalia. O grupo, formado por médicos de várias especialidades, deverá estabelecer em um prazo até 60 dias as normas orientando profissionais a fazer a avaliação. "Isso não significa que, neste período, as avaliações estarão suspensas. Até a conclusão do documento do grupo, médicos poderão fazer diagnóstico e comunicá-lo à paciente, como é hoje", disse o vice-presidente do Conselho Federal de Medicina, Carlos Vidal.

O protocolo, de acordo com ele, será semelhante ao que foi feito para o diagnóstico de morte encefálica. "Quando a resolução for publicada, todos os médicos deverão segui-la". O Conselho Federal de Medicina também divulgou nesta sexta-feira uma nota sobre a decisão do Supremo Tribunal Federal permitindo a interrupção da gravidez no caso de fetos anencéfalos. O documento classifica como "acertada" a decisão do STF e uma contribuição para o aperfeiçoamento das relações éticas na sociedade.

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Por 8 votos a 2, o Supremo Tribunal Federal (STF) decidiu autorizar a mulher a interromper a gravidez em casos de fetos anencéfalos, sem que a prática configure aborto criminoso. Durante dois dias de julgamento, a maioria dos ministros do STF considerou procedente ação movida pela Confederação Nacional dos Trabalhadores na Saúde (CNTS), que tramita na Corte desde 2004.

Último ministro a se manifestar, o presidente do STF, Cezar Peluso, votou contrariamente à interrupção da gravidez. O outro voto contrário foi o do ministro Ricardo Lewandowski. Para Peluso, não se pode impor pena capital ao feto anencefálico, “reduzindo-o à condição de lixo”.

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Segundo o ministro, o feto, portador de anencefalia ou não, tem vida e, por isso, a interrupção da gestação pode ser considerada crime nesses casos. “É possível imaginar o ponderável risco que, se julgada procedente essa ação, mulheres entrem a pleitear igual tratamento jurídico na hipótese de outras anomalias”.

Os ministros Marco Aurélio Mello, Rosa Weber, Joaquim Barbosa, Luiz Fux, Cármen Lúcia, Carlos Ayres Britto e Gilmar Mendes e Celso de Mello se posicionaram a favor da ação. O ministro Antonio Dias Toffoli se declarou impedido de votar, porque quando era advogado-geral da União (AGU) posicionou-se favorável à interrupção. Por isso, dos 11 ministros da Corte, somente dez participaram do julgamento.

Os sete ministros favoráveis acompanharam a tese do relator, Marco Aurélio Mello. Ele considerou que a mulher que optar pelo fim da gestação de anencéfalo (malformação do tubo neural, do cérebro) poderá fazê-lo sem ser tipificado como aborto ilegal. Atualmente, a legislação permite o aborto somente em caso de estupro ou de risco à saúde da grávida. Fora dessas situações, a mulher que interromper a gravidez pode ser condenada de um a três anos de prisão e o médico, de um a quatro anos. Nos últimos anos, mulheres tiveram de recorrer a ordens judiciais para interromper esse tipo de gestação.

Os ministros Gilmar Mendes e Celso de Mello tentaram acrescentar ainda a condição de que, para fazer o aborto, a mulher precisaria de dois laudos médicos distintos que comprovassem a anencefalia do feto. Mas, essa condicionante foi recusada pelo plenário.

Durante a declaração do resultado, Maria Angélica de Oliveira, que acompanhava o julgamento, se manifestou contra a decisão com gritos e ofensas aos ministros. "Não respeito toga manchada de sangue", disse. Ela declarou ser integrante de um movimento espírita. No entanto, representantes da Federação Espírita Brasileira negaram a autoridade da mulher para falar em nome da entidade.

Durante os dois dias, religiosos contrários à legalização do aborto de anencéfalos fizeram uma vigília e orações pela não aprovação da medida. No fim da tarde de hoje, após o resultado, um grupo de feministas comemorou a decisão da Suprema Corte na Praça dos Três Poderes.

A anencefalia é uma má-formação fetal congênita e irreversível, conhecida como“ausência de cérebro”, que leva à morte da criança poucas horas depois do parto. Em 65% dos casos, segundo a CNTS, a morte do feto é registrada ainda no útero. O Código Penal só permite o aborto quando não há outro meio de salvar a vida da gestante ou se a gravidez for resultado de estupro. No primeiro caso, o médico não precisa de autorização judicial.

O Supremo Tribunal Federal (STF), após oito anos em tramitação, votará nesta quarta-feira (11) a ação para descriminalização da antecipação do parto de fetos anencéfalos. Atualmente, as ações movidas por gestantes decididas em não levar a gestação nestas condições adiante têm sido analisadas individualmente.

Esta análise, no entanto, é subjetiva, pois depende da interpretação de cada juiz ou promotor, podendo, em uma minoria dos casos, ser negada. Devido a todos os obstáculos existentes atualmente, desde 1989 já foram solicitadas, no Brasil, cerca de 10 mil autorizações judiciais para a interrupção da gestação. 

A votação será acompanhada por representantes de instituições favoráveis à ação. Estarão presentes, membros da Federação Brasileira das Associações de Ginecologia e Obstetrícia, Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência, Comissão de Bioética e Biodireito da Ordem dos Advogados, seção Rio de Janeiro (OAB-RJ) e o Grupo de Estudos sobre o Aborto.

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As entidades acreditam que as mulheres devem ter o direito livre e esclarecido de decidir pela interrupção ou não de sua gravidez nos casos de fetos anencéfalos, sem que tenham impostas preferências e crenças de terceiros.

Anencefalia - Constitui grave malformação fetal que resulta da falha de fechamento do tubo neural, cursando com ausência de cérebro, calota craniana e couro cabeludo. Estimativas apontam para incidência de aproximadamente um caso a cada 1.000 nascidos vivos. Cerca de 50% dos fetos anencéfalos apresenta parada dos batimentos cardíacos fetais antes mesmo do parto. Um pequeno percentual desses fetos anencéfalos apresenta batimentos cardíacos e movimentos respiratórios fora do útero, funções que podem persistir por algumas horas e, em raras situações, por mais de um dia. A anencefalia é, portanto, um processo irreversível, sem qualquer possibilidade de sobrevida.

Diagnóstico - Por meio de exames de ultrassonografia e de ressonância magnética é possível diagnosticar a anencefalia com 100% de precisão a partir da 12ª semana de gestação. São, portanto, desnecessários procedimentos invasivos ou outros exames para a confirmação diagnóstica.

Morbimortalidade materna - A literatura científica demonstra a associação entre anencefalia fetal e maior risco de complicações maternas, como hipertensão arterial e aumento do volume de líquido amniótico (polidrâmnio), alterações respiratórias, hemorragias vultosas por descolamento prematuro da placenta, hemorragias no pós-parto por atonia uterina e embolia de líquido amniótico (grave alteração que cursa com insuficiência respiratória aguda e alteração na coagulação sanguínea). Portanto, a manutenção desta gestação coloca a saúde da gestante em riscos absolutamente desnecessários.

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