Tópicos | atraso de cachê

Pagamento de cachês atrasados por parte da gestão pública em Pernambuco não é exatamente uma novidade. O problema se arrasta há anos no Estado, e as reclamações dos artistas costumam surgir tão logo se encerra os ciclos festivos, como o Carnaval e junino. Neste ano de 2020, no entanto, o familiar problema tem causado mais danos à classe artística por conta da pandemia do novo coronavírus. Impossibilitados de trabalhar, músicos, técnicos, produtores e outros profissionais da cadeia produtiva da cultura pelejam para receber o pagamento da última Folia de Momo, para ajudar no seu sustento diante da crise instaurada. 

Sem a criação de uma política pública emergencial exclusivamente voltada aos profissionais da cultura,os profissionais que trabalharam no último Carnaval, no estado de Pernambuco, se vêem às voltas com a necessidade de receber seu dinheiro e a morosidade das gestões, quase que completamente voltadas ao enfrentamento da Covid-19. As prefeituras do Recife e Olinda e o Governo do Estado, chegaram a anunciar novas medidas para realização dos pagamentos com implementação de esquemas facilitados para apresentação de documentos necessários para o recebimento, mas diante da demora na chegada dos pagamentos, a preocupação dos artistas e a necessidade de, por mais um ano, brigar por um de seus direitos, se faz necessária. 

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Em entrevista exclusiva ao LeiaJá, o vereador Ivan Moraes Filho (PSOL), falou sobre o problema: “O cachê é o mínimo do mínimo  que a classe artística precisa, cachê é pagar serviço contratado, contratou tem que pagar. É uma questão de legalidade e moralidade, esse ano isso tá se radicalizando porque a cadeia produtiva da cultura parou, os artistas não estão trabalhando”.

O vereador pondera ao lembrar que existe uma burocracia necessária a qualquer pagamento feito com dinheiro público, mas frisa que o atual contexto demanda uma certa urgência que não está sendo atendida pelas gestões, como mostra levantamento feito por sua equipe, em relação à Prefeitura da Cidade do Recife (PCR): “No nosso acompanhamento, no mês de abril, a área da prefeitura que encaminha a papelada até trabalhou bastante, a gente viu que eles já movimentaram mais de 31 milhões, mas pagamento mesmo, não chegou a 8 milhões. Não era pra gente estar brigando por isso, a gente tá brigando por um negócio de dois meses atrás. É vergonhoso, é vexatório”.

Vale lembrar que a celeridade no processo de pagamento dos cachês do Carnaval 2020 foi incluída em um dos primeiros decretos de ações voltadas ao enfrentamento do coronavírus na capital pernambucana, assinado pelo prefeito Geraldo Júlio, no dia 19 de março. 

Sem dinheiro, nem comunicação

Outro problema citado pelo vereador Ivan Moraes é a dificuldade na comunicação com a PCR. Ele diz ser “inútil” as tentativas de conversa com os responsáveis pelo setor cultural no órgão. “Nós não temos resposta”, diz. Mesmo problema enfrentam os artistas. O produtor da Banda de Pau e Corda, Rafael Moura, lamenta: “O problema da gestão cultural nesse enfrentamento à crise vai muito além do pagamento dos cachês. Esse é um tema muito importante, mas tenho a impressão que é muito interessante para a gestão reduzir o problema aos cachês. Dessa forma, pagando os cachês acaba a questão, mas o governo e a prefeitura estão sem qualquer diálogo com a área. (...)  Ficamos totalmente desamparados”.

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Ainda na espera pelo pagamento do show que fez com a banda Cascabulho na Praça do Arsenal, no Carnaval deste ano, o músico Magrão lamenta tanto a falta do cachê quanto a falta de informações mais concretas. “Nós não recebemos nada até agora. O Cascabulho ainda não recebeu seu cachê. Achamos extremamente responsável priorizar o salvamento de vidas mas diante o comprometimento de toda uma cadeia produtiva, é necessária a informação. A gente não tem informação precisa de quando vai acontecer (o pagamento)”, diz o cantor dando conta da gravidade do contexto de pandemia.  “Eu compreendo que a prioridade é salvar vidas, mas o que mais te deixa chateado é a falta de uma comunicação mais efetiva”. 

Magrão frisa também que, para além dos artistas que se apresentam nos polos, existe toda uma cadeia de profissionais por trás das cortinas que viabiliza os espetáculos. Técnicos de som e luz, roadies, carregadores, motoristas e produtores, entre outros, que também acabam prejudicados pelo atraso dos cachês. O produtor e idealizador da Blackstage, empresa que forma e indica profissionais desses segmentos para eventos,  Geison Guedes, conta que quatro profissionais indicados pela empresa para os polos do Recife também estão no aguardo dos pagamentos. “Ninguém recebeu”, garante. 

Geison também reclama os cachês relacionados ao festival Pré-Amp, que ocorre na semana anterior ao Carnaval. “O pagamento do Pré-Amp também é ligado à prefeitura e a gente também não recebeu. Não avisaram que teríamos que apresentar nota eletrônica e quando fui passar a nota pra receber, falaram que não seria  possível receber a física, e agora com a pandemia eles nao resolvem via telefone. A prefeitura tá fechada, eles dificultam tudo. Poderiam pelo menos aceitar nossa nota física nessa situação extrema, e nem isso”. 

Na cidade-irmã, Olinda, a situação não é muito diferente. A produtora Isa Melo, responsável por artistas como Coco do Amaro Branco, Ganga Barreto, Viola Luz e as coquistas veteranas Aurinha, Dona Cila e Dona Glorinha, foi enfática: “Ninguém recebeu. Recife tá pagando à prestação. Olinda, nada. Nem em sonho. Não dizem nada!”. Uma coisa no entanto, é consenso entre todos os artistas. Eles compreendem a importância da maior atenção, por parte das gestão, à atual crise de saúde, porém, tendo sido a primeira categoria a parar de trabalhar por conta dela, e possivelmente a última a voltar, a necessidade de garantir o sustento torna-se uma preocupação cada dia maior. 

O que dizem as gestões

O LeiaJà procurou a Prefeitura da Cidade do Recife, Prefeitura de Olinda e o Governo do Estado para que pudessem esclarecer a demanda. Eles se posicionaram através de notas enviadas pelas assessorias de comunicação. Confira o que cada um disse, na íntegra. 

Prefeitura da Cidade de Recife

Para assegurar renda aos trabalhadores da cultura, a Prefeitura montou uma estrutura de atendimento remoto para a prestação de contas, implementou esquema virtual inédito de tramitação de documentos e assumiu como prioridade os pagamentos das mais de 3 mil apresentações realizadas no Carnaval.   

À medida em que os artistas e produtoras vão comprovando as apresentações e cumprindo com a documentação, os pagamentos estão sendo realizados, contemplando desde músicos, técnicos, montadores, roadies, iluminadores a produtores, para assegurar renda aos profissionais da cultura em tempos de equipamentos fechados e eventos suspensos, a partir do critério prioritário da distribuição de recursos, para garantir que seja beneficiado o maior número possível de artistas. 

Prefeitura de Olinda

Não obstante, as medidas de contingenciamento social, necessárias para o controle da disseminação do vírus, impactam-nos em diversos setores municipais, gerando uma exorbitante queda na arrecadação e significativo aumento nas despesas de setores específicos, como a saúde e a assistência social.

 Neste sentido, tomando ciência da solicitação de esclarecimentos, segue: 

- Estimamos que até o final do mês de maio, 70% dos artistas que se apresentam no nosso Carnaval estarão recebendo. O prefeito Lupércio determinou prioridade para os menores cachês, de modo que ainda nesta semana, os que apresentaram primeiro sua prestação de contas do pós-eventos, estando em acordo com a legislação vigentes, já começam a receber. Os artistas com cachês mais elevados, que representam os 30% restantes, receberão após o complemento pagamento aos artistas locais.

- Com relação às ações de apoio, temos como foco principal dar atenção às prestações de contas e acompanhamento aos credores para que a maioria dos artistas que participaram do carnaval recebem o quanto antes for possível. Exemplo desta iniciativa, é o sistema online (cultura.olinda.pe.gov.br) para encaminhamento dos documentos necessários para prestação de contas implantado em tempo recorde e de forma inédita neste município, que proporcionou para artistas e produtores conforto e segurança, contando ainda com suporte técnico pra auxiliar nos envios. Em ato contínuo, estamos com uma equipe de técnicos preparando um anteprojeto de iniciativas criativas para que tão logo possamos reunir a cadeia produtiva e apresentar algumas propostas para que juntos, e conscientes das dificuldades econômicas que o município vive, tentar viabilizar sua execução. À exemplo, temos o projeto "Livre da Gente" que visa utilizar os canais de comunicação municipais Facebook, Instagram e Youtube para transmissão de apresentações com infraestrutura adequada. Com isto, pretendemos aproveitar o alcance dos seguidores destes canais para promover a nossa cultura, além de angariar fundos para os agentes culturais envolvidos, podendo ser de diversos segmentos como música, dança, gastronomia, artes visuais, entre outros.

Governo do Estado

Conforme foi anunciado no último dia 21 abril, o Governo do Estado liquidou, nesta quarta-feira (20), todos os cachês dos artistas, bandas e grupos de cultura popular que integraram a programação do Carnaval de Pernambuco 2020. Ao todo, foram pagos, por meio da Secult-PE e da Fundarpe, R$ 5,8 milhões: R$ 3 milhões, na primeira parcela, e R$ 2,8 milhões, nesta última fase que finaliza definitivamente o Ciclo Carnavalesco.

A liberação do pagamento dessa segunda e última parcela contemplou 170 bandas, grupos e artistas que, juntos aos 334 cachês pagos inicialmente, totalizam 504 processos de pagamento liquidados. Além disso, foram liberados 22 pagamentos de 12 empresas que prestaram serviços de logística e infraestrutura no Carnaval.

 

 

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Prefeitura e artistas que se apresentam durante as festividades municipais travam um novo embate. O atraso nos pagamentos dos músicos que fizeram shows durante o período carnavalesco de 2015 é a mais recente - e antiga - pauta de reivindicação.

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Segundo o presidente do Sindicato dos Músicos, Eduardo Matos, a Fundação de Cultura Cidade do Recife (FCCR) está sendo negligente diante das reclamações dos artistas. “A gente já procurou, fez diversas reuniões com o presidente da fundação e não tem nenhum retorno sobre o pagamento dos cachês do Carnaval 2015. Eles dão uma desculpa atrás da outra, dizem que começaram a pagar, já encaminharam os empenhos, mas é tudo muito tímido ainda”, afirmou o presidente, ressaltando que a última reunião deveria ter sido realizada na sexta (22), mas não aconteceu devido a umatraso do presidente da FCCR, Diego Rocha.

Em entrevista concedida ao Portal LeiaJá, Eduardo citou que recebeu um oficio por parte da prefeitura em que consta que o chefe do Executivo Municipal, Geraldo Julio, só assinou a autorização dos pagamentos no dia 23 de abril. Ainda de acordo com o documento encaminhado ao sindicato em 18 de maio, 260 apresentações do Carnaval já teriam sido quitadas. “A prefeitura anunciou anteriormente que já tinha pago R$ 4,7 milhões referente as apresentações. O que acaba sendo controverso, pois diante de um universo de apresentações apenas 260 foram pagas, quer dizer que eles só regularizaram os pagamentos das maiores”, avalia.

Dentre os artistas e produtores citados pelo sindicato que ainda não receberam os cachês referentes às apresentações de Carnaval estão a Orquestra Contemporânea de Olinda, Nonô Germano, Maestro Ademir Araújo, Carlinhos Caetés, Jaraguá Produções, Página 21 Produções e QG Produções. 

“É uma coisa que acontece sempre. Já faz parte da cultura colocar o artista em último plano. A burocracia todo ano impera. Sem falar que também a falta do dinheiro faz com que eles enrolem a gente e peçam cada vez mais documentos. O excesso de burocracia está emperrando a máquina da cultura”, afirma o empresário artístico Luiz Carlos Filho (Lulinha).

De acordo com Lulinha, que também é empresário de Nonô Germano, o show do cantor foi alocado no sistema com um valor inferior ao pagamento devido. “Colocaram o valor do show de Nono como menos da metade do que vale, sem contar que faltou a inclusão de uma apresentação. E para resolver isso exigem uma série de documentos”, comenta o empresário, completando que outros artistas, como Marrom Brasileiro, também não receberam o cachê. 

“Dessa vez eles estrapolaram os prazos. Chegou em junho e eu não recebi um real, nem da Prefeitura de Olinda, do Recife ou do Governo do Estado. Também sou empresário de Liv Moraes e ela só recebeu uma parte. Não estou aqui para ‘bater’, porque a Secretaria de Cultura e a Fundação são abertos ao diálogo. O problema está quando esbarra no jurídico, na Secretaria da Fazenda e de finanças”, conclui o produtor Lulinha.

Após as constantes reclamações, a Prefeitura do Recife marcou uma reunião com o sindicato para esta quinta (28), às 15h, com a participação do secretário-executivo de Governo e Participação Social do Recife, Gabriel Leitão. “Na condição de representante do governo, vamos pedir para que eles se pronunciem, pois já esgotamos as negociações com a Fundação de Cultura”, disse Eduardo.

Termo de Ajustamento de Conduta

Para acabar com este problema de atraso recorrente, o Sindicato dos Músicos procurou o Ministério Público e a Delegacia do Trabalho para pactuar e formalizar o período para quitação das apresentações dos artistas por parte das prefeituras e Governo do Estado. Segundo Eduardo, será discutida a elaboração de um Termo de Ajustamento de Conduta, para garantir o cumprimento dos prazos. “Já que o governo não vem atendendo às expectativas da gente, temos que ter o respaldo judicial para que os prazos sejam cumpridos, pois não se trata de um caso isolado”, afirmou o presidente, completando que o Superintendente Regional do Trabalho e Emprego em Pernambuco, André Luiz Negromonte, está disposto a integrar a mediação desse acordo. “Ele está disposto a sentar à mesa com a Prefeitura, Governo, Ministério Público para fazer esses ajustes e pactuar essa questão do prazo para a realização dos pagamentos”.

Outra questão levantada pelo presidente do sindicato dos músicos foi a possível ‘negligência’ por parte das prefeituras e Governo do Estado, referente ao recolhimento de FGTS E INSS. Ele alega que a prefeitura não exige comprovação das produtoras do pagamento dos devidos tributos. Desta forma, ele acusa o Executivo estadual e municipal de compactuar com a sonegação fiscal.

“Eles não exigem nada das produtoras, deixando os músicos vulneráveis em relação aos benefícios que todo trabalhador tem, como pagamento do FGTS, INSS, comprovação de vínculo em carteira ou nota contratual. Assim, os gestores estão contribuindo com a informalidade, mas principalmente estão sendo coniventes com a sonegação fiscal, evasão de divisa, enriquecimento ilícito e até atestando improbidade administrativa”, disse Eduardo Matos, declarando que o governo está sendo controverso quando exige tais comprovações de empresas das empresas de engenharia, que só recebem quando prestam conta.

 

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