Tópicos | Benny Alon

Os sorteios das chaves da Copa do Mundo são alvos de manipulação. Quem confirma isso é Benny Alon, executivo que por anos operou na organização de Mundiais em parcerias com países-sede e empresas que sustentaram as operações de vendas de entradas para os torneios.

Atualmente, Alon lidera uma batalha judicial milionária contra a Fifa, que também o acusa de irregularidades. Mas o executivo, que tem colaborado com a Justiça suíça, revela detalhes de como a entidade funciona.

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Segundo ele, nem os sorteios de chaves do Mundial estão isentos. Um dos casos mais explícitos teria sido o da Copa de 1994, nos Estados Unidos. "Um dia antes do sorteio, estava com os organizadores que me confirmavam a pressão do México para jogar em Orlando", contou.

A cidade seria um dos locais onde haveria uma importante comunidade de torcedores mexicanos e atendia aos interesses dos patrocinadores. Quando o sorteio ocorreu, o México caiu justamente no Grupo E, que se dividiria entre Washington e Orlando. A seleção mexicana terminou na primeira colocação, depois de bater a Irlanda no Citrus Bowl de Orlando.

"Não sei como fizeram com as bolinhas. Mas a realidade é que o pedido dos mexicanos foi atendido no sorteio", indicou Alon, que desde o Mundial de 1990 atuava nos bastidores. Naquela época, o "homem das bolinhas" era Joseph Blatter, secretário-geral da Fifa e responsável por organizar os sorteios.

Procurada pela reportagem, a Fifa não retornou os e-mails solicitando uma reação às denúncias do executivo. Em junho deste ano e já afastado, Blatter confirmou que sorteios para torneios internacionais foram alvos de manipulação. Mas garantiu que, sob seu mandato na Fifa, isso "jamais ocorreu". As declarações foram ao jornal argentino La Nación.

Blatter não deu detalhes. Mas insistiu que isso apenas ocorria na Europa, com o uso de bolas frias para que a pessoa que fizesse o sorteio pudesse escolher de maneira a atender a interesses. Papéis com os nomes das seleções são tradicionalmente colocados nessas bolas e teoricamente misturados.

"Claro que é possível sinalizar as bolas, ao esquentar ou esfriá-las", disse Blatter. "Isso não ocorre na Fifa. Mas eu fui testemunha disso em sorteios no nível europeu. Mas nunca na Fifa", insistiu o suíço. "Claro que isso tecnicamente pode ser feito. Mas jamais no meu caso. Jamais", continuou. "Bolas são colocadas na geladeira antes do sorteio. A mera comparação entre umas e outras ao tocá-las já determina as bolas frias e quentes. Ao tocar, já se sabe o que há" disse.

Sobre o sorteio para a Copa de 2014, no Brasil, Blatter garantiu que tudo ocorreu dentro das regras, sem qualquer manipulação. Nas escolhas, a Argentina foi amplamente favorecida pelo grupo que enfrentou e o percurso até a final. "O sorteio foi limpo. Eu nunca toquei nas bolas, algo que outros fizeram".

O milionário mercado paralelo de revenda de entradas para as Copas do Mundo se proliferou sob os olhos da própria Fifa, em um esquema que passou a ganhar força a partir de 1990 e foi liderado pelas empresas que detinham o monopólio para a venda dos ingressos. O alerta é de um dos empresários que por mais tempo atuou nos bastidores desse mercado: Benny Alon. Ele revela documentos, e-mails e contratos que escancaram que um mercado negro passou a ser operado com o conhecimento dos próprios cartolas. Na última quinta-feira, ele apresentou e-mails implicando Jérôme Valcke na revenda de entradas para o Mundial de 2014. O francês nega. Mas foi afastado pela Fifa e uma investigação foi aberta.

À reportagem, Alon revela como funcionou o esquema. "Ingressos para o Mundial são como uma mulher sedutora. Você pode ficar fascinado. Mas precisa ter cuidado", comentou. O empresário israelense/norte-americano não faz mea-culpa sobre o mercado negro. "Ele é necessário. Não é algo ruim", declarou.

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Mas Alon garante que, em mais de 30 anos no setor, jamais comprou entradas sem a autorização da Fifa ou de agentes da entidade. "Você nunca ouviu falar de mim, nossa empresa não tem um site nem fazemos publicidade. Mas temos os melhores ingressos para a Copa e vendemos para as grandes empresas", disse. "Só na final entre Argentina x Alemanha, em 2014, eu tinha 1,5 mil lugares no Maracanã", garantiu.

Segundo ele, a operação de entradas em um Mundial não é uma novidade entre os cartolas. "A Copa de 1990 foi a primeira que representou um grande negócio", disse. Documentos vistos pela reportagem revelam que, já ali, o britânico Ray Whelan comprou 4,5 mil entradas para os jogos na Itália. Whelan, mais tarde diretor da Match, foi a pessoa que, em 2014, acabaria sendo presa no Rio suspeita de atuar no mercado negro.

Em 1990, porém, ele assinava contratos em nome da empresa Mundicor e sua atuação deixou os organizadores italianos preocupados. Em uma carta, Luca de Montezemolo, presidente do Comitê Organizador Local, alertava que haviam sido informado sobre uma fonte de ingressos da qual ele "desconhecia". Para Montezemolo, a Mundicor violava as regras de exclusividade na venda de entrada. Mas, em uma resposta, a Fifa acabou adotando tom de apoio a Whelan e aceitou que os pacotes oferecidos pelo britânico pudessem ser vendidos.

Nas edições seguintes dos Mundiais, dois irmãos mexicanos começariam a ganhar espaço na Fifa: Jaime e Enrique Byrom. Whelan era casado com uma das irmãs dos Byroms. "À medida que os anos foram passando, a família aumentou o controle sobre os ingressos e, em 2002, os dois ficariam com o controle de todos os ingressos e acomodações", revelou Alon.

Mas um dos pontos mais claros do envolvimento de um esquema para revender ingressos ocorreu na Copa da Alemanha, em 2006. Naquele Mundial, a empresa iSe, formada pela Dentsu e a Publicis, passaria a ser uma das operadoras de bilhetes de alto nível. Alon seria um de seus principais operadores.

A iSe ganhou em 2003 um contrato para comprar por US$ 270 milhões um total de 346 mil ingressos da Fifa para o Mundial de 2006. Na Copa do Japão e da Coreia do Sul, em 2002, a empresa de marketing da Fifa, a ISL, havia falido. Mas a Dentsu se comprometeu com Joseph Blatter a assumir toda a operação e garantir que a Copa fosse um sucesso. Um ano depois, a empresa seria compensada com um contrato milionário.

Nos meses seguintes, porém, a Fifa faria algumas mudanças no contrato. No dia 8 de agosto de 2005, a iSe seria informada que Jaime Byrom iria passar a operar "sob o nome do Escritório de Ingressos da Fifa". "Jaime teria mãos livres para operar", explicou Alon. No total, a Fifa - representada por Jaime Byrom - repassou para a iSe apenas 239 mil ingressos e não as 346 mil entradas acertadas pelo contrato de 2003.

Além disso, milhares de outras entradas seriam devolvidas, como "não vendidas". "Cerca de 2 mil ingressos para o jogo de abertura da Alemanha em Munique foram considerados como ‘não vendidos’ e devolvidos", contou Alon.

Segundo o empresário, esses ingressos devolvidos não foram jogados no lixo. "Mais de 110 mil ingressos entraram no mercado, o que representa um lucro de US$ 110 milhões", indicou. Em uma carta enviada pelo então secretário-geral da Fifa, Urs Linsi, para a direção da iSe, a entidade reconhecia que sabia que parte dos ingressos da empresa estava sendo vendida no mercado negro. Mas, além de uma bronca, nenhuma medida foi adotada.

Alon ainda aponta como a empresa dos irmãos Byrom ganharia ainda mais poder a partir de 2010, quando ficou responsável por ingressos, tecnologia, hospitalidade, acomodação e transporte. "Uma só empresa tem todo o negócio da coluna vertebral da Fifa", disse.

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