O presidente da Argentina, Javier Milei, apresentou nesta quarta-feira (27) seu primeiro projeto de lei de reforma do Estado, em que pede ao Congresso a aprovação de uma emergência pública para assumir poderes legislativos até dezembro de 2025. O projeto, que tem 664 artigos e trata de temas econômicos, penais e eleitorais, foi apresentado horas depois de o libertário defender um plebiscito caso o Legislativo rejeite seu megadecreto econômico anunciado anteriormente, que tem despertado protestos pelo país.
A entrega do texto ocorreu enquanto manifestantes entravam em confronto com a polícia no centro de Buenos Aires. Milhares se reuniram após convocação de centrais sindicais para um novo protesto pedindo que a Justiça rejeite o Decreto de Necessidade e Urgência (DNU, semelhante à Medida Provisória no Brasil) que desregulamenta a economia argentina com a reforma de mais de 300 leis, incluindo trabalhistas. Um juiz do trabalho rejeitou um pedido de liminar apresentado pela Confederação Geral dos Trabalhadores (CGT) do país que impedia que o decreto entrasse em vigor amanhã. O projeto de lei de ontem não tem ligação com o megadecreto anunciado no dia 20, já que toca em temas que não podem ser reformados por uma canetada.
##RECOMENDA##O texto de 183 páginas, chamado de Lei de Bases e Pontos de Partida para a Liberdade dos Argentinos, foi entregue no início da tarde de ontem em meio a sessões extraordinárias do Congresso convocadas por Milei e iniciadas no dia anterior. O presidente havia adiantado, ao convocar as sessões, que pretendia entregar 11 iniciativas de reforma do Estado argentino. Essas iniciativas foram detalhadas no projeto de lei enviado ontem.
O projeto traz uma ampliação dos poderes do governo por meio da declaração de "emergência pública em matéria econômica, financeira, fiscal, previdenciária, de segurança, de defesa, tarifária, energética, de saúde, administrativa e social até 31 de dezembro de 2025".
O texto declara que, nessa data, ele pode ser prorrogado pelo Executivo por mais dois anos, ou seja, até o final do mandato de Milei, que assumiu no dia 10. Na prática, o documento, se aprovado pelo Congresso, permitiria a Milei ter funções legislativas nas matérias que pontua.
O governo argumenta que esse projeto está sendo promovido "no espírito de restaurar a ordem econômica e social com base na doutrina liberal incorporada na Constituição Nacional de 1853".
Mudanças profundas
A reforma é bastante ampla e modificaria regras eleitorais, como a eliminação de eleições primárias e financiamento de partidos políticos, mas também limita a organização de protestos e amplia penas a quem bloquear vias. O texto também traz mudanças no regime de aposentadoria, Justiça, composição do Congresso e facilita a privatização de empresas.
O partido de Milei, A Liberdade Avança, é minoritário no Congresso e ainda não avançou na costura de alianças. O partido libertário tem 40 dos 257 deputados e 7 de 72 senadores, enquanto a oposição tem a chamada primeira minoria em ambas as Casas.
Plebiscito
Justamente pelo risco de sofrer uma derrota no Congresso, Milei ameaçou, mais cedo, em convocar um plebiscito para a aprovação de seu megadecreto.
O DNU, que entra em vigor já amanhã, pode ser revogado caso as duas casas determinem. Em entrevista ao jornal La Nación, Milei disse que "obviamente" vai convocar uma votação popular caso os deputados e senadores, a quem chamou de corruptos, decidam pela revogação.
Depois da entrevista, o próprio La Nación alertou para as possíveis implicações da ideia. A primeira seria constitucional, já que o presidente não poderia submeter à votação popular um pacote com mais de 100 medidas. A segunda seria prática: só o Congresso pode convocar plebiscitos vinculantes, ou seja, que viram lei automaticamente. No caso de plebiscitos propostos pelo presidente, mesmo que seja aprovado, o texto ainda precisará passar pelos legisladores.
Confrontos nas ruas
Minutos antes de o presidente enviar seu projeto, milhares de manifestantes se concentraram em frente à Suprema Corte, em Buenos Aires, para pedir que se declare inconstitucional o decreto publicado na semana passada. Cerca de 8 mil pessoas participaram das marchas convocadas pela CGT.
Apesar do operativo do governo contra o fechamento de vias, os manifestantes bloquearam importantes avenidas da cidade, o que levou a enfrentamentos com a polícia. Seis pessoas foram detidas e um policial ficou ferido após ser atropelado por um ônibus, segundo a imprensa argentina.
Desde que foi assinado, o decreto tem despertado protestos e panelaços em várias cidades.
As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.