Quem alugava os filmes do Chuck Norris nos anos 80 pode lembrar que, antes de a pancadaria começar, surgia uma paisagem idílica da cidade de Paraty, embalada por As Quatro Estações, de Vivaldi. A estratégia promovia a Pousada do Sandi, que até hoje pertence à família que fundou a Paris Filmes. No mercado desde 1968, a empresa sobreviveu ao massacre das distribuidoras locais - Top Tape, Look e Mundial estão entre as que desapareceram - e hoje disputa os primeiros lugares do ranking brasileiro com estúdios de Hollywood como Disney, Fox e Warner.
Em 2013, contando a parceria com a Downtown Filmes para a distribuição de filmes nacionais, a Paris ajudou a levar 27 milhões de brasileiros ao cinema, o que se reflete em uma renda de R$ 332 milhões nas bilheterias. A empresa, que começou importando filmes baratos de kung fu, teve de se reinventar ao longo das últimas décadas para continuar relevante.
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Saíram os filmes comerciais de ação - que eram lançados no cinema, mas faziam muito mais dinheiro nas locadoras - e entraram produções mais sofisticadas e comédias com estrelas da televisão brasileira. O segredo, afirma Marcio Fraccaroli, sócio e presidente da Paris, está em acompanhar as mudanças de gosto do público ao longo do tempo.
Com o mercado de DVDs praticamente dizimado e o de vídeo por demanda ainda engatinhando, a margem de erro das distribuidoras diminuiu muito, explica Paulo Sérgio Almeida, cineasta e diretor da Filme B, empresa que compila dados do setor cinematográfico no País. "Cinema passou a ser um negócio de estratégia. Antes, se o filme não fosse bem nos cinemas, podia se recuperar no vídeo. Essa opção acabou".
É por isso que cada passo tem de ser pensado. "A Paris tinha comprado os dois últimos filmes de Woody Allen, que eram comédias (Meia-Noite em Paris e Para Roma, com Amor), mas não quis o drama Blue Jasmine. E esse último fez um número de espectadores bem menor, compara Almeida.
Comédia
Apostar no gosto do brasileiro por comédia, aliás, foi um dos diferenciais da Paris Filmes em relação à concorrência local. Por isso, ao identificar a ascendência do cinema brasileiro mais popular, decidiu investir em filmes leves. "As comédias sempre vão bem no Brasil", diz Fraccaroli. "Já filme de terror não tem muito mercado por aqui."
Nos últimos anos, em conjunto com a Downtown Filmes, a Paris vem distribuindo comédias estreladas por rostos conhecidos da TV. Bruno Wainer, da Downtown, lembra que os filmes lançados pela parceria em 2013 atingiram 11,5% do mercado brasileiro - índice só superado por Disney e Fox - e criaram um filão claro de bilheteria.
Surfando nessa tendência, as empresas começaram a desenvolver produções que só vão chegar ao cinema em dois ou três anos. Assim como a Disney é referência em animação, Paris e Downtown tentam se firmar com comédias. Seguindo a cartilha americana, investem em continuações, como De Pernas pro Ar 2 e Até Que a Sorte nos Separe 2. "Contando só filmes brasileiros, a nossa fatia de mercado está em 60%", diz Wainer.
'Peneira'
A estratégia da Paris para filmes estrangeiros tem duas vertentes. A distribuidora tem um contrato fixo com o estúdio americano Lions Gate, que tem feito sucesso com séries cinematográficas como Jogos Vorazes e Crepúsculo.
Além disso, Fraccaroli percorre festivais internacionais - como Berlim e Cannes - em busca de outras produções. É nessa 'peneira' que seleciona filmes como O Lobo de Wall Street, produção de US$ 100 milhões dirigida por Martin Scorsese. O valor dos direitos para o Brasil é de 0,8% a 1,5% do orçamento. Quanto mais caro o filme, maior tem de ser seu potencial de bilheteria.
O executivo diz que hoje as contas precisam ser feitas com cuidado, pois 50% da bilheteria fica com as redes de cinema. A outra metade tem de bancar a aquisição dos filmes - cujos custos são hoje inflados pelo dólar valorizado - e gastos com publicidade.
Para ampliar seu mercado, a Paris já deu os primeiros passos fora do Brasil. Hoje, a empresa compra direitos de filmes para a América Latina e depois os revende para distribuidoras de mercados menores.
Quanto ao home vídeo, o sócio da Paris diz que a receita da empresa no segmento caiu 75% nos últimos anos. A nova esperança são os serviços de vídeo por demanda, como Now e Netflix. Caso esse mercado decole, Fraccaroli diz que filmes populares poderão ocupar esta plataforma. Pode ser a volta triunfal de Chuck Norris. As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.